É hora do U2 se aposentar?



Por Neil McCormick 
Tradução: U2BR 


Houve muita discussão sobre se o U2 está terminando após os comentários de Bono para a Rolling Stone. Recentemente, ele esteve falando muito sobre o U2 estar "à beira da irrelevância por 20 anos" e sugeriu que "estaríamos muito contentes parando no No Line on the Horizon". Apesar de falhar na entrega de um single de sucesso e a percepção geral de que não é um clássico, o álbum atingiu recentemente a marca de cinco milhões de cópias vendidas, e o U2 acabou de completar a maior, mais ambiciosa, tecnológica e lucrativa turnê da história do rock. A Q Magazine presenteou o U2 com um prêmio de Maior Atuação dos Últimos 25 Anos. Talvez isso signifique um momento oportuno para o U2 cair fora?


Não há um roteiro certo para uma banda terminar. Normalmente, acontece mais ou menos de forma acidental e espontânea, através de conflitos internos. Frequentemente é acompanhado por uma queda na popularidade e aumento nas divisões criativas. Mas quando você está junto por tanto tempo quanto o U2 (há mais de 36 anos) e é bem sucedido durante toda a sua carreira, um tipo de inércia pode se instalar, onde a banda continua existindo apenas porque, bem, por continuar existindo.


O R.E.M. foi largamente aplaudido pela recente decisão de acabar por conta da ideia de que seus melhores dias ficaram para trás. Os Rolling Stones continuam apesar disso, domando as críticas para dar música e entretenimento para sua enorme base de fãs. Você não pode dizer que um está certo e outro está errado - isso vai de cada um. Mas o R.E.M. está próximo ao U2 e pertence à geração pós-punk, para qual a fidelidade como uma banda de rock vem com altos ideais e um senso de propósito. Falando do término do R.E.M. no Newsnight desta semana, Mike Mills explicou que "foi uma oportunidade para nós seguirmos em frente nos nossos próprios termos. Não há forças externas, não há problemas, nós podemos seguir em frente como amigos e sentir como se tivessemos feito tudo o que queriamos realizar." 


O U2 certamente fez muita coisa, provavelmente mais do que eles mesmos jamais sonharam - embora eles tenham sonhado grande. Lembro de Bono quando lançou Boy, em 1980, me falando de forma entusiasmada que um dia eles gravariam algo tão grande quanto Sgt Peppers. Eles foram a maior banda de rock do mundo por grande parte da carreira, se reinventaram constantemente e se revigoraram musicalmente, fizeram grandiosas e recordistas turnês e estiveram no centro de campanhas políticas e de caridade que tem ajudado a moldar o mundo em que vivemos. Acho que isso é parte do problema atualmente: a verdadeira causa da crise existencial da banda encontra-se neles mesmos. Bono gosta de ser o centro das coisas, parte das conversas musical, política e cultural. "Muitas pessoas possuem álbuns do U2 por que elas gostariam de ter outro é a questão ressonante", admitiu recentemente. "Não sei se é possível pra gente fazer algo que atualmente seja significativo, não apenas para o nosso público mas para a época em que vivemos. Mas este é o tipo de trabalho para mim". 


O U2 gravou muitas músicas ao longo dos últimos dois anos, com vários produtores diferentes, incluindo novas composições com Danger Mouse, faixas pop 'club' com Red One e materiais meditativos, quase ambientais, com sua consagrada equipe formada por Brian Eno e Daniel Lanois. Eu gostaria de ouvir todas essas gravações. Mas parece haver um pequeno senso na banda de qual é a música que o mundo precisa imediatamente, algo singular, original e poderoso o bastante para levantar-se com o seu melhor, tão grande e forte como o emocionalmente contagiante The Unforgettable Fire, a pedra áspera e talhada do The Joshua Tree, a energicamente industrial reinvenção do Achtung Baby ou a harmonia matadora do All That You Can't Leave Behind. E então eles apenas continuarão navegando em busca desse avanço indescritivelmente criativo. Mas pode uma banda de homens ricos e de meia idade sempre alcançar os altos níveis criativos de sua juventude, quando fazer música realmente parece uma questão de vida ou morte?




A convicção do Bono de que eles precisam fazer algo de sucesso mundial toda vez efetivamente cria uma pressão nas suas costas. Quais bandas já fizeram seus melhores e mais impactantes trabalhos na meia idade de suas carreiras? Quando o U2 gravou os seus primeiros clássicos, eles trabalharam dia e noite em busca de um ideal, sacrificando tempo pessoal e vida privada, dando tudo de si à causa musical. Inevitavelmente não é mais o caso. Eles arranjam reuniões e sessões de gravação de acordo com as suas cada vez mais complexas agendas pessoais. Seus fãs podem continuar acreditando que o U2 vive na Irlanda e os músicos se encontram em pubs locais ou grupos de oração (o que tornam ridículas as acusações de evasão fiscal que fazem contra eles). Na verdade, Bono vive principalmente em Nova York, The Edge em Los Angeles, Adam em Londres e apenas Larry permanece mais ou menos o tempo todo em Dublin. Todos possuem (menos Adam) esposas e filhos que precisam de tempo e atenção. Eles têm o tipo de riqueza extrema que garante um conforto fabuloso. E Bono, força motriz do grupo, encontra seu tempo e energia muito reduzidos por sua extensa gama de interesses e compromissos extra-curriculares, particularmente atividades políticas e de caridade que inspiram muito antagonismo em pessoas que pensam que uma estrela do rock deve estar apenas no negócio de fazer músicas. Como Bono reconhece, "nós somos a banda mais amada e mais odiada na Terra", e muitos dos motivos das pessoas não gostarem do U2 atualmente são por causa dele - que disse que entende, "pois tenho que conviver comigo também".


Quando propus entrevistar Bono sobre o relançamento especial de vinte anos de Achtung Baby, ele recusou porque sentia que já tinha feito trabalho promocional demais e precisava dar um tempo. Disse que está ficando envergonhado pela quantidade de foco que há sobre ele, ao contrário do resto da banda. É uma ocorrente piada que ele simpatiza com pessoas que estão enjoadas da sua voz, porque ele também está. E ele está claramente esgotado. Ou como ele colocou numa mensagem apologética: "morto de cansaço pela exaustão".


A turnê mundial de dois anos do U2 pode ter terminado no verão mas, às vezes, eu acho que Bono não sabe como parar. Ele continuou sua caminhada incessante em conexão com todos os seus compromissos filantrópicos, humanitários e de negócios. Ele cantou no funeral de Steve Jobs na Califórnia em 17/10, encontrou Nicholas Sarkozky em Paris no dia 19 como parte de um grupo de lobby para a coalisão global anti-pobreza e esteve em Londres há poucos dias com o resto do U2 para receber o prêmio da Q Magazine. É muito surpreendente que ele tenha dito à Rolling Stone que seu único plano para o futuro era tirar um tempo de folga: "Eu quero pegar meus filhos e minha esposa e apenas desaparecer com meu iPod Nano, alguns livros e um violão". Então, na segunda-feira desta semana, ele estava em Dublin como parte de uma delegação tentando convencer companhias estrangeiras de tecnologia a investir na Irlanda. Ele é a estrela do rock que não consegue dizer não.


É por isso que, pessoalmente, eu não acho provável que o U2 faça como o R.E.M. e aposente-se graciosamente. Se eles chegarem a isso, será em um momento de glória ou em um ato de loucura escandalosa, provocado pela louca ambição de seu vocalista. De imediato, é provavelmente justo dizer que o U2 precisa de um tempo e o mundo precisa de um tempo deles. Mas os fãs de U2 já ouviram essa conversa de desilusão e dissolução antes - notavelmente em 1989, após os excessos de Rattle and Hum, quando Bono declarou que eles tinham que "ir embora e sonhar tudo novamente". Eles voltaram com Achtung Baby em 1991, provavelmente seu melhor momento.


Pela minha experiência, o que eles tendem a fazer é construir uma sensação de crise para expulsá-los. Edge refere-se a isso como perigoso, um chavão constante em suas discussões sobre seu processo criativo. O U2 precisa sentir que há coisas em jogo quando eles estão compondo e gravando, deliberadamente usando tensão e riscos para manter o foco. Isso, presumivelmente, é mais difícil de se obter para os indivíduos mais bem sucedidos e confortáveis. Quando Bono declara que o U2 está "à beira da irrelevância", o que ele realmente está fazendo é arrumando os desafios para ele próprio e sua banda, empurrando-os abruptamente para fora de sua zona de conforto.


O U2 está temporariamente descansando enquanto seu líder recarrega suas baterias, mas o seu próprio auto-questionamento não é realmente uma indicação de desilusão, mas sim uma intimação à ação. Fãs preocupados por Bono estar sugerindo que o U2 se aposentará não poderiam estar mais errados. O que ele realmente quer fazer de fato, o que ele sente que precisa fazer, é mandar o U2 "ir lá e criar o álbum de nossas vidas". Eu não sei é possível para a banda, com sua longa história, se reinventar novamente. Mas, como outros milhões de fãs, eu quero ouvi-los tentar.

Comentários

  1. Ótimo texto !
    Pra mim o momento de parar (ou dar um tempo) é quando olhamos pro palco e a banda parece um rascunho de si mesma.... ou um cover de si mesmo...

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  2. Mas eu não acho que o U2 já tenha chegado nesse estágio, Fábio. Você acha?

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  3. Não... de jeito nenhum !
    Mas a pressão e o amor/ódio em cima deles deve ser algo realmente quase insuportável

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  4. Eu respeito muito o U2. Aqui em casa tenho 3 irmãos absolutamente viciados, desde a infância, neles, falar mal dos caras dá maior briga. Mas pessoalmente, não gosto mt do trabalho deles a partir de All That You Can't Leave... eu cato algumas q eu gosto de cada album.
    Apesar de o show deles ser um espetáculo à parte, se eles n derem uma guinada musical - como já deram várias vezes - na minha opnião, não haverá nada pra mudar a história, e nisso o Bono tá certo.

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