O mundo não precisa de um retorno do Guns N' Roses


Parece uma daquelas manchetes de revistas de fofocas, e em muitos aspectos é isso mesmo. Vamos lá: nas últimas semanas, dezenas, centenas, milhares de sites/veículos em todo o mundo noticiaram que Slash fez as pazes com Axl Rose. O que, logicamente, deu origem a um sem número de rumores sobre o possível retorno da formação clássica da banda. A coisa evoluiu, com a banda postando mensagens enigmáticas em seu Twitter oficial, enquanto pessoas próximas aos músicos dão o retorno cada vez mais como certo. Resumindo: o retorno da banda é iminente e deve ser anunciado nos próximos dias.

O Guns N’ Roses merece um estudo, e bem profundo. A rigor, a banda gravou apenas três discos, sendo que o último registro relevante do grupo saiu há praticamente 25 anos - em 1991, um quarto de século atrás. É inegável a importância que o quinteto teve durante a década de 1980 e início dos anos 1990, isso é inquestionável. Appetite for Destruction, lançado em 21 de julho de 1987, é uma das maiores e melhores estreias da história do rock. Unindo Led Zeppelin e Aerosmith em um mesmo caldeirão, Axl e sua turma gravaram o disco definitivo do glam rock oitentista e um dos grandes álbuns da história do hard rock. E, de lambuja, redefiniram estereótipos, reescrevendo a trama e a atuação de personagens emblemáticos como o vocalista superstar e o guitar hero enigmático.

Então, um EP com outtakes e versões ao vivo para acalmar o mercado, enquanto os integrantes bebiam, cheiravam e transavam com todas as menininhas da cidade. G N’ R Lies (1988) acabou ganhando uma proporção exagerada, levado pelo enorme sucesso de “Patience”, sua principal faixa. Mais combustível para turnês intermináveis, muita grana no bolso e exageros de toda parte.

E essa megalomania culminou nos dois volumes de Use Your Illusion, que chegaram às lojas de todo o planeta em 17 de setembro de 1991. Mas, apesar do exagero de lançar dois álbuns duplos de maneira simultânea, revelando nada mais nada menos do que 30 novas canções ao mesmo tempo para os fãs, o Guns conseguiu conceber dois registros recheados de faixas fortes, que solidificaram o status do quinteto como a maior banda de rock do mundo.

Foi então que tudo começou a desabar. Embalados por doses industriais de ego, bebida e drogas, Axl entrou em conflito com Slash, que brigou com Duff, que brigou com o empresário, que saiu fora... Um monte de confusão. O GNR ainda liberaria o disco de covers The Spaghetti Incident? em 1993 e o ao vivo Live Era ’87-’93 em 1999, ao mesmo tempo em que, um por um, os músicos iam saindo fora do barco. Bye bye Slash, adeus Duff, tchauzinho Matt e todo mundo.

Só restou Axl. Que embarcou em uma jornada épica de mais de uma década, culminando no desastroso Chinese Democracy, lançado em 2008. Ao seu lado, uma enorme banda com três guitarristas e mais um monte de gente, rodando o mundo em apresentações destinadas aos fãs, sedentos por assistir ao vivo a magia que ficou perdida nos anos 1980.

E daí vem essa história de uma possível reunião da formação clássica da banda, com Slash e Duff ao lado de Axl novamente. Sério, gente? A cultura do classic rock é realmente muito nefasta, olhando apenas para o passado e desprezando praticamente tudo que seja produzindo hoje em dia - com exceção, adivinha, dos nomes que entregam uma sonoridade considerada “clássica”. O mundo anda pra frente, e é assim que a gente evolui. É inegável o impacto e a influência do Guns na história do rock, isso ninguém discute. Mas, o que também ninguém discute - com a provável exceção dos mais fanáticos - é que é impossível reviver a força e tudo mais que ficou perdido anos atrás.

Axl Rose tinha 25 anos em 1987. Hoje, tem 53 anos e não consegue cantar como antes, há tempos. Izzy Stradlin, principal compositor da banda, vive os seus cinquenta e tantos anos longe dos holofotes, e por escolha própria. O cinquentenário Duff está mais magro e tem uma vida saudável com seus discos solo, em um contraste violento com a figura inchada e sempre bêbada de 25 anos atrás. Slash tem gravado bons álbuns ao lado de Myles Kennedy, e, musicalmente, tem entregado discos bem interessantes. E Steven Adler virou um frequentador assíduo de programas tipo Celebrity Rehab.

Assim como Axl, Slash, Duff, Izzy e Steven mudaram muito nesse tempo todo, você também mudou. Cresceu, amadureceu, evoluiu. Descobriu novos sons, teve novas prioridades em sua vida. O Guns foi legal, mas é uma coisa do passado, de um tempo que não volta mais. Desejar com um retorno da banda, como se isso fosse trazer de volta toda a magia de décadas passadas, é como acreditar em Papai Noel e outras bizarrices.

Bola pra frente, gente. A fila anda, e a vez do Guns já passou, faz tempo...

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