Sisare: crítica de Nature's Despair (2013)



Apesar de ter passado dois anos insistindo em uma fórmula que pode ser categorizada como progressive death metal, foi apenas ao encerrar e retomar as atividades (com um novo baterista) que o quarteto finlandês Sisare parece ter colocado as peças nos devidos lugares.

Afinal de contas, o seu álbum de estreia, Nature’s Despair (que pode ser baixado de graça no próprio site oficial deles) está tão afastado da música extrema quanto possível, abandonando praticamente toda a sua proposta anterior e tomando rumos muito mais tranquilos, e completamente diferentes. E provavelmente tenha sido a mais sábia decisão que podiam ter tomado.

A combinação de violão com sutis linhas de violino em “The Brew” apresenta o Sisare com uma balada sendo tocada com o intuito de manter o frio afastado. O clima melancólico proporcionado pelos poucos minutos soa não apenas como um convite para abrigar-se enquanto uma nevasca cai lá fora, mas como a apresentação inicial dos finlandeses para o que vem a seguir. Logo nos primeiros segundos, é praticamente impossível não notar certa semelhança entre a voz de Severi Peura e a de Mikael Åkerfeldt, efeito que se torna claro pela semelhança também na atmosfera musical entre ambas as bandas.

Isso fica mais evidente ainda na batida lenta de “Salvation?”, aonde os elementos de progressivo erguem-se e deixam a influencia folk cuidando dos pequenos detalhes ao longo da faixa, e, mesmo predominantemente acústica, abrem espaço para inspiradíssimos solos contemplativos de guitarra no melhor estilo Gilmour. Em trilhas parecidas, “Isolation” se aproxima um pouco mais do lado heavy metal da coisa, sem abandonar as tortuosidades das mudanças de andamento e da efetiva combinação de instrumentos acústicos com elétricos.

“The Dust” extrapola em alguns fatores e vai ainda mais longe no desenvolvimento e exploração das possibilidades em cima de ideias teoricamente simples, levando o frio híbrido de prog e folk a mergulhar superficialmente nas águas do post-rock e do shoegaze em suas manifestações mais agressivas, por certos momentos. Resultado belíssimo, diga-se de passagem, assim como na cadencia inabalável de “Where Do Whales Breed?”, de movimentos tão bruscos quanto a sensação de estar vagando no fundo do oceano.

Como uma das primeiras faixas compostas após a retomada das atividades, é um tanto quanto natural que “Earth” ainda tenha reflexos da sonoridade que eles seguiam anteriormente. Evidentemente, nada muito áspero, mas o peso aparece de forma um pouco mais predominantemente e ativo, com um estilo que parece embriagado nas águas de um Watershed da vida, ainda que ao próprio modo finlandês. Em seguida, bem parecida com a abertura, “Change” soa também como uma preparação, um crescendo até “The End”, que encerra o disco com inesperados toques instrumentais, resultando em algo um pouco mais na linha do Soen e do Tool.

E o resultado final não é menos do que belíssimo. Apesar do curto tempo, a banda apresenta uma musicalidade belíssima, de poucas influencias e em formatos nem sempre complexos, mas devidamente equilibrada e sabendo como conduzir cada uma das composições. Nature’s Despair é guiado por um sentimento único, no qual cada uma das faixas utiliza como linha guia para trazer os elementos de rock progressivo, folk e post-rock e transportar para um cenário inesperado, semelhante ao proporcionado recentemente pelo disco Cognitive, do já citado Soen, mas com base em suas próprias ideias.

Facilmente um dos mais ricos discos de estreia de 2013, de uma banda que está apenas iniciando a trilhar o caminho que resolveu tomar. Mesmo com uma identidade já muito forte e razoavelmente estabelecida, e basear-se em influências bem claras (os apreciadores de bandas como Anathema, Opeth e Tool podem facilmente identificá-las, como já dito) é notável como ainda sobrou espaço para que muito ainda seja explorado. E se eles tiverem este pensamento, há prosperidade neste caminho a sua frente, o suficiente para atravessar a nevasca de mediocridade lá fora.

Nota 9

Faixas:
1 The Brew
2 Salvation?
3 Isolation
4 The Dust
5 Where Do Whales Breed?
6 Earth
7 Change
8 The End

Por Rodrigo Carvalho

Comentários

  1. Interessei. Vou conferir, apesar de, normalmente, não gostar dos sons que vêm da Finlândia.

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  2. Opa, ouvi este disco na semana de seu lançamento e gostei bastante, banda se continuar nesta crescente promete muito.

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  3. Tenho certeza que essa capa e o nome da banda foram influenciadas pelo Expressionismo Alemão. Césare é o nome do sonâmbulo do filme O Gabinete do Doutor Caligari.

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