Review: Angra - Ømni (2018)


Nono álbum do Angra, Ømni marca também um novo capítulo na história da banda, já que é o primeiro disco do grupo sem o guitarrista Kiko Loureiro, que saiu em 2015 para integrar o Megadeth. Marcelo Barbosa, ex-Almah, é o seu substituto.

Ømni é o sucessor de Secret Garden e o segundo álbum do Angra a contar com o vocalista Fabio Lione. Gravado na Suécia, o trabalho foi produzido novamente por Jens Bogren (Kreator, Myrath, Babymetal), o mesmo de Secret Garden (2014). O disco vem com onze faixas e conta com as participações especiais de Sandy e Alissa White-Gluz (vocalista do Arch Enemy), ambas na faixa “Black Widow’s Web”, e do próprio Kiko Loureiro em “War Horns”.

Trata-se de um álbum conceitual construído através de pequenas histórias de ficção científica que se passam em diversas épocas do tempo de maneira simultânea. O ponto principal da trama é a ideia de que a percepção e a cognição humanas serão alteradas por uma inteligência artificial no ano de 2046, mudando assim a forma como vemos e nos relacionamos com o mundo e possibilitando que as pessoas transitem por diferentes momentos temporais. Dessa maneira, segundo a banda, Ømni (que em latim significa “tudo”) conecta as histórias e ideias apresentadas em Holy Land (1996), Rebirth (2001) e Temple of Shadows (2004).

Todo esse contexto por trás do álbum faz com que, em um primeiro momento, as canções de Ømni pareçam atirar para diversos caminhos distintos, causando a sensação de que falta uma certa unidade ao disco. No entanto, a audição mais apurada e, sobretudo, sem pressa do trabalho, revela que as coisas não são assim. Ømni é um trabalho que apresenta uma grande variedade musical, buscada de maneira consciente pelo quinteto. São canções fortes e bem construídas, embaladas em uma sonoridade moderna e atual. Tudo isso faz com que o disco seja, facilmente, o melhor trabalho do Angra deste Temple of Shadows.

Um dos pontos questionáveis não apenas em Ømni, mas na atual formação do Angra, é a presença do vocalista Fabio Lione, ex-Rhapsody. Ainda que o timbre e as interpretações um tanto exageradas do italiano soem realmente mais integradas ao som do grupo neste novo trabalho, em alguns momentos ele parece um peixe fora d’água na mistura, como em "Insania". Porém, como já dito, existe uma evolução em relação à Secret Garden, onde essa sensação incômoda era muito mais forte.

Musicalmente o Angra trilha diversos caminhos em Ømni, olhando para o passado e trazendo alguns dos ingredientes mais marcantes de sua sonoridade. A abertura com “Light of Transcendence” é metal melódico na essência, com as conhecidas influências clássicas da banda, porém com uma pegada atual. Em “Travelers of Time” temos outro ótimo momento, um prog com percussão sutil em sua introdução e grande variedade de melodias no seu desenrolar. A presença de harmonias entre as guitarras de Rafael Bittencourt e Marcelo Barbosa também é motivo de destaque.

Na sequência vem a tão comentada “Black Widow’s Web”, que traz as participações especiais de Sandy e Alissa White-Gluz. Sandy soa afinada como sempre, mas a sua participação só deve repercutir aqui no Brasil mesmo, porque ela pouco agrega à canção. O destaque na “música da Sandy” é mesmo Alissa e seu gutural demoníaco, que cria um interessante contraste não apenas com a voz limpa de Lione mas também com o intrincado instrumental onipresente no Angra.

A pegada clássica retorna em “Insania”, enquanto em “The Bottom of My Soul” temos Rafael assumindo os vocais em uma faixa com uma pegada mais contemplativa e com elementos de prog clássico. Já “War Horns” vem com Kiko Loureiro na guitarra e soa realmente como uma espécie de encontro entre o Megadeth e o Angra atuais, tanto pelos riffs pesados e agressivos quanto pelas generosas doses de melodia.

Um destaque imediato fica com “Caveman”, que retoma a aclamada sonoridade de Holy Land com um foco bastante percussivo e com direito a um trecho da letra cantado em português. Quando o Angra se aventura por essas explorações étnicas, inserindo a música brasileira no metal, invariavelmente o resultado é interessante, e aqui não foi diferente.

“Magic Mirror” vem com um tempero prog e agradará os fãs do Dream Theater. “Always More” é uma balada um tanto quanto esquecível cantada por Rafael e com participação também de Fabio, onde o excesso de sacarose não ajuda em nada na digestão. O contrário acontece em “Silence Inside”, outra com forte pegada prog em seus mais de oito minutos de duração e grande performance instrumental de todos os envolvidos. O encerramento se dá com “Infinite Nothing”, uma faixa clássica que traz melodias de diversas músicas do disco em uma conclusão adequada ao que a banda se propôs a explorar durante todo o álbum.

Ømni é um álbum que explora caminhos musicais variados, porém coerentes com a trajetória do Angra. O trabalho de composição é acima de média, com um ou outro deslize devidamente apontados no texto. Lione soa mais adequado ao universo da banda, ainda que esse processo possa (e deva) evoluir nos próximos anos. Marcelo Barbosa estreia muito bem, não deixando saudades de Kiko Loureiro. De modo geral, como já afirmei acima, é facilmente o melhor disco do Angra em quase 15 anos, desde Temple of Shadows.

Uma surpresa inesperada, e que me agradou bastante.

Comentários

  1. Pra mim o vocal do Lione casou perfeitamente com o álbum, causando uma sensação muito mais intensa ao ouvir as músicas. Acho também que ele se integrou muito bem à banda e não sinto incomodo algum com o vocal dele desde o Secret Garden, acredito que a adição dele ao grupo (junto dos outros novos membros é claro) ajudou a trazer uma nova sonoridade à banda que me agradou demais! No mais eu concordo com a resenha foi uma surpresa no muito agradável que me marcou tanto quanto o Holy Land of Temple of Shadows quando eu os ouvi a primeira vez. Angra mostrou que ainda tem muuuito chão pela frente e eu fico muito feliz com isso. Abraço.

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  2. A questão na minha opinião são essas musicas “solos” do Rafael inseridas no trabalho. Eu, como fã, quero escutar o Angra e não o trabalho solo do Rafael. Nada contra a música em si (bottom of me soul), que é muito bonita, mas fica essa sensação do disco anterior de que o vocalista é descartável. Numa das entrevistas no grupo, inclusive, é fácil perceber essa hierarquia imposta dentro da banda. Legal seria ter uma visão mais “romântica” da banda enquanto grupo, com todos em pé de igualdade (e que a liderança não fosse imposta). Mesmo assim concordo com vcs no que diz respeito a esse último trabalho. Ficou um álbum extremamente prazeroso de se ouvir.

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