Hail Spirit Noir: crítica de Oi Magoi (2014)

Há uma espécie de divisão na sonoridade atual do black metal. De modo geral, as bandas seguem três caminhos: o retorno à crueza clássica do estilo, característica da cena norueguesa do início dos anos 1990; o flerte com a música clássica, que evoluiu em sonoridades cada vez mais elaboradas, complexas e cheias de camadas, caminho seguido por nomes como Dimmu Borgir e Behemoth; e a aproximação com o shoegaze levada a cabo por nomes como Alcest, Wolves in the Throne Room e Deafheaven, que fez surgir uma nova sonoridade classificada como blackgaze.

É justamente nessa última tendência que estão surgindo alguns dos álbuns mais intrigantes e instigantes do metal atual. Foi assim com Sunbather, último disco do Deafheaven, aclamado pela crítica como um dos melhores lançamentos de 2013. Está sendo assim com Shelter, novo CD de um dos pilares do estilo, a banda francesa Alcest. E essa sensação se repete com Oi Magoi, segundo álbum dos gregos do Hail Spirit Noir.

Formado em 2010, o grupo já havia chamado a atenção com o seu primeiro disco, Pneuma. A ótima impressão vira realidade em Oi Magoi, lançado em 20 de janeiro pela gravadora italiana Code666. Há uma evolução evidente em relação à estreia, com canções mais estruturadas e melhores desenvolvidas, afastando a banda do caos e levando-a ao encontro de um universo próximo ao jazz - sim, você leu isso mesmo.

Um fator interessante neste segundo álbum do Hail Spirit Noir é o contraste entre a parte instrumental e o conteúdo lírico. Enquanto as letras trazem discursos pesados e que beiram a blasfêmia, o instrumental é cristalino e com um certo tom vintage, deixando o peso excessivo de lado em grande parte do trabalho. Não há demérito algum nessa escolha, muito pelo contrário: isso abre espaço para que os instrumentos apareçam e evoluam em arranjos muito bem construídos, que entregam belas melodias e climas sombrios que causam calafrios.

Há de se destacar a grande musicalidade da banda, evidenciada nos lindos solos de guitarra que permeiam todo o disco e também no uso inteligente de instrumentos não muito comuns ao metal, mas que se encaixam com perfeição na proposta do disco, como é o caso do xilofone presente na espetacular “The Mermaid” e na faixa de abertura, “Blood Guru”.

Li em alguns reviews mundo críticos classificando o som do Hail Spirit Noir como black metal progressivo. Não concordo com o termo, pois, apesar da clara influência prog, tal classificação pode levar a um entendimento errôneo ao som dos gregos. O mais correto é mesmo o blackgaze, aqui aditivado por criativas intervenções psicodélicas que imprimem uma originalidade evidente e uma personalidade única à música contida em Oi Magoi.

Entre as faixas, destaco “Blood Guru”, “Satyrico Orgio (Satyrs’ Orgy)” (onde é possível ouvir a influência, mesmo que sem exageros, da cena black norueguesa), "Hunters" e a sensacional “The Mermaid”, um exercício black jazz impressionante e que, em seus mais de onze minutos, entorpece o ouvinte com uma sonoridade de cair o queixo.

Oi Magoi é um disco singular, que destaca o Hail Spirit Noir como uma das bandas mais interessantes surgidas nos anos recentes. Muito acima da maioria do que se ouve quando o assunto é o metal e suas infinitas variações, possui a capacidade sempre bem-vinda de cativar tanto o headbanger mais exigente quanto o ouvinte de fora que vê tudo associado à música pesada com enorme preconceito.

Discaço!

Nota 9

Faixas:
1 Blood Guru
2 Demon for a Day
3 Satan is Time
4 Satyrico Orgio (Satyrs’ Orgy)
5 The Mermaid
6 Hunters
7 Oi Magoi

Por Ricardo Seelig

Comentários

  1. Eu reconheço a originalidade do som de bandas como o Deafheaven, mas esse tipo de música não me agrada. De qualquer forma me interessei em conferir este disco.

    ResponderExcluir
  2. Caraca, Ricardo! É disso que tô falando! rs

    Acabei de ouvir a The Mermaid, muito merecedora do seu adjetivo "sensacional".

    Coisa fina!

    ResponderExcluir
  3. Patrick, eu entendido seu pedido. O que acontece é que encontrar boas bandas assim, com sonoridades originais e cativantes, leva tempo.

    ResponderExcluir
  4. Eu sei disso, Ricardo. Também gosto muito de procurar bandas que vão além do óbvio e sei como não é fácil!

    ResponderExcluir
  5. Gostei muito da resenha e já estou correndo atrás da banda. Depois digo o que achei.

    ResponderExcluir
  6. O som é bem legal, mas não tem nada de Shoegaze no som pra caracterizar BlackGaze. O som é Progressivo, por vezes Psicodélico, mas não o suficiente pra chamar sequer de Avantgarde.

    O som é bem legal mesmo. Ouvi uma vez o cd ontem, e curti os longos solos. Mas não é algo que vou ouvir com frequência.

    ResponderExcluir
  7. Bela resenha.

    Ótima dica. Não tinha ouvido falar dessa banda.

    Ouvirei o álbum nos próximos dias.

    ResponderExcluir
  8. Ouvi hoje. Muito bom o álbum. E olha que nem sou muito fã de black metal. Melhor que o Sunbather do Deafheaven.

    ResponderExcluir
  9. Parabéns pela dica, estou ouvindo o CD agora e achando espetacular, os arranjos são fantásticos. Típica banda "ponto fora da curva".

    ResponderExcluir
  10. O legal deste disco é que, apesar de ele ter características black metal, como o vocal e a letra, é cativante pela originalidade e inventividade dos arranjos. As músicas são imprevisíveis, começam em um oposto e terminam em outro, passando por várias sonoridades no meio. E a ascendência jazz dá um toque todo especial.

    ResponderExcluir
  11. Concordo com o Adriano Garcez, achei mais para um prog black metal que esse mistura toda com shoegaze. Mas isso, no fim das contas não importa nada. Pro Fenrir isso ai nem seria black metal hehe

    Fora isso, achei o disco muito bom, muito legal de ouvir. Extremamente superior ao badalado Sunbather. Valeu a CR por mais uma boa dica.

    ResponderExcluir
  12. Não vi muito de shoegaze mas sim muito jazz e um pouquinho de prog.

    Excelente dica que estou curtindo no repeat.

    ResponderExcluir
  13. Álbum sensacional, o melhor do ano até agora ... o pior vai ser penar pra adquirir esta obra.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.