A Cidade Maravilhosa não gosta de rock

Robert Plant, 64 anos, uma das vozes mais influentes do mundo do rock, tendo entre seus súditos 7 de 10 vocalistas de bandas blues ao heavy metal. O frontman de uma das bandas icônicas da década de 70, o Led Zeppelin, tendo transitado entre o progressivo, o blues, o rock clássico e o heavy metal. Com este currículo, que não é super estimado, Plant está em terra brasilis para uma turnê que varre algumas capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Para a Terra da Garoa, um dia sold out gerou uma nova data. Já na Cidade Maravilhosa, apenas um dia e um público abaixo da honra que é ver este senhor no palco.

Muita gente se pergunta porque o Rio de Janeiro, então cenário para o maior festival de música do país, o Rock in Rio, palco de eventos culturais maciços como o Carnaval, pioneiro em eventos ligados a estilos não tão populares como o Free Jazz Festival, jamais conseguiu se consolidar como a Cidade do Rock.
 

Antes que algum boçal e covarde escondido por trás de um monitor diga que o texto é bairrista, um chega pra lá: sou carioca, morador do subúrbio fluminense e incentivador cultural através dos sites para quais escrevo, portanto, fico completamente à vontade para o que se segue nas próximas linhas. Dito isso...
 

Um dos primeiros motivos que eu alavanco é o fato de não tratar merecidamente os astros. Não importa de que geração a eles pertençam. Bandas como o Nightwish, grupo de carreira consolidada na Europa, toca no Circo Voador, espaço tradicionalíssmo do centro do Rio mas absolutamente insuficiente para receber uma banda deste calibre. A acústica do lugar não é boa, o espaço não é confortável e mesmo a história do Circo - um dos principais agregadores musicais da década de 80, por lá passaram Lobão, Barão, Legião, Kid Abelha e, pasmem, Ratos do Porão - não é suficiente para tirar os problemas de infra-estrutura do local. 

Pra não ficar só no "picadeiro", até o espaço do samba (o Sambódromo) é palco para bandas de rock aterrisarem e transformarem a cidade em um caos. Falar nas questões técnicas que envolvem um espetáculo nestas condições é chover no molhado: o local é aberto e só permite uma excelente visão do show para os primeiríssmos lugares e olhe lá. E se chover, prepara-se, tudo pode ficar ruim, no palco, no show e em qualquer lugar.

A melhor casa de shows, o Citibank Hall, juntamente com o espaço HSBC Arena, fica fora de onde se concentra a maior parte da população. Localiza-se na Barra da Tijuca, de difícil acesso, tornando a ida e a vinda, por vezes, verdadeiras aventuras. É preciso ser fã e ter um espírito hype para encarar a distância e o trânsito caótico. Com isso, vamos para outro motivo nada interessante ...
 


... o preço. É fato que o público carioca tem menor poder aquisitivo do que o público paulista. O benefício da meia-entrada para idosos e estudantes transformou os valores dos tickets em verdadeiras fortunas. Pagar mais de duzentos reais para assistir um show de pouco mais de 1 hora e 40 minutos é luxo  (sem qualquer exagero) de uma parcela da população que ou faz economias para assistir sua banda preferida ou se estrepa no cartão de crédito no final do mês. Um adendo: mesmo as apresentações que não envolvem uma banda de rock mas um artista popular, como Marisa Monte, são espetáculos caríssimos para um público mais "maduro".
 


Um outro fator que é fundamental para a fraca presença carioca nas casas de espetáculos é a falta de veiculação na imprensa de eventos do estilo. Aqueles que pensam que internet já é suficiente para promover calendários e turnês de artistas do mundo inteiro, digo-lhes que os meios de comunicação de massa são imbatíveis. Na década passada o Estado perdeu seu único quinhão metal: a Rádio Cidade se despediu do dial, cheia de dívidas, tendo vendido seu patrimônio para uma operadora de telecomunicação (que, por sinal, já entregou os pontos), deixando milhares de fãs órfãos de promoções, sorteios, notícias e descobertas por bandas novas. Hoje a Cidade Web Rock está na dial virtual, mas não é a mesma coisa. Anos antes, a mais tradicional rádio de rock do Rio de Janeiro, a Fluminense (localizada em Niterói, município do Estado) iria começar uma triste decadência nos meios especializados ao se despedir do dial por motivos semelhantes: falta de dinheiro e patrocínio. As revistas eram pouquíssimas, as rádios seminais, mas o público era fiel. Não havendo uma rádio com interatividade, identificação e convívio, o carioca ficou refém dos maiores inimigos de qualquer paixão: o esquecimento.
 

O último fator que posso classificar como prepoderante para a Cidade Maravilhosa nunca se estabelecer como o principal cenário do rock no país para eventos é que o carioca, no fundo no fundo, não tem DNA "pesado" nas suas veias, se é que você me entende. O público daqui é o falso eclético, muito mais fortalecido pelos tempos em que capa, encarte, ficha técnica e história não fazem diferença alguma. Ele é capaz de dizer que ama Pitty, ouvir Jota Quest e ir, tranquilamente, ao show do Sorriso Maroto sem crise de consciência. Curte "November Rain", sabe quem é Jon Bon Jovi (ou lembra dele), mas pode tranquilamente não aparecer se o músico americano estiver na cidade para assistir ao pocket show da Vanessa da Mata. Os fãs (verdadeiros) de rock no Rio de Janeiro, se não estão em guetos, escondem-se para se encontrarem em fóruns, sites, blogs e, óbvio, os shows que os esperam, mas, definitivamente, não temos o know-how, o conhecimento, o amor e a veia completamente roqueira. Nossa identidade cultural é demasiadamente híbrida, sem compromisso com os artistas. Uma prova contundente disso é que, por dezenas de vezes, muitos shows já foram cancelados na cidade por total falta de procura de ingressos, e este tipo de fenômeno alcança bandas tradicionais (como Stryper, por exemplo) e outras que só aparecem por aqui por estarem em mal momento nas suas carreiras.

"Ok, mas como é que você me explica Paul McCartney e Kiss lotarem o Maracanã, trazendo os dois para o Rio, em épocas distintas, mais de 500 mil pessoas?". Curiosos. Assim como se estimou que os Rolling Stones levaram 1 milhão de pessoas para praia de Copacabana. Os leitores podem ter certeza que a reunião desta multidão possui em sua maioria pessoas que não sabem nada além de "I Can't Get No (Satisfaction)" e olhe lá! Pra muita gente, Mick Jagger é um Ney Matogrosso gringo. No caso do Kiss, as lendas em torno da banda reforçaram muito o convite aquela tarde/noite de 1983, afinal de contas, além de músicos, eles "matavam pintinhos no palco e eram os Knights in Satan Service".


Como se viu, não é possível ser acertivo e definir qual é O MOTIVO pelos quais os cariocas não aderem (por gosto e admiração) shows de artistas como Robert Plant e tantos outros que já passaram por aqui. Uma triste realidade, que volta e meia tem suas compensações, mas não apaga nossa atual identidade.


(por Daniel Júnior)

Comentários

  1. O KISS só lotou em 1983, diga-se de passagem. Em 2009 há relatos de que foi um fiasco para as proporções da banda, deu só metade do público esperado.

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  2. Em relação ao preço dos ingressos, a dificuldade de se chegar aos lugaree dos shows e as péssimas condições das casas de shows, os cariocas estão de parábens por não ir ... tem que boicotar mesmo...boicotar até melhorar ... quisera eu que os "novos ricos' paulistanos tivessem o mesmo comportamento... eu não teria que ouvir que pagar 900 reais por três dias de Lolapaloza é um bom negócio ...

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  3. Talvez a grande questão seja cultural mesmo: sou carioca mas moro em SP há muitos anos, minha família por parte de pai mora toda no Rio e interior, e não tem NINGUÉM roqueiro - na verdade eles me vêem como um alienígena :) Já na parte paulistana da minha família tem bangers, roqueiros e simpatizantes em geral - coincidência ou uma representação estatística de fato?

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  4. Concordo com o Fabio, mas tenho certeza que o público não faz boicote para melhorar nada. Se esse show fosse sábado ou domingo, iria lotar, assim como lotou Eric Clapton, no mesmo local, com preços absurdos também.

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  5. Daniel,

    Concordo em parte com o seu texto.
    É bem verdade que o público carioca carece de bons espetáculos, e quando estes acontecem, geralmente são um pouco decepcionantes para os artistas que por aqui se apresentam.
    No entanto, o Rio de Janeiro virou um parada obrigatória para artistas e bandas de todo o mundo, pelo simples fato de ser...no Rio de Janeiro! Onde a maioria curte uma praia, vai para a Lapa e certamente se esbalda na noite carioca sem a menor preocupação de ser importunado.
    Mas o público realmente não prestigia como deveria esses artistas.

    Robert Plant é o exemplo mais atual, mas ainda me lembro que quando o Queen por aqui esteve, foi um sucesso de público. Mas pela força do nome do grupo. Eu estava lá para ver um dos meus maiores ídolos: Paul Rodgers.

    Mas a maioria nem sabe quem é Paul Rodgers ou quem é o Bad Company e muito menos quem foi o FREE. Isso não é culpa do carioca, mas de uma falta de divulgação que acontece aqui. A Rádio Fluminense FM, muito bem lembrada por você, foi o veículo que me proporcionou a conhecer um sem número de bandas e artistas. Paul Rodgers entre eles!
    Mas ela era a única.

    Hoje em dia, não existe mais Fluminense FM(A MALDITA!) e as poucas informações que temos, pelo menos quem curte rock, vêem de sites e blogs. Algumas notas em jornais e nada em televisão. Triste constatar isso por aqui.

    A televisão prefere investir em coisas como funk, pagode, sertanejo e aqueles pseudo rocks de bandas coloridas. Sem falar no quase onipresente... quase onipresente... quase onipresente... droga! Não consigo escrever o nome desse sujeito que foi o ex da Kelly Key!

    Enfim, o Rio de Janeiro respira essas coisas. Respira esses rítmos que não são os nossos preferidos, e quando um cara da importância mundia que tem o Robert Plant ou o Paul Rodgers(que deveriam ter um tapete vermelho esticado assim que descessem do avião que os traz) acaba acontecendo essa vergonha.

    Abraços,

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  6. o fábio acertou em cheio no comentário dele....
    além disso tem de se entender q a maior parte dos fans de rock n roll do rio estão no interior,e fica foda pra se locomover.
    sem contar o preço dos ingressos né.
    eu não pago 200 nem fodendo pra ver banda nenhuma,isso é abusivo.

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  7. o fábio acertou no comentário dele...
    além disso tem de se levar em consideração q a maior parte dos fans de rock n roll do rio ficam no interior,e é foda pra se locomover só pra assitir um show,e com um preço de ingresso abusivo desses!
    eu não pago 200,300,400... pratas num ingresso nem fudendo.

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  8. Na boa... Sou paulistano e sei que existe uma diferença ($$$) bruta daqui para as outras cidades/estados. Localização e transporte aqui, também, são péssimas! Contudo, os valores dos ingressos no BRASIL são absurdos! Não verei o Plant e desisti de ir aos três dias do Lolla... Mesmo ganhando um excelente salário, em vista do mínimo e condições de vida do brasileiro. Pagar R$900,00 em três dias... Tem gente que vive com isso e sustenta família! Abuso! O brasileiro é estuprado quando deseja ir a algum espetáculo artístico! E isso, porque estamos falando do eixo RJ-SP... E quem vive no Norte e Nordeste... E na maioria das vezes precisa vir ao Sudeste para ver um show?! Vivemos num país de ricos... Surreal, não?!

    Sobre a veiculação, divulgação, rádios, televisão... O paradigma precisa ser quebrado! O acesso e distribuição da cultura mudou! Qual a rock-radio de SP? Não tem! Como divulgar algo que nem todos conhecem ou podem ir? Qual programa na TV? Detonator Pop Show?! Já deu, né?! Quebremos o paradigma e não abordaremos mais esses tópicos!

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  9. Produtora põe show numa quinta pra pagar aluguel barato e cobra alto, como esperado pra ganhar o máximo possível. Tiro no pé, colocar um show desses durante a semana. E tem mais so muito fã do Led , porém vendo alguns videos dessa tour nem me empolguei. Prefiri gastar mais pra ver o KISS e o black label q vão passar aki fim de novembro.

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  10. maioria dos shows q fui no rio nos ultimos 5 anos tiveram bons publicos....o kiss realmente foi o único q nao atingiu a meta nesses shows pois foram cerca de 17 mil pessoas...show do plant eu nao fiz nenhuma questao de ir

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  11. a grande maioria q dos shows "grandes" que fui no rio nos ultimos anos tiveram bons publicos..Ozzy,Rush,Maiden,Slayer,Faith no more,Heaven and hell,Dream theater entre outros...

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  12. e lembrando q o plant em sp fez dois shows num lugar pra 8 mil pessoas e aqui em um pra 16 mil q nunca iria lotar mesmo em uma quinta feira para ver um show solo dele

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  13. Ao contrário do Socram, sou paulista e moro no Rio. Acho que o público do rock pode até ser menor aqui do que em SP, mas eu acho que a grande questão é realmente o preço e as condições. O Rio está se tornando uma cidade extremamente elitista. Todo esse movimento de grandes eventos está tornando-o uma cidade que exclui o próprio cidadão, ela passa a ser de quem pague mais por ela. O lance dos shows é só um reflexo disso. Podem comparar - o preço do ingresso no Rio é sempre maior. Vi uma matéria que falava que os preços de ingressos no Rio, em média, eram os mais caros do mundo, em que argumentavam umas coisas absurdas, de que os hotéis aqui tem mais procura, etc e tal...uma balela. Neguinho aqui quer é ganhar por cima o triplo mesmo. Eu que não tenho meia entrada, pq não sou mais estudante e me recuso a criar um documento falso pra ter esse direito, sou automaticamente excluído, a não ser que coloque o lance de assistir shows como uma prioridade na minha vida. Paguei singelos R$ 250,00 para ver o Crosby Stills Nash & Young no HSBC Arena do fundo, das últimas fileiras. Em SP, amigos meus viram em condições parecidas por R$ 140,00 (inteira). Isso é excêntrico, e tem que ser uma ocasião absolutamente imperdível pra eu me motivar a pagar essa fortuna.
    Abraços,
    Ronaldo

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  14. vi fotos do show e nem tava vazio assim como falaram por ae

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  15. "...já na parte paulistana da minha família tem bangers, roqueiros e simpatizantes em geral..."

    Cara, é incrível como esses "bangers" se sentem os tais...
    Sempre têm que escrever "rock e metal" em tudo, para não misturar a nobreza do metal, com os plebeus do punk, new wave, grunge, prog, folk...
    É tudo rock, porra!
    rsrs

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