D.R.I. + Ratos de Porão (Teatro Odisseia, Rio de Janeiro, 11/12/2013)


Temporal, ruas alagadas, engarrafamento. Defesa Civil decretando estado de alerta. Rio de Janeiro entregue ao caos. Exasperado, o cidadão carioca foi, novamente, vítima das circunstâncias — e de uma gestão cuja credibilidade já foi pelo ralo há tempos. Ponto de encontro dos boêmios que não têm dia nem têm hora pra beber, o bairro da Lapa muitas vezes serve como válvula de escape devido às suas inúmeras opções de bares para aquela cervejinha muito da bem-vinda — sobretudo em dias como a última quarta-feira. E foi justamente na Lapa, na última quarta-feira, que os texanos do D.R.I., os legítimos pais do gênero crossover, fariam sua terceira apresentação na Cidade Maravilhosa em 30 anos de carreira. A formação atual do grupo conta apenas dois remanescentes daquela responsável pelo clássico Crossover (1987), mas somente o vocalista Kurt Brecht veio, acompanhado pelo baixista Harold Oimoen e pelo batera Rob Rampy. Ninguém sabia o porque da ausência do guitarrista Spike Cassidy, e muito menos qual o nome de seu substituto. Houve quem torcesse o nariz antes mesmo da primeira música. 

Sem lançar material inédito há pelo menos uma década, o quarteto opta por apresentações esporádicas, sempre em clima de celebração, mandando brasa em músicas que não envelhecem com o tempo e ainda despertam o punk rocker que existe dentro de cada um. A troca de energia entre os músicos e seu público é coisa bonita de se ver e mais ainda de se fazer parte. Os caras são como demônios ligados em 220 volts, eletrificando um a um os também insanos presentes numa grande cadeia de puro êxtase roqueiro. Em "Beneath the Wheel", o que era um moshpit transformou-se num liquidificador dos infernos, com direito a gente saindo com nariz arrebentado, camisas rasgadas e celulares sendo perdidos pelo chão. Vendo de perto, parecia até briga de torcida em estádio de futebol, com a diferença que ninguém ali era rival ou queria acabar com a vida de alguém.


"Violent Pacification", queridinha dos metaleiros graças ao Slayer e uma das mais esperadas da noite, só veio na reta final, quando parte dos incautos já não tinha mais por onde suar. Ainda assim, tome pancadaria e aqueles stage dives fail — caras que sobem no palco, pulam na esperança e se esborracham, fazendo a alegria e garantindo a gargalhada daqueles que, como eu, só observam. Diretamente dos primórdios da banda, "I Don't Need Society" foi outra das mais festejadas... e foi justamente onde o som deu pau. Felizmente, o reparo foi imediato, não passou de um susto. Destaque individual para o baixista Harold Oimoen, que mudava de máscara e chapéu a cada meia dúzia de músicas, indo de boné do Black Sabbath a cabeça de galinha. A cada troca, uma surpresa e boas risadas. Aliás, descobri ontem que o cara começou como fotógrafo de turnê do Metallica e largou essa vida para trilhar o caminho de músico. Eu não sei se teria culhões para bancar tal decisão, mas respeito — e muito — quem se propõe a tal. Depois de uma hora e pouco de show, o D.R.I. se despediu. 

Enquanto aguardava a chegada do Ratos de Porão, me chama a atenção um senhor caminhando com o auxílio de uma bengala. Era ninguém menos que Rob Rampy! O batera sentou-se ao lado do estande com merchandising oficial do D.R.I. e lá permaneceu, em silêncio, com cara de poucos amigos. Nesse intervalo, me liguei num corre-corre do pessoal da produção. Algum sem noção invadiu o camarim e quase deu merda. Tudo bem que o crossover seja música de protesto e incite o ouvinte a quebrar as regras etc., mas bom senso em primeiro lugar, certo?


Ratos de Porão, uma instituição musical verde e amarela. A devoção do público transborda no momento em que João Gordo e seus asseclas sobem ao palco. Confesso que não entendo patavina do que ele canta, mas o som é furioso e a atitude é punk legítimo. O moshpit que antes ocupava cerca de 1/3 do Teatro Odisseia se expandiu; mulheres, galera sênior, vem-todo-mundo. Um verdadeiro confronto, movido por uma música que desperta a face mais primitiva do ser. Nenhum osso ou músculo foi poupado. E mesmo depois de admitir que estava "velho, 50 anos ano que vem" e "com a saúde toda fodida", Gordo engrenou um bis interminável, talvez maior em músicas que o repertório principal. Para alguém que está com o pé na cova, o cara reina absoluto.


E no que depender de sua corte, vai continuar no trono por muito tempo.


Texto: Marcelo Vieira
Fotos: Daniel Croce

Comentários

  1. Muito bom post...mas show de punk rock, foi do Exploited no ultimo domingo em sp.

    Minerva Pop

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  2. O Spike não veio por conta de uma crise de tendinite. O responsável pelas seis cordas atende pela alcunha de Ed "Loco" Reyes, da banda Verbal Abuse.

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