26 Bandas para o Matias: C de Creedence

Sempre gostei de escrever. Não lembro ao certo quando comecei a colocar as ideias em textos, mas recordo que sempre senti enorme prazer, quase uma necessidade, em fazer isso.

Quando chegou a hora de decidir, fiquei, como a maioria dos adolescentes, em dúvida sobre qual carreira seguir. Prestei vestibular para vários cursos. Medicina, Direito, Administração, Ciências da Computação. Atirei, como se vê, para todos os lados. Até que fiquei entre apenas dois: Publicidade e Jornalismo. Essa questão me acompanhou por semanas, até que acabei me decidindo pela primeira.

Naturalmente, com a necessidade em escrever saindo pelos poros, acabei indo para a redação publicitária. Mas, aos poucos, comecei a investir também na produção de textos sobre música, e esse processo acabou gerando esse site.

Falando sobre propaganda, um dos primeiros comerciais que lembro é um da Levi’s em que um cara entrava em uma lavanderia norte-americana e colocava a sua roupa para lavar em uma máquina, enquanto uma canção absolutamente incrível rolava como trilha sonora. A música me marcou muito mais do que a ideia, tanto que não lembro do desenrolar do VT, mas ele me serviu de porta de entrada para a descoberta de uma banda que marcaria bastante a minha adolescência.

O tal grupo era um quarteto norte-americano que atendia pelo peculiar nome de Creedence Clearwater Revival, logo encurtado apenas para Creedence por toda a turma. A música era a sensacional versão dos caras para “I Heard It Through the Grapevine”, sucesso anterior na voz de Marvin Gaye - informação que só fui saber depois. Conduzida por uma voz aguda e áspera, um groove contagiante e solos de guitarra faiscantes, aquele som me pegou de jeito e abriu as portas do rock caipira para mim.



Fui atrás dos discos do grupo, e encontrei uma coletânea chamada Grandes Sucessos, lançada pela Polygram. Na capa, bem simples, quatro hippies barbudos e cabeludos escorados em um calhambeque e com cara de gente boa. Ao colocar o LP para rodar, outro choque: o que eram aquelas músicas? De onde vinham aquelas melodias? Como eles conseguiam empilhar refrões inesquecíveis em cima de refrões inesquecíveis? E aquela energia? De onde vinham aqueles riffs? De onde vinha aquela banda? Quem são esses caras, santo deus!!!

A identificação foi imediata. O rock rural do quarteto, áspero e repleto de alma, era uma música forte demais para passar despercebida. E lá fui eu, mais uma vez, fazer a alegre jornada em busca de mais discos de um grupo que havia batido forte na minha cabeça. E, para minha surpresa, o Creedence havia gravado apenas sete LPs em 4 anos, em uma produção que aliava, de maneira raríssima, qualidade e quantidade.

Não havia como não ser fã de John Fogerty. O cara era o vocalista, o guitarrista, o guitarrista-solo e o principal compositor do grupo, sendo o autor de praticamente todas aquelas canções que haviam caído profundamente no meu gosto. Ele era um gênio, não havia dúvida.



O álbum que virou sinônimo de Creedence para mim acabou sendo justamente o que tinha a faixa que me fez conhecer a banda, o sensacional Cosmo’s Factory (1970). A capa já cativava: aquelas quatro figuras dentro do estúdio, largados, enquanto um deles pedalava uma bicicleta. A música, então, era sublime: da abertura com o riff de “Ramble Tamble” ao encerramento com a belíssima “Long as I Can See the Light” havia um desfile impressionante de belas canções. O blues clássico “Before You Accuse Me”, de Bo Diddley. A energia de “Travelin’ Band”, “Ooby Dooby”, “Up Around the Bend” e “My Baby Left Me”, que traziam de volta a ingenuidade do rock dos anos 1950. O apelo country característico de “Lookin’ Out My Back Door” e “Run Through the Jungle”. O pop certeiro de “Who’ll Stop the Rain”. E a versão desconcertante de “I Heard It Through the Grapevine”, que um dia havia pertencido a Marvin Gaye, mas que agora era de John Fogerty por mérito e direito.

O Creedence sempre me acompanhou ao longo dos anos, estando em alguns momentos mais presente, em outros menos. Entre as melhores recordações da banda está a lembrança de uma namorada que adorava transar ao som dos caras - a experiência vale a pena, recomendo.

Ainda não há Creedence na vida do Matias. Pelo menos não ainda conscientemente. Ele já ouviu a banda rolando em casa ou no carro, mas ainda não se interessou em parar para escutar, ou perguntar, sobre que música é aquela. Mas isso irá acontecer, mais cedo ou mais tarde, porque é impossível gostar de rock e passar batido pelo grupo. Quando esse contato rolar, quando os riffs fizerem sentido e a identificação acontecer, não será preciso dizer nada, apenas observar a magia que torna o rock tão apaixonante e único acontecer mais uma vez.

Até , meu filho.

Por Ricardo Seelig

Comentários

  1. Belo texto. A propaganda da levi´s é marcante.

    ResponderExcluir
  2. Acho Ramble Tamble uma das músicas de abertura mais arrebatadoras que já ouvi. É foda do começa ao fim, minha preferida da banda com certeza.

    ResponderExcluir
  3. "caraca", Ricardo, conheci o Creedence da mesma maneira. Eu era garoto e quando vi a propaganda e escutei a música fiquei louco, só que naquela época não havia internet e as informações demoravam para se encaixar, até que um dia eu estava na casa de minha Tia, assistindo televisão quando apareceu esta propaganda e então comentei que adorava esta música mas não sabia de quem era,foi quando o Namorado da minha Prima, que era bem mais velho que eu, disse:"é o Creedence, eu tenho este disco...", ao ouvir aquilo eu quase cai do sofá, no dia seguinte enchi o saco do meu pai até ele me comprar um disco do Creedence, foi quando compramos esta mesma Coletânea, dai para frente foi correr atrás dos outros discos.
    Valeu pelo texto.
    Abraço
    Ale

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.