Discos Fundamentais: Pat Martino - Desperado (1970)


Por Fábio Carrilho
Jornalista e Músico
Cover Guitarra
(texto publicado originalmente na revista Cover Guitarra)

Se fosse apenas pela sua história de vida, Pat Martino já estaria entre as figuras mais fascinantes da guitarra em todos os tempos. Menino prodígio, despontou ainda adolescente no cenário jazzístico no início dos anos sessenta, quando fez várias gravações como sideman, trabalhando para o saxofonista Willis Jackson e os organistas Jack McDuff, Don Patterson e Charles Earland.

No frescor dos seus vinte e poucos anos lançou-se como artista solo, gravando álbuns antológicos pelo selo Prestige, como
El Hombre (1967), Strings! (1967), East! (1968), Balyina - The Clear Evidence (1969) e Desperado (1970). Em 1972 assinou com a Muse, e por este selo lançou mais sete álbuns até um sério aneurisma quase por fim à sua carreira.

Em 1980, avisado pelos médicos de seu grave estado de saúde, passou por uma série de cirurgias no cérebro as quais, apesar de bem sucedidas, devastaram sua memória, fazendo-o esquecer quase tudo, sua carreira e, inclusive, como tocar. Apesar de trabalhosa, sua recuperação foi rápida em todos os sentidos. Teve que recomeçar praticamente do zero na guitarra, estudando, aliás, a partir de seus álbuns históricos.

Em 1984 o que parecia impossível aconteceu: Martino lançava, pela mesma gravadora Muse, o álbum
The Return, registro de uma apresentação ao vivo em Nova York que deixou seus antigos fãs boquiabertos, pois, para muitos, estava tocando em um nível ainda superior ao que já vinha fazendo antes da perda de memória. Desde então Martino já gravou mais de dez álbuns, fez várias turnês pelo mundo e tem sido apontado frequentemente em listas de revistas especializadas estrangeiras como um dos maiores guitarristas de jazz da atualidade.

O álbum
Desperado pertence à fase pré-aneurisma, se assim podemos dizer, da carreira do guitarrista. Sem dúvida, a grande curiosidade deste disco é a guitarra semi-acústica Univox de doze cordas usada por Pat Martino. Este é um instrumento de difícil execução e com um timbre todo especial que pode enganar o ouvinte mais desatento, pois dá a impressão de que o músico usou algum tipo de efeito, o que não é verdade, exceto pelo pequeno ganho do próprio amplificador. A sonoridade geral, apesar de não ser um trabalho fusion, é bem elétrica. Os músicos que o acompanharam foram Eddie Green (piano elétrico), Tyrone Brown (baixo elétrico) e Sherman Ferguson (bateria).

A primeira faixa, "Blackjack", é puro free jazz, como se fosse um aquecimento para as que vem a seguir, com Martino destilando seu arsenal de frases bop em semicolcheias, sem esconder uma pitada
hendrixiana no riff que fecha a sessão. "Deadborn Walk", música seguinte, possui um tema de melodia arrastado, construído sobre um ostinato de baixo que serve de cama perfeita para os improvisos. O solo de Martino em "Oleo", de Sonny Rollins (a única faixa não-autoral), é um dos melhores momentos em CD pelo seu incrível fluxo de ideias melódicas nos seus quase dois minutos de duração, uma verdadeira aula.

"Desperado" mostra a predileção de Martino por compassos ímpares, alternando entre 7/4 e 9/4, enquanto "A Portrait of Diana" é uma balada de primeira categoria. "Express", cujo tema bem que poderia ter sido composto por Wes Montgomery, ídolo de Martino, fecha este álbum essencial para os amantes da guitarra jazz.


Faixas:
A1 Blackjack 7:52
A2 Dearborn Walk 3:56
A3 Oleo 4:56

B1 Desperado 7:58
B2 A Portrait of Diana 4:26
B3 Express 6:45

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