Incantation: crítica de Dirges of Elysium (2014)

O Incantation não está entre os pilares do death metal em termos de genialidade ou apelo. Não é sucesso de crítica, tampouco público. Há quem diga que seja do segundo escalão do gênero, o que, provavelmente, faz sentido. Porém, a banda capitaneada pelo maestro John McEntee alcançou algo tão ou mais importante do que qualquer reverência estética: respeito e credibilidade.

McEntee, uma das lendas do underground norte-americano, formou a banda em 1989. São pelo menos 25 anos empunhando a bandeira de um estilo que passou por mutações, absorveu influências diversas e ainda se mostra um tanto quanto vigoroso, apesar das intempéries. É nítido que o death metal reagiu melhor ao tempo, sempre implacável, do que o thrash e o black, seus irmãos de sangue.

Em meio a tudo isso, o Incantation conseguiu forjar uma trajetória linear. Regular ao extremo, não oscilou entre álbuns acima da média e trabalhos decepcionantes, como alguns de seus pares. Sempre constante, desenvolveu sua identidade, ainda que a mesma não prime pela originalidade absoluta. No fim das contas, poucas bandas mantiveram-se tão fiéis a uma sonoridade. Algo que tende a ter prós e contras, mas que comprova a ciência de causa que McEntee já demonstrava desde os primórdios.

Décimo trabalho de estúdio, Dirges of Elysium entrega um Incantation em plena forma. Lançado no início de junho via Listenable Records, o disco exala a proposta primordial da banda, calcada na mescla de passagens rápidas e cadenciadas. Tal mistura, friamente calculada, faz a sonoridade transitar entre o death altamente veloz e algo mais lento, que, às vezes, se assemelha ao viés doom de nomes como Autopsy e Asphyx. Tudo, naturalmente, comandado pela guitarra de John McEntee. Riffs gordurosos e lamacentos são o carro-chefe. Sempre executados de forma catedrática.

Quer um exemplo? "Carrion Prophecy", cujo início é como uma aula de alguma matéria batizada de "death/doom metal e suas relações históricas". Arrastada e dona de um peso descomunal, é rapidamente alçada à condição de um dos destaques do álbum. Antes dela, "Debauchery" e "Bastion of a Plagued Soul" sucedem a intro "Dirges of Elysium" e também merecem honras.

Do meio para o final, chama atenção a obscura "From a Glaciate Womb" e toda sua licença poética, seja na letra ou nos tremolos que a constituem, bem como "Impalement of Divinity", claramente influenciada por Slayer da fase Hell Awaits (1985). "Portal Consecration" é apenas mediana. Já "Charnel Grounds" e "Dominant Ethos" passam um pouco batidas. Sobretudo se comparadas à epica "Elysium (Eternity Is Night)" e seus 16 minutos (!) de duração. Sim, um baita exagero. Não precisava ser tão longa. Mas o final dela é qualquer coisa de estupendo, arrebatador.

O baterista Kyle Severn, fiel escudeiro de John McEntee desde 1994, não é nenhum monstro ou uma referência do instrumento, mas faz um trabalho deveras eficiente. O mesmo vale para o baixista Chuck Sherwood e o guitarrista Alex Bouks, que inclusive se desligou do Incantation logo após o término das gravações. Algo normal na rotina da banda, conhecida pelas inúmeras (dezenas?) formações diferentes ao longo dos anos. Um substituto ainda não foi anunciado e, ao que tudo indica, devem se estabelecer novamente como um trio. Ao menos por enquanto.

O que pega um pouco na avaliação geral do Incantation é o vocal. Se na guitarra McEntee se mostra um exímio riffmaster, ao cantar seu desempenho não é semelhante. Além de seu gutural ser quase que ininteligível - mesmo acompanhando as letras no encarte -, não há maiores variações nas linhas vocais, o que, em determinados momentos, gera certo incômodo e monotonia.

Nada, entretanto, que comprometa o resultado final de Dirges of Elysium. Não trata-se de um novo paradigma dentro do death metal, mas de um disco que segue a linha do ótimo Vanquish in Vengeance (2012), seu antecessor, e luta para beliscar uma vaga no top 5 do Incantation, ficando atrás de Decimate Christendom (2004), Onward to Golgotha (1992), Mortal Throne of Nazarene (1994) e, no máximo, mais um ou dois trabalhos. A bela arte da capa é de autoria do israelense Eliran Kantor, que já desenhou para Atheist, Sodom, Master, dentre outros.

No fim do ano a banda volta o Brasil. Mais uma oportunidade para vê-los em ação...

Nota: 8


Faixas

1 Dirges of Elysium 2:12 (instrumental)
2 Debauchery 4:03
3 Bastion of a Plagued Soul 2:40
4 Carrion Prophecy 4:29
5 From a Glaciate Womb 7:38
6 Portal Consecration 3:17
7 Charnel Grounds 2:17
8 Impalement of Divinity 3:44
9 Dominant Ethos 2:42
10 Elysium (Eternity Is Night) 16:23

Por Guilherme Gonçalves

Comentários

  1. A quem diga que são o "segundo escalão", mas eu digo que eles se incluem como um dos primeiros do gênero, a partir do momento em que se mantêm fiéis ao gênero raiz dos quais se inspiraram! Incantation é Incantation!

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