Discos Fundamentais: Rush - 2112 (1976)


Por Bento Araújo
Colecionador e Jornalista
Poeira Zine

Uma fábula futurista do rock: é assim que se define o quarto disco do trio canadense Rush.

2112 teve um parto difícil; o grupo havia sido muito criticado pelo seu trabalho anterior (Caress of Steel, 1975), e a melhor lição que eles tiraram disso tudo foi a de exigir para si mesmo uma busca dentro do seu próprio som. A verdade é que Geddy, Alex e Neil sentiam que era hora de crescer, de rebuscar todas as possibilidades que um estúdio, e suas próprias mentes, podiam oferecer.

O primeiro passo foi com o tempo gasto para a composição. Ao contrário dos trabalhos anteriores, esse levou seis meses para ser escrito e mais um mês para ser gravado e mixado. O envolvimento do trio com o projeto era total.

Lançado em março de 1976, a aceitação foi imediata. Só na primeira semana foram vendidas mais de 100 mil cópias, e um mês após o lançamento as vendas já ultrapassavam a soma dos três primeiros discos juntos.

Além de bem melhor produzido que os anteriores,
2112 trazia toda uma mística em volta de si. Desde o próprio som até todas as simbologias contidas na parte gráfica. O maior destaque ficava por conta da faixa título, que ocupava todo o primeiro lado do álbum; era uma suíte com mais de vinte minutos de duração, dividida em sete partes. Nunca um simples trio de rock and roll havia ousado tanto.

É justamente nessa época que a figura de Neil Peart passa a ser decisiva no som e na imagem do conjunto. Considerado o baterista mais inteligente do rock, Peart concebeu sozinho essa novela futurista que era "2112".

"A Passage to Bangkok" abre o lado dois (a edição em CD peca um pouco por omitir essa proposital divisão), uma canção sobre uma fantástica viagem através de lugares exóticos. "The Twight Zone" traz um começo cheio de guitarras espaciais e se transforma num lindo refrão sussurrado por Geddy, terminando tudo com a guitarra chorada de Alex. "Lessons" é um dos raros casos onde Alex assume sozinho o crédito pela canção.

"Tears" é uma das mais belas composições do trio; suave e viajante, ela mostra uma grande preocupação da banda com o feeling da música. Basta reparar no andamento simples da bateria de Peart (caso raro, em se tratando de bateristas tão técnicos como ele). Foi nessa música também que pela primeira vez um estranho tocou em alguma canção do grupo; Hugh Syme toca Mellotron, flauta e conduz o quarteto de cordas, além de ser uma pessoa fundamental na concepção do projeto, pois também desenhou a capa e o famoso logo onde um homem nu estende suas mãos sobre a estrela vermelha. "Something for Nothing" fecha o disco em grande estilo, mostrando um entrosamento pouco visto em uma formação baixo-guitarra-bateria.

Terminado o álbum o trio saiu por uma muito bem sucedida turnê mundial. Em muitos lugares foi a primeira vez que tocaram como banda principal, e ainda se dando o luxo de ter uma banda de abertura. A tour foi devidamente registrada em seu primeiro disco ao vivo, All the World’s a Stage, lançado também em 1976.

Os experimentos que a banda se aventurou em
2112 abriram o apetite do grupo pela mudança constante de disco para disco. O Rush sempre se recicla, nunca faz um disco parecido com outro, característica essa iniciada com esse álbum, que também serviu como pontapé no aprofundamento progressivo que a banda viria a seguir.


Tracklist:
A 2112
a. Overture 4:32
b. The Temples of Syrinx 2:13
c. Discovery 3:30
d. Presentation 3:40
e. Oracle: The Dream 2:00
f. Soliloquy 2:22
g. Grand Finale 2:18

B1 A Passage to Bangkok 3:30
B2 The Twilight Zone 3:14
B3 Lessons 3:48
B4 Tears 3:29
B5 Something for Nothing 3:56

Notas:

# Os Quimonos usados pelo trio na foto da contracapa do disco foram presentes de fãs japoneses do conjunto;

# Quando a banda entregou o disco para sua gravadora (Mercury), a mesma torceu o nariz e não botou fé no projeto, alegando ser um disco fadado ao fracasso comercial. Os engravatados fizeram de tudo para jogar a faixa-título, com seus 20 minutos de duração, para o lado B do disco, e graças ao contrato, que dava total liberdade ao grupo, isso não aconteceu;

# Nessa época o envolvimento do trio com a ficção científica era tão intenso que a editora Marvel Comics dedicou a eles uma série de gibis chamada
The Defenders. A obra era toda baseada nas letras de Peart para 2112, e a publicação trazia a seguinte dedicação: "To Alex, Geddy and Neil of Rush";

# Com muitas músicas orientadas para o teclado e sintetizadores, chegou a ser cogitada a inclusão de um quarto membro nessa época, idéia rapidamente abortada, pois ao vivo os três davam muito bem conta do recado;

Nota do editor: texto de Bento Araújo. Matéria escrita em 2002 para ser publicada na edição número 0 (zero) da poeiraZine, mas que ficou arquivada todo esse tempo.

Comentários

  1. Esse é muito bom mesmo. O engraçado é que o primeiro álbum do Rush que ouvi foi o criticado Caress of Steel, a introdução da matadora Bastille Day me ganhou e me fez ouvir os outros sons da banda.

    abraços

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  2. Ae Bento como sempre otimo texto, lembrar dessa obra do Rush é sempre necessário e quando bem escrito fica melhor ainda. Grande Abraço

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