Matt Sorum’s Fierce Joy: crítica de Stratosphere (2014)

É interessante notar como certos artistas têm a capacidade de se reinventar e entregar algo completamente inusitado a seus fãs em determinado ponto de suas carreiras. Quando você pensa que não há nada mais que o músico em questão possa oferecer além de seu já tradicional e conhecido estilo, ele aparece e solta um punhado de composições fugindo à regra de tudo aquilo que se espera dele, se é que deveria haver uma.

É exatamente essa a impressão que se tem ao ouvir o mais recente projeto do baterista norte-americano Matt Sorum, que ganhou fama após uma carreira de sucesso empunhando as baquetas para bandas do calibre de The Cult, Guns N’ Roses, e mais recentemente, para o Velvet Revolver. Com a indefinição sobre um novo vocalista e a pausa nas atividades de sua última banda, Matt compôs uma série de canções que ganham a luz do dia sob o nome de Stratosphere, o debut do projeto solo Matt Sorum’s Fierce Joy.

A curiosidade sobre o nome da banda vêm por conta de sua origem, surgido quando Sorum substituiu temporariamente o baterista Mickey Dee no Motörhead, em 2009. Em uma conversa com Lemmy Kilmister, o veterano líder do trio disse sentir uma “alegria feroz” em ainda estar gravando e fazendo turnês. Com a autorização do velho lobo, o baterista decidiu utilizar o nome em seu projeto que já vinha tomando forma desde então.

Um aviso de antemão: não espere nada do que você já ouviu antes de Sorum! A fúria do baterista em composições do mais puro hard rock de outrora em suas bandas anteriores deu lugar a um clima intimista, sereno e com uma veia totalmente voltada para o pop rock, em alguns momentos flertando com o folk e o progressivo. Percebe-se em Stratosphere influências de Beatles, Neil Young, Bob Dylan, David Bowie e, em certos momentos, até mesmo de Pink Floyd. O line up é formado por músicos pouco conhecidos na cena como Randy Ray Mitchell (guitarra, lap steel e slide), Paul III (baixo), Scott Breadman (percussão), Damon Fox (teclados, órgão, mellotron e mini-moog), Brian McCloud (bateria), Lili Haydn (violino), Cameron Stone (violoncelo), Sussan Deyhim (vocais de apoio) e arranjos orquestrais de Thomas Morse. Matt Sorum aqui aparece produzindo, gravando os violões e vocais principais. E não é o cara leva jeito para a coisa? Seu timbre de voz grave se encaixou muito bem com o clima de cada canção, aliado à preferência de Sorum por timbres limpos e cristalinos, violões, arranjos de cordas e pianos em uma ou outra canção. Em Stratosphere, riffs ferozes dão lugar a acordes soltos e músicas com despretensão e sutilezas desconcertantes, com um clima ideal para apresentações em casas de show menores, em detrimento das grandes arenas por onde Matt Sorum já tocou com suas bandas anteriores.

Stratosphere é um disco predominantemente acústico, que tem início com a cinematográfica “Intro (Stratospere Part 1)”, para vir na sequência com “The Sea”, primeiro single do projeto, com seu apelo pop e guitarras lap steel de Ray Mitchell ao melhor estilo David Gilmour, típico para se ouvir em um belo amanhecer ensolarado. Aliás, esse clima predomina ao longo das quatorze canções distribuídas nos pouco mais de cinquenta minutos de Stratosphere, o que o torna sua audição muito agradável e prazerosa. Em seguida, como o título sugere, vem a “bowiana” e excelente “What Ziggy Says”, forte candidata a uma das melhores do disco, juntamente com “Lady of the Stone”, que mescla sons limpos de guitarra e dissonâncias com um belo arranjo de cordas e mudanças de andamento, flertando claramente com o progressivo. 

O caráter experimental do projeto fica explícito no clima tranquilo e atmosférico de “The Lonely Teardrop”, onde Sorum soa como um trovador espacial, mesclando vocais sussurrados com sons da natureza, como gotas d’água e canto de pássaros. Outras canções que merecem destaque em Stratosphere são as belas “Goodbye to You” e “Blue”. “Outro (Stratosphere Part 2)”, continuação da primeira parte, encerra o disco da mesma forma como começou,  como se o próprio Sorum sobrevoasse a estratosfera em órbita a bordo de uma nave espacial contando suas impressões à Terra sobre essa viagem em forma de música um tanto inusitada que foi.

Não se sabe se o projeto irá vingar, nem quais os rumos que Matt Sorum dará á sua “alegria feroz”. Mas é certo que o músico recomeçou com um belo trabalho digno de nota, que dá vontade de ficar ouvindo por horas e horas, contemplando e pensando na nossa própria existência terrestre. Só por isso Stratosphere já vale a audição!

Nota 8

Faixas:
1 Intro (Stratosphere Part 1)
2 The Sea
3 What Ziggy Says
4 For The Wild Ones
5 Goodbye to You
6 Gone
7 Lady of the Stone
8 Ode to Nick Drake
9 Blue
10 Josephine
11 Land of the Pure
12 Killers n’ Lovers
13 The Lonely Teardrop
14 Outro (Stratosphere Part 2)

Por Tiago Neves

Comentários

  1. Parece bacana! Gostei do que li. E a capa também é bem legal.

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  2. Fiquei curioso, será uma surpresa descobrir que o gênio do Guns'n'Roses era o baterista substituto que batia com a cabeça no gongo...

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  3. Disco surpreendente, audição muito agradável. E excelente texto do Tiago.

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  4. Comprei o disco no Itunes imediatamente após ler o texto. Gostei bastante. Mais uma vez agradeço à Collectors pelo excelente trabalho. Sempre nos mantendo atualizados, cientes das coisas boas que surgem no universo musical. VALEU!

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  5. Patrick, Alixvaldo, Ricardo Seelig e André Victor, é muito gratificante ler opiniões como a de vocês a respeito da crítica. Isso nos motiva a sempre trazer boas novidades aos nossos leitores, sempre indo além do óbvio.

    Muito obrigado pelos comentários!

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  6. Texto do CARVALHO!!! Parabéns! Irei dar uma conferida.

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