Um pequeno olhar sobre o mercado editorial brasileiro voltado para a música

Há um tempo, se você quisesse conhecer mais a fundo o trabalho de um artista qualquer teria que se dar ao trabalho de pedir aquele amigo que vai viajar para fora do país para que ele buscasse opções de biografias, coletâneas de letras e harmonias, livros que contassem a história por trás da história. O mercado literário brasileiro demorou muitos anos para se interessar pela vida por trás dos bastidores e diria que ainda tem alguma dificuldade de se adequar a este nicho, uma vez que nós, tupiniquins, não produzimos muita literatura (não como fora do país) sobre nossos grandes ídolos. 

Temos dois aspectos neste caso. A primeira é que a produção absurda de ídolos como se fossem (?) produtos que atendem vários segmentos trouxe maior interesse dos súditos. Se você procurar, saberá que o Restart, um grupo com pouco menos de 10 anos de existência, por exemplo, tem um livro que conta a sua trajetória. Uma banda como os Paralamas do Sucesso, após 30 anos de história, ganha livro apenas em 2012 pelo jornalista Jamari França. Não podemos dizer que o material é inócuo e insuficiente, pelo contrário. Os artistas estão aí, vivos, atuantes e dramatizados, inseridos em todo o contexto possível, prontos a serem biografados, autorizadamente ou não. 

O segundo aspecto é que os artistas gringos sempre receberam uma atenção, mesmo que diminuta, por parte das editoras. O grande problema, salvo engano, foram as traduções, muito inadequadas para contar com retumbância histórias fantásticas, cenas inéditas e frases de efeito. A qualidade do material lançado também deixava a desejar no tocante ao nível de nitidez das fotos, dos “bootlegs” extras (como ingressos, pôsteres e outros souvenires); até o papel era de baixo teor. 

De uns tempos pra cá o consumidor passou a ser mais exigente, e de forma até surpreendente aumentou o volume de livros importados dentro do mercado nacional. Sendo assim, as editoras de bom nível aqui no Brasil tiveram como missão melhorar a produção nacional, equiparando com o material produzido especialmente nos Estados Unidos e na Inglaterra. Que o digam os apaixonados por livros e que gastaram muita grana comprando “lá fora” e que hoje podem encontrar exemplares dignos aqui no país. 

Outra questão bastante pertinente é que todos viraram alvos dos lançamentos editoriais. Mesmo outros artistas que poderiam ter sua relevância questionada possuem um acervo bibliográfico interessante, além dos achismos da internet e com depoimentos longe das citações que encontramos no Google. No cinema, por exemplo, ocorre um fenômeno um tanto diferente do que acontecia na indústria. Hoje, as produtoras cinematográficas lançam filmes e/ou minisséries e se vê em seguida o mercado editorial lançando livros baseados nas películas, alguns até de credibilidade perigosa. O adendo a ser feito é que isto não é marca de grandes franquias, ou seja, livros que se tornaram best-sellers são as referências para o cinema e não o contrário. 

Temos que comemorar, por exemplo, o fato de algum tempo atrás não haver nenhum lançamento editorial que tentasse percorrer a história do metal nacional ou mesmo do rock brasileiro, e hoje as estantes estarem abarrotadas de releases tentando explicar, linha por linha, alguns momentos vividos na música nacional. O mesmo ocorre na MPB. Temos livros sobre Pixinguinha, Cartola, Chico Buarque, Gil, Elis Regina. Não somos reféns mais de lendas ou histórias que tiveram começo, meio e uma conclusão bastante incompreensível. 

Uma pequena história para terminar: no início dos anos 1980 havia no Brasil uma revista chamada Amiga. Uma espécie de folhetim que tinha como maior proposta contar sobre os atores e atrizes globais, assim como é até hoje, só que com menos glamour. Em uma das suas edições, saiu uma pequena nota de canto de página informando que o então baterista do Kiss, Peter Criss, havia virado mendigo em alguma rua de Los Angeles. A nota tinha foto e tudo. Pra mim, criança vidrada no quarteto nova-iorquino, aquele “fato” tornara-se absurdo na minha mente, levando em conta que desde o final da década de 1970 a banda se tornara uma das mais bem sucedidas comercialmente. Mesmo assim, aquilo ficou na minha cabeça. Anos depois – acredito que em 2011 – surgiu um vídeo circulando na internet contando que aquilo nada mais era do que uma “pegadinha” (no mal sentido) e que um meio de comunicação usara um sósia de Criss para “fazer” a notícia. Se naquela época tivéssemos livros contando (ou desmentindo) seriamente uma história destas (que hoje em dia pode não ser tão absurda, não é Renato Rocha? ) um menino de 10 anos não estaria desafiado a pensar se sua banda preferida menosprezara seu baterista a tal ponto.

(por Daniel Júnior)

Comentários

  1. O mercado literário brasileiro, n oque diz respeito a música ainda engatinha. Existem muitos artistas além de Bob Dylan, Rolling Stones e os seus dois principais integrantes, pois só do Mick Jagger existem três biográfias disponíveis nas livrarias.

    Os Beatles são campeões, só deles eu vi duas sem contar a biografia do álbum Sgt. Peppers e mais umas duas sobre o Paul McCartney e do John Lennon então nem se fala, tem de toda sorte.

    O Metallica já tem duas, mas cadê as biografias sobre o Deep Purple, o Black Sabbath, o Rainbow. Existem pencas e mais pencas de biográfias sobre o Jimi Hendrix e aqui temos apenas uma. Do Eric Clapton temos a autobiografia dele e nada mais.

    Do Led Zeppelin temos uma biografia apenas e custa os olhos da cara. Existem vários artistas que tem biografias lançadas no mercado nos seus países de origem, que no Brasil são totalmente desconhecidas.

    Sobre o Van Halen não temos nenhuma biografia, enquanto nos EUA pelo três já rodam no Amazon.com.

    Então o mercado brasileiro não é lá aquelas maravilhas e os preços então nem se fala.

    E sem falar que esses livros chegam com anos de atraso aqui e quando nos alcançam os preços colocam algumas barreiras. No caso do Metal Nacional as coisas não são boas também, pois parte do material que eu conheço tem origem em pesquisa acadêmica e que viram livros, ou seja, são dissertações de mestrado ou teses de doutorado.

    Aliás muitos destes livros estão longe das grandes redes de livrarias, para você ter acesso a eles tem que garimpar e muito, mas por um lado compensa porque tem preços mais acessíveis pelo menos.

    O Brasil é um país amador nesse segmento, que tange a música e os produtos e somado ao desconhecimento e a ignorância das editoras, o Heavy Metal acaba ficando a ver navios é saber inglês e comprar os livros nesse idioma e apelar para os Amazon.com da vida já que os livros oriundos do exterior não sofrem a maléfica ação dos impostos sobre si.

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