Rigotto's Room: Le Noise, um álbum sem precedentes na carreira de Neil Young


Por Maurício Rigotto
Colecionador
Collector´s Room

Um artista de primeira grandeza que não para de se reinventar e surpreender. Assim é o canadense Neil Young, um dos nomes mais significativos que o rock já produziu. Neil começou sua carreira na adolescência, com a banda Squires, mas somente em 1966 adquiriu notoriedade ao fundar com o amigo Stephen Stills o sensacional grupo norte-americano Buffalo Springfield, que durou vinte e cinco meses e fez excursões ao lado dos Byrds. Em 1968 gravou seu primeiro álbum solo, e no ano seguinte lançou um de seus maiores clássicos, Everybody Knows This Is Nowhere, seu primeiro trabalho com a banda de apoio Crazy Horse, que o acompanha até hoje. No ano seguinte se uniu ao trio formado por David Crosby (ex-Byrds), Stephen Stills (seu ex-colega no Buffalo Springfield) e Graham Nash (ex-Hollies). Após tocarem no festival Woodstock, Crosby, Stills, Nash & Young lançaram álbuns marcantes como Deja Vu e 4 Way Street, vindo a se separar amigavelmente em seguida (de vez em quando o supergrupo volta a ativa).

O mais surpreendente na obra de Neil Young é a sua diversidade. Ele ataca como um rocker, com guitarras pesadas e distorcidas, principalmente quando acompanhado da Crazy Horse, mas também faz brilhantes trabalhos acústicos, onde cria lindas melodias no violão e harmônica, mostrando-se um mestre também no folk, no country e no blues.

Após
Everybody Knows This Is Nowhere, considerado uma obra prima, Young se consagrou com os discos After The Gold Rush e Harvest, gravado ao lado dos Stray Gators (outra banda de apoio que o acompanharia várias vezes ao longo da carreira), alcançando grande sucesso comercial em 1972. No mesmo ano, a morte de dois grandes amigos por overdose - o guitarrista da Crazy Horse Danny Whytten e o roadie Bruce Berry - levaram Young a uma grande depressão, gerando discos melancólicos, mas não por isso menos belos, como Time Fades Away, On the Beach e Tonight's The Night. Em 1975 volta a gravar com a Crazy Horse, resultando no belo álbum Zuma. No ano seguinte grava um disco com o antigo parceiro Stephen Stills, Long May You Run, creditado a Stills-Young Band.


O final da década de setenta é marcado por um ode ao rock'n'roll, com o lançamento do disco e do filme
Rust Never Sleeps, onde um lado apresenta Neil Young sozinho se acompanhando ao violão e gaita de boca; e no outro lado ouvimos vigorosos rocks com o acompanhamento da Crazy Horse em sua melhor forma. No ano seguinte (1979) é lançado o álbum duplo Live Rust, um dos melhores discos ao vivo de toda a sua carreira.

Os anos oitenta foram irregulares para Neil Young. O artista gravou mais discos com a Crazy Horse, como
Re-ac-tor (1981) e Life (1987), lançou um divertido disco de rockabilly com a banda Shocking Pinks, Everybody Rockin' (1983); álbuns com outras bandas, como This Note's For You (1988) com The Bluenotes, Eldorado (1989) com The Restless e American Dream (1988) novamente com Crosby Stills and Nash; além de álbuns equivocados e chatinhos como Trans (1982) e Landing on Water (1986).

Neil Young começa a década de noventa com mais bons trabalhos com a Crazy Horse, como
Ragged Glory (1990) e Weld (ao vivo, 1991). Vinte anos depois de Harvest, Neil lança uma espécie de "continuação" com o ótimo Harvest Moon. Em 1993 grava o seu Unplugged MTV e continua produzindo alucinadamente, com destaque para os álbuns Sleep With Angels (1994), Mirror Ball (1995 - com o Pearl Jam como banda de apoio) e Broken Arrow (1996). Já nos anos 2000, Young continuou a lançar alguns de seus melhores álbuns, como Prairie Wind (2005), Living With War (2006) e Fork in the Road (2009).

Recentemente, Neil Young voltou a sofrer a morte de dois grandes amigos de longa data - o produtor Larry Johnson e o guitarrista Ben Keith, dos Stray Gators, ambos colaboradores constantes em seu trabalho. Neil resolve então fazer um disco intimista para extravasar toda a raiva e tristeza, e ainda assim passar paixão e esperança ao longo de suas faixas. Convoca o produtor Daniel Lanois, que tem em seu currículo a produção de
The Joshua Tree do U2 e Oh Mercy e Time Out Of Mind, dois dos melhores álbuns de Bob Dylan, e juntos registram Le Noise, um álbum sem precedentes na carreira de Neil Young.


Le Noise é composto por oito faixas gravadas sem banda, somente com Neil nas guitarras e violões. O curioso é que não se trata de mais um trabalho acústico do músico, onde ele interpreta solitariamente folks e countrys. Le Noise é um disco de rock'n'roll, com guitarras distorcidas cheias de feedback. É um formato surpreendente e inovador. Talvez não tenha o mesmo brilho de seus últimos trabalhos, mas é uma obra inspiradíssima, com um resultado extremamente agradável. Em alguns momentos é impossível não imaginar como ficaria a música se tivesse o acompanhamento da Crazy Horse, mas mesmo assim não há do que reclamar, Young prova que pode fazer bom rock'n'roll sem contrabaixos e baterias, apenas com sua guitarra áspera e suas inspiradas letras pungentes.

Le Noise é uma obra perturbadora e introspectiva, idealizada para ser um disco acústico. Lanois fez Young mudar de ideia, e das oito faixas apenas duas tem um tratamento mais limpo, ao violão. São elas: "Love and War", mais um protesto politizado, e "Peaceful Valley Boulevard", uma das melhores do disco, que fala sobre uma autobiográfica viagem cruzando os Estados Unidos. Não menos autobiográficas, "Walk With Me", "Sign of Love", "Rescue Me", "Hitckhiker", "Angry World" e "Rumblin'" encantam com a forma com que Young contrapõe pungentes letras de amor com violentas palhetadas em sua guitarra. Um belo trabalho de um artista que não se acomodou com os louros do passado e ainda hoje encontra novas formas de se reinventar.

Le Noise foi lançado no dia 28 de setembro acompanhado de um filme em preto e branco em que Neil Young é visto interpretando os oito temas do disco no estúdio.

Comentários

  1. Na expectativa para conhecer este disco... vindo do velho Neil deve ser coisa boa... a não ser que ele tenha voltado aos anos 80, hehehe...

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