Coluna do Batalha: a magia do Bathory


Por Ricardo Batalha
Redator-chefe da revista Roadie Crew
É com grande orgulho que comunicamos aos leitores da Collector´s Room a estreia de uma nova coluna em nosso site. A partir de agora, Ricardo Batalha, um dos mais respeitados jornalistas de rock e heavy metal do Brasil, terá uma coluna aqui na Collector´s onde falará de suas experiências com a música pesada. Então, acomode-se na cadeira e boa leitura!

Após ouvir mais um habitual “Ricaaaaaardo, telefone!!!”, proferido diariamente por minha mãe, atendi a ligação. “Fala Slayer! Chega aqui em casa que comprei um disco importado daquela banda que parece Venom”, disse meu amigo Cláudio Fortuna. “Pô, legal! Qual disco é?”, indaguei. “Um que chama 'Under the Sign of the Black Mark' e a capa é muito legal”, respondeu Cláudio. Nem lembro o que estava fazendo naquela hora em casa, mas saí dizendo que tinha um “compromisso inadiável”. Afinal, estava prestes a ouvir o novo trabalho da “banda que parece Venom”, da “banda de um cara só”, da “banda do disco com a capa de bode”.


A ligação com o Bathory era grande desde o primeiro contato que tive com o grupo, no lançamento do EP autointitulado de 1984. Lembro perfeitamente quando Serginho – hoje um advogado de renome nacional – e Duda, amigos do time de futebol de praia do Guaraujá, compraram o “disco do bode” importado e me enviaram pelo correio a gravação em fita k7 por fonopostal (!). É, quem reclama hoje que “o link está fora do ar” não faz ideia do que fazíamos para ouvir algo novo.

Também me recordo de ver o Paulinho “Pedrinho”, que fazia parte do time de basquete do Clube Paineiras do Morumbi na categoria do Conrado Tabuso, um dos editores do fanzine
DeathCore, usando quase que diariamente a camisete da “banda do bode”, com a capa do EP estampada. Nós até brincávamos que não íamos comprar a camiseta porque senão estaríamos “vestidos de Paulinho”.


Após os treinos e jogos do Paineiras – ou Parna, como chamávamos -, naquela fila para pegar o lanche invariavelmente vinha o papo de quem era melhor – Bathory, Venom, Celtic Frost ou Hellhammer? Nunca quis entrar tão a fundo nessas discussões. Afinal, curtia da mesma forma todas essas bandas, mas sempre falava as mesmas coisas: “
Ah, a música 'Necromansy” é a melhor do Bathory!” ou “O Venom que começou com tudo isso, duvido que o Quorton não tenha se inspirado na 'In League with Satan' para fazer a 'In Conspiracy with Satan'”. Bem , eu falava tudo isso, mas bem lá no fundo eu já sabia que a minha preferida dentre estas era o Celtic Frost mesmo. Era, ainda é e acredito que sempre será.

Under the Sign of the Black Mark, o álbum que o Cláudio Fontana e eu estávamos ouvindo pela primeira vez, era o terceiro da carreira do Bathory e foi lançado naquele mesmo ano, 1987. Passou o lado A, passou o lado B, mas a música que imediatamente curtimos foi “Woman of Dark Desires”, dedicada a Elizabeth Bathory. Ficou no ar a questão: “Quem seria aquela mulher?”. Como não havia internet, deixamos pra lá. Tempos depois fui consultar algumas enciclopédias que tinha em casa e descobri que se tratava da Condessa Elizabeth Bathory.


O já falecido músico sueco Thomas “Quorton” Forsberg (17/02/1966 – 07/06/2004) inspirou-se em Erzsebet Báthory para o nome de sua banda. Nascida em 1560, filha de pais de famílias aristocráticas da Hungria, Elizabeth cresceu numa época em que as forças turcas conquistaram a maior parte do território húngaro, sendo campo de batalhas entre Turquia e Áustria.

Como conviveu com todo o tipo de atrocidades quando criança, Elizabeth desenvolveu um alto grau de sadismo. Mais tarde, se tornou uma das mais belas aristocratas, e quem a via jamais poderia imaginar que, por trás daquela atraente mulher, havia um mórbido prazer em ver o sofrimento alheio. A Condessa ganhou a fama de ser “vampira” por morder e dilacerar a carne de suas criadas.

Casada com o Conde Ferenc Nadasdy, Elizabeth teve três filhas – Anna, Ursula e Katherina – e um filho – Paul. Após a morte de seu marido em 1604, mudou-se para Viena e daí para frente seus atos tornaram-se mais pavorosos e depravados. As investigações sobre os assassinatos cometidos pela Condessa começaram em 1610, ano em que foi presa e julgada.

Em janeiro do ano seguinte foram apresentadas como provas algumas anotações escritas por Elizabeth, contando com aproximadamente 650 nomes de vítimas mortas pela acusada. Seus cúmplices foram condenados à morte, e a Condessa à prisão perpétua. Elizabeth foi presa num aposento em seu próprio castelo, sem qualquer contato com o mundo externo. Vivendo fechada num quarto, sem portas e janelas, apenas com uma pequena abertura para passagem de ar e comida, faleceu em 21 de agosto de 1614.


Não sou cinéfilo e não consigo guardar nomes de filmes e de atores que vi na semana passada, mas uma boa dica para se ter uma ideia de como foi a vida de Elizabeth é o filme
Bathory (Condessa de Sangue, no Brasil), lançado este ano. Mesclando ficção e realidade, o filme dirigido por Jurai Jakubisco mostra como Elizabeth Bathory se tornou uma lenda.

Os anos passaram, os nossos gostos musicais foram se ampliando, mas aquela magia em relação ao Bathory permaneceu – pelo menos para mim. Quando montei a banda Midnight com o vocalista Roger Lombardi sabia da admiração dele em relação a estes mesmos grupos. Chegamos a gravar um CD com o Sunseth Midnight, e quando ele saiu para montar o seu próprio projeto veio com o nome Goatlove - “goat”, que na tradução literal, significa bode. O som da banda não tem nenhuma ligação com o Bathory, mas com o The Cult, que também tem o seu “disco do bode” e outro intitulado
Love. Entretanto, bastaram cinco minutos de papo com Roger para perceber que o Bathory é uma referência, mesmo que implícita, assim como Celtic Frost, Hellhammer, Venom e tantos outros.

É, parece que a magia em relação ao quarteto Bathory-Venom-Celtic Frost-Hellhammer perdurará.

Comentários

  1. Sempre histórias geniais!

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  2. Boas vindas ao Batalha, um dos melhores e mais respeitados jornalistas musicais deste país!

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  3. Pena que não estreou com a anterior, a coluna sobre o Ratt, heheheheheh...

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  4. Diogo, mas certamente ela pintará por aqui.

    Abraço.

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  5. O filme "A Condessa de Sangue" mostra justamente o contrário, ou seja, que, por rivalidades políticas e religiosas, os inimigos de Elizabeth Bathory passaram a contar mentiras que, por serem muitas vezes repetidas, acabaram se tornando verdade.

    Bathory é a preferida entre as quatro. Celtic Frost em segundo, mas foi um preconceito que criei a partir do "clipe da Marilyn Monroe" que consegui derrubar a pouco tempo.

    Abraços

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  6. Bela matéria, e bem vindo, Rick!!!!

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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