A volta dos LPs é uma tremenda mentira!


Por Regis Tadeu
Colecionador e Jornalista
(matéria publicada originalmente no site do Yahoo! Brasil)

Ainda sou daqueles tiozinhos que percorrem sebos de LPs nos finais de semana, atrás de preciosidades e discos que ainda não tenho. Para você ter uma ideia da minha loucura, na semana passada encontrei duas raríssimas preciosidades: a edição do
Led Zeppelin III com a “capa giratória” e o primeirão do Captain Beyond com a capa holográfica. Nem preciso dizer que voltei para casa feliz da vida.

Justamente por ter o prazer de peregrinar por inúmeros sebos – onde quer que eu esteja – atrás de LPs bacanas é que posso afirmar categoricamente que esse papo da “volta do vinil” é uma das maiores cascatas já perpetradas no planeta desde os tempos em que Moisés cunhou na pedra os onze mandamentos. Sim, eram onze, mas uma das pedras caiu no chão e não deu para ler o que estava escrito na parte quebrada. Moisés achou melhor ficar com dez, mas isso é outra história.

Voltando ao papo dos LPs, o mais inacreditável é que tal notícia, plantada na imprensa por pessoas interessadas em criar um burburinho para seus próprios negócios, não recebeu um mínimo de investigação por parte dos jornalistas. Como deve ser difícil criar pautas diariamente, foi só alguém publicar esta “notícia” e pronto: todo mundo começou a fazer matérias a respeito de uma volta que, repito, não existe.

Neste momento, você deve estar se perguntando: “
Bem, então o que é que está acontecendo?”. Calma, eu explico. De uns tempos para cá, as gravadoras no exterior, ansiosas por aumentar as suas minguadas receitas oriundas da queda vertiginosa nas vendas de CDs e da troca incessante de arquivos em MP3 pela internet, descobriram que poderiam levantar uns trocados lançando seus novos produtos com um atrativo extra para uma diminuta casta de consumidores: versões em LP. Voltada exclusivamente para uma minoria – e bota minoria nisso! – que é de uma faixa etária mais elevada e com um poder aquisitivo muito maior do que a média da molecada, a versão em LP dos novos lançamentos tem uma tiragem reduzidíssima e um preço altíssimo – nas lojas brasileiras que trabalham com importados, você nunca encontra algo com preço inferior a R$ 120. Ou seja, é um produto tratado como “especial para colecionadores”. E isso vale também para a reedição de grandes discos do passado, como é o caso dos álbuns do Black Sabbath com o Ozzy.

Pois bem, nossos grandes e “espertos” burocratas do disco aqui no Brasil acharam que seria uma boa ideia espalhar que o “vinil está voltando”, que “há uma febre na Europa e Estados Unidos pelos velhos ‘bolachões’” (Deus, que termo horrível é esse?) e outras patuscadas. Auxiliados por amigos camaradas na imprensa, começaram a pulular em jornais e na TV matérias com gente apaixonada pelos LPs, colecionadores que juram que o som do CD é uma porcaria, aquelas presepadas. Claro que, “coincidentemente”, começaram a surgir notícias que nossas gravadoras iriam investir nesse “novo mercado”, que iriam reativar fábricas de vinis e soltar no mercado novamente uma bela fornada de LPs, blá blá blá ...

Pois bem. A dona Sony saiu na frente no ano passado e fez um estardalhaço na mídia para anunciar que havia voltado ao mercado de LPs com a série
Meu Primeiro Disco, com “reedições sensacionais”. Sabe quais? Ok, pode gargalhar à vontade: Da Lama ao Caos do Chico Science & Nação Zumbi, o disco de João Bosco gravado em 1973, o horrível disco que o Vinicius Cantuária gravou em 1982 (ambos com os nomes dos artistas como título) e, acredite se quiser, o disco dos Inimigos do Rei!!! Cada um vendido a inacreditáveis R$ 90!!! Discos que você encontra em sebos aos quilos por R$ 1 a R$ 5, vendidos a R$ 90! Era de chorar de rir!

Depois, João Augusto, produtor e dono da gravadora Deckdisc, comprou o que restou da última fábrica de vinis da América Latina, a Polyson, reformou os equipamentos e começou a prensar discos. De quem? Cachorro Grande, Fernanda Takai, Pitty e Nação Zumbi! Dando um desconto para iniciativa saudosista do João Augusto, faça a você mesmo a seguinte pergunta: tudo isso realmente significa “a volta do vinil” ou é apenas uma tentativa quixotesca de aquecer um mercado que não existe mais?

É claro que a segunda resposta é a correta. Se houvesse mesmo uma “volta do vinil”, estaríamos vendo as pessoas percorrendo os sebos atrás de discos bacanas, procurando novamente por toca-discos, cápsulas e agulhas, fazendo um alvoroço na internet em busca de LPs importados. Pelo contrário, a realidade é muito diferente. Os sebos estão abarrotados de discos que ninguém quer mais, cada vez mais pessoas vão a essas lojas tentando desovar os LPs que andam ocupando espaço em suas casas, os lojistas chegam a oferecer R$ 0,20 – sim, é isso mesmo o que você leu: vinte centavos! – por cada LP levado por gente desesperada para se livrar do que considera um trambolho. Aliás, é engraçado ver a quantidade de discos de artistas ditos consagrados nas prateleiras dos sebos – Julio Iglesias, Roberto Carlos, Simone, Ray Conniff, Maria Betânia. Discos de grupos daquele nefasto pagode dos anos 90 e trilhas de novelas, então, acumulam-se às toneladas embaixo de uma grossa camada de poeira.

Não se deixe enganar. Quando algum zé-ruela vier com esse papo de “o vinil está voltando”, mude de assunto e pague uma cerveja ao cara. Não custa nada dar um pouco de alegria a quem acredita em qualquer coisa que se lê por aí.



Comentários

  1. Concordo com o Regis. Falar em volta do vinil no Brasil com os lançamentos que chegaram às lojas é pra morrer de rir. Coisa mais ridícula e sem sentido ...

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  2. Além dos lançamentos não serem de títulos interessantes, os preços são altamente proibitivos. Os discos da DeckDisc estão entre 70 e 80 reais! É um absurdo cobrar isso, quando os mesmos títulos em CDs estão nas promoções dos principais sites de vendas da internet. Eu gostaria muito de adquirir alguns dos títulos que a DeckDisc lançou, mas pagar 80 contos é roubo, não é aquisição...
    Acredito que, se o preço fosse justo e os títulos fossem de fato atraentes, haveria mercado para consumo do vinil no Brasil... mas do jeito que está os caras estão dando tiros nos próprios pés, e nos nossos também...

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  3. Esse é o jornalissssmo Tupi... Finalmente alguém com neurônios...

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  4. A volta do vinil no Brasil é umafarsa, masnos EUA, o preço é acessível e o pessoal tem comprado bastante. Por exemplo. o ultimo UFO e o ultiom Uriah Heep podem ser encontrados em lojas especializadas da internet por 7 dolares. Isso é um preço muito bom e que vale a pena!

    O problema é que o Brasil explora a minoria, como semrpe

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  5. É por aí, Mairon. O novo do Iron Maiden, na versão picture dupla, está sendo vendida a 19 dólares. Quanto vai estar aqui no Brasil? Uns 180 reais, aproximadamente, certo?

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  6. Bah cadão, qual o novo, o Final Frontier? Aonde tu achou isto? Abração

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  7. Mairon, aqui:

    http://www.whatrecords.co.uk

    Mas agora que vi que o preço está em libras, e não dólares.

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  8. Mesmo assim, 60 reais pela edição limitada ainda é justo (pelo menos eu acho)

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  9. Claro que é, Mairon, sem dúvida alguma.

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  10. Por que será que cada vez que leio uma noticia destas sinto cada vez menos penas das gravadoras.....
    nunca vi exemplo maior de se cavar a propria sepultura....
    Adoro comprar originais...são tão superiores aos MP3s....mas no ritmo que vai a própria indústria vai matar a mídia física..... pelo menos aqui no Brasil...

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  11. O texto é bem interessante, realmente há uma falsidade na promoção desta crença de maneira generalizada; porém, há algumas idéias equivocadas no texto e conclusões apressadas. No final dos anos 90, no Brasil, com raras exceções, vinil era coisa desprezada, e em geral, os preços eram baixos. Em parte, em virtude dessa pouca valorização - os preços eram muito inferiores aos dos CDs - , houve sim um gradual incremento deste mercado de usados, que culminou com a criação de feiras e a venda de meios. Estratégias empregadas por colecionadores interessados em valorizar os seus acervos e por comerciantes de usados interessados em ganhar mais e mais, acabaram por aumentar absurdamente o horizonte das chamadas raridades e elevar, até mesmo para os comerciantes de usados, o preço destes exemplares. Por volta de 2005/2006, o mercado já estava se estagnando novamente. As gravadoras só tentaram pegar carona neste processo - bastante atrasadas e equivocadas aqui no Brasil. Nos sebos - que sempre guardam toneladas de discos comuns - você sempre vai encontrar algumas das várias edições nacionais dos grandes artistas estrangeiros dos 70, algum importado em estado duvidoso, e lá, sempre pagarão vinte centavos por um disco dos anos 80 da Gal Costa, mas esta não é uma tradução real e ampla do mercado de usados; para o comprador de sebos é impossível atinar a realidade mais ampla e exata do mercado; Nem tanto ao céu, nem tanto ao inferno...Obrigado.

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  12. Uma das poucas coisas que eu concordo nesse texto é que realmente não há "uma volta do vinil". Mas não do jeito que está (mal) exposto. Não há uma volta pq ele de fato nunca se foi. Mas há sim um retorno, pelo menos na relevância desse tipo de mídia, tendo visto que até artistas mais mainstream possível estão lançando seus discos nesse formato (Madona, Rihana e mais essas porcarias da MTV). Coisa que não acontecia há 5 anos atrás, por exemplo. Uma coisa é dizer que relançar ou lançar esses títulos de qualidade pra lá de duvidosa ainda a preços proibitivos é um tremendo desatino; outra coisa é dizer que o interesse da indústria pela mídia vinil tem aumentando (e isso está ocorrendo). A estratégia que ela tem usado pra isso (especialmente no Brasil) é totalmente equivocada, isso é fato. Mas agora dizer que o vinil não está voltando não tem nada a ver com isso. Faltou nexo causal no texto.
    Abraço!
    Ronaldo

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  13. Ronaldo, mas essa volta do vinil ocorre apenas no exterior, e não aqui no Brasil. Por enquanto, sinto o mercado brasileiro apenas entrando na onda, lançando produtos que não tem demanda - ainda.

    Pouca gente, além de colecionadores, sente atração pelo vinil. Pouca gente tem aparelhos que tocam LPs em casa. Por isso acho que essa tão falada volta deveria ser focada em quem ainda consome esse tipo de mídia, e que, salvo raras exceções, não consome os títulos lançados por aqui - Madonna e Rihana e afins são consumidos por DJs, mas Pitty não combina com uma coleção de um bolha, correto?

    Abraço, e obrigado a todos que comentaram.

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  14. Eu concordo com a visão do Regis Tadeu e ele foi claro na argumentação. Alegou que os altos preços funcionarão como impedimento para o retorno (se não pode usar o sinônimo) do vinil e é muito fácil perceber o interesse provisório nesse negócio aqui no Brasil pelas razões econômicas explicadas por ele. Outro fator contrário a esse retorno é o fato dos lojistas fazerem cálculos maquiavélicos ao embutir os impostos no preço do vinil. Por exemplo: Um vinil do Humble Pie, o Smokin`, na music direct está de 25 a 30 dólares. O vendedor importa ele dessas lojas se bobear e repassa por 140 reais... Mas lá fora os preços dos vinis são similares aos cds remasters por exemplo o que pode contribuir para que o mercado por lá esquente mais que aqui e sem contar no número maior de pessoas com poder aquisitivo alto. -Luciano

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  15. Concordo no que se refere ao Brasil, é ridículo mesmo, é para uma minoria, é cascata, tudo isso. Mas não confere com os EUA, pelo menos, onde estive no ano passado.

    Eu trouxe discos novos (edições de 2007, 2008 e 2009) do Black Sabbath, Judas Priest e Van Halen por 20, 25 dólares. Não são baratos, mas tampouco caros. Comprei em Nova York, numa loja famosa chamada Generation Records, no Greenwich Village. Comprei até o The Devil You Know, do Heaven and Hell, edição especial com pôster e tudo. Saiu uns 30 dólares só.

    Mas espero, e muito, que abaixem esse preço aqui no Brasil!

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  16. Olha amigo, sou de Pelotas, e por aqui, nosso precioso sebo Woodstock, nos trás discos novos relançados, a preços mais camaradas que os R$ 120,00, e os usados clássicos não param nas prateleiras. Pode não significar uma grande "volta", mas mostra um aumento no interesse.

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  17. A tão comemorada "volta" do LP até pode ser um grande engodo, como afirma Régis Tadeu. Tudo seria diferente se as duas mídias -- LP e CD -- tivessem coexistido pacificamente desde sempre, sem que uma precisasse "morrer" para que a outra vingasse. Eis o grande erro que a indústria da música tenta purgar, quem sabe tarde demais.

    Enquanto isso, parodiando aquele famoso samba, o CD agoniza mas não morre. Outro grande erro pode ser evitado. Ainda dá tempo.

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  18. É um círculo vicioso. O LP "morreu" por causa do CD, e agora, para evitar a "morte" do CD, apostam no LP. Meio esquizofrênico, não é mesmo?

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