O preço absurdo da edição nacional de S&M2, novo álbum do Metallica



Vivemos tempos estranhos, e não só devido à pandemia que marcou 2020. O mercado fonográfico brasileiro também atravessa um momento delicado, com queda na venda de mídia física, diminuição de pontos de venda, grandes redes de varejo em situação financeira delicada e a perda do poder aquisitivo do público consumidor. Há apenas três grandes gravadoras lançando discos no Brasil atualmente: Sony Music, Warner Music e Universal Music. Existe apenas um fornecedor produzindo os CDs dessas empresas, a RIMO, antiga Sonopress. E o mercado de nicho, onde temos o metal e o rock mais pesado além de gêneros como blues e jazz, é suprido por selos médios e pequenos especializados em um determinado estilo, como a Hellion Records e a Shinigami Records.

No meio disso tudo o cenário é de uma economia em queda, aumento de preços em supermercados, crescimento do desemprego e outros aspectos, além do lado emocional das pessoas, abalado ao extremo pelo isolamento ou pela absoluta negação do que está acontecendo no mundo, com o “foda-se” ligado e tentando viver de forma semelhante ao que vivíamos antes do coronavírus mudar o mundo e sem medir as mínimas consequências desse ato egoísta.

Em momentos como esse, a cultura é essencial. É através dela que mantemos nossa mente sã, nossa cabeça saudável. Livros, filmes, séries, música. O consumo da Netflix aumentou, a Amazon Prime cresceu e a Disney+ chega ao Brasil na metade de novembro. Na música, o consumo de streaming responde por 74,5% do mercado nacional, com a mídia física abocanhando apenas 1,4%. E vale lembrar: esses são dados do relatório anual da IFPI divulgado em maio, que computou o consumo de música em 2019, antes do caos provocado pelo Covid-19.


Nesse contexto, a maior banda de heavy metal do planeta lança o seu novo disco, que na verdade é a segunda aventura do grupo na união do metal com a música clássica. S&M2, Metallica ao lado da Orquestra de San Francisco. Um disco lindo, duplo, com uma performance incrível e uma produção excelente. O último registro da banda antes da entrada de James Hetfield na reabilitação, onde o vocalista e guitarrista ficou por quase quatro meses lutando contra seus demônios.

S&M2 foi lançado dia 28 de agosto e é um trabalho espetacular, que mostra que o Metallica ainda tem muito a dar ao mundo. O disco entrou direto no quarto lugar da Billboard 200, superando grandes nomes do pop como Katy Perry. Um sucesso de vendas e de crítica. Mas parece que isso não foi informado para a filial brasileira da Universal Music, que anunciou que o álbum só seria vendido através de sua loja oficial por um preço totalmente fora da realidade brasileira, do mercado e do mundo atual: R$ 174,90 por um CD duplo, fora o frete. Leia de novo os dois primeiros parágrafos deste texto, pense sobre o que está acontecendo ao seu redor e olhe mais uma vez para o preço que S&M2 está sendo vendido pela Universal Music Brasil: R$ 174,90.

Haters infantis, comuns no mundo do metal, já devem estar dizendo “eu não compraria nem por R$ 10”. A resposta é óbvia e direta: ninguém perguntou a sua opinião, deixa de ser idiota e veja o que está acontecendo ao seu redor. Só para efeito de comparação e usando uma rivalidade história, sabe que outra banda tem os seus discos lançados no Brasil pela Universal? O Megadeth. Sim, a banda que você ama e que usa como elemento para atacar o Metallica, e que provavelmente também não terá seus discos lançados no Brasil daqui pra frente – ou, se saírem, custarão também o olho da cara.

Após a reação negativa do público e campanhas online, com fãs entupindo as redes sociais da Universal com reclamações, a gravadora mudou o discurso e decidiu lançar S&M2 em todo o Brasil, distribuindo o CD para as lojas de todo o país. Mas o preço continua esquizofrênico: o mesmo R$ 174,90 que você leu ali em cima. Para efeito de comparação, vamos falar de outro disco lançado em 2020 e que tem uma edição dupla no mercado, em embalagem digipack semelhante ao novo álbum do Metallica: Whoosh!, trabalho mais recente do Deep Purple. Sabe por quanto esse disco está sendo vendido nas lojas de todo o Brasil? Em média por R$ 60. Um álbum com distribuição nacional, de uma das maiores bandas da história, com edição dupla e digipack da Shinigami Records. Esse é o preço de um CD duplo nacional aqui no Brasil: entre R$ 60 e R$ 80.


Então por que então S&M2 custa quase o triplo? Não sei, só os executivos da Universal Music Brasil poderão responder. E há alguns pontos aqui: a mesma Universal lançou em 2019 a edição de cinquenta anos do clássico White Album, dos Beatles, por mais de R$ 150, e segue vendendo a edição especial de aniversário de Abbey Road, também em CD duplo, por R$ 154,90. Esses preços são totalmente diferentes dos praticados pela Sony e pela Warner aqui no Brasil. Outro ponto é que, apesar de a Universal afirmar que a edição de S&M2 que está sendo anunciada em seu site por R$ 174,90 é nacional, eu só acredito pegando uma edição nas mãos e analisando de perto. A razão é simples: anunciado primeiramente com venda exclusiva no site da gravadora, o S&M2 “nacional” está com uma enorme cara de vir de um lote de CDs importado pela própria Universal e disponibilizado no Brasil. Até o momento existem 26 versões diferentes de S&M2 cadastradas no Discogs, maior banco de dados sobre discos do mundo, e nenhuma é brasileira. Esta edição está com cara de ser a norte-americana e, até prova contrária, sigo acreditando que de “nacional” não tem nada.

Isso tudo não seria um problema se o disco fosse vendido por aqui por um valor adequado ao mercado. Entre R$ 60 e, ok, R$ 100. Mas não o triplo do valor praticado para esse tipo de item, o inexplicável R$ 174,90. Você pode comprar ou não, é uma escolha de cada um e ninguém tem nada a ver com isso, até porque cada pessoa sabe o valor que cada item possui na sua relação com a música e quanto pode desembolsar para adquirir um novo disco para o seu acervo. E, além disso, S&M2 é espetacular, como já comentei. Porém, qual a razão desse preço sem sentido, ofensivo em muito sentidos e fora da realidade? 

Só a Universal pode responder. E duvido que responda.


Comentários

  1. Medo de saber o preço do BluRay caso eles resolvam lançar por aqui...

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  2. Abusivo demais esse preço. Uma falta de respeito com o consumidor e os colecionadores.
    Eu mesmo estava ansioso pelo lançamento para poder aumentar a minha coleção, mas me decepcionei com o preço.

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  3. O Brasil é um país complicado em todos os aspectos, diga-se de passagem que é um dos maiores consumidores de música no mundo, mas quando se trata de mídias físicas a exploração vem forte. Como podemos incentivar que novas gerações comprem cd, vinil, livros com esses valores, música é cultura e todos deveriam ter acesso ( música boa, não cultura de massa ), mas hoje está restrita apenas para pessoas que tem um poder aquisitivo alto, haja vista, que devemos ter consciência do valor justo de um produto, pois um cd importado a maioria das vezes não difere muito de um nacional. Quanto a situação da pandemia, o descaso com a realidade é cultura, sempre vai existir um punhado de pessoas no mundo pensando com apenas um neurônio, perante a isso faz com que as pessoas boas e sensatas sofram e pague o preço de tabela. Esse é um mundo do individualismo, egoísmo, ódio, materialismo ! Lemmy disse certa vez se pegasse todo o dinheiro do mundo e dividisse em partes iguais para todos, em um ano teria um punhado de pessoas que teriam mais dinheiro que todo o resto, achei muito interessante e realista esse comentário. Positividade e Paz !

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  4. Um preço violento, injusto, imoral. Reflexo de nossos tempos. Me faz pensar com tristeza na grande possibilidade de ficar com minhas coleções desfalcadas daqui pra frente. Pois esse valor sinaliza o que está por vir em lançamentos de peso futuros (Iron Maiden, por exemplo). É, abertamente, um abuso em cima da paixão do colecionador, do tipo "pague o que eu quero ou fique sem", pois sabem da especificidade que este nicho tomou. Que toda a vergonha desse oportunismo chulo recaia sobre a Universal Music!

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    1. Isso meio que começou com os relançamentos do Led Zeppelin...o disquinhos duplos são um roubo, aí passou para alguns dos Beatles e finalmente Metallica. Os CDs vão ser transformados em um produto premium...igual estão fazendo com boa parte dos quadrinhos e livros em capa dura.

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    2. Perfeitamente Fábio, a ideia é essa mesmo, produtos premium. Penso que não seria nada mal, se o produto final fosse de alta qualidade. Mas a realidade é outra. Os digipacks daqui, por exemplo, são de péssima qualidade. Além do material grosseiro e de péssimo acabamento, há o problema da logística: não raro todos nós temos um maldito digipack machucado, amassado, arranhado ou esgarçado pelo mal manuseio. Se comprado pela internet então, essa chance mais que dobra. Portanto eles deveriam saber que não adianta de nada gourmetizar os produtos se não há um compromisso final com a qualidade, quesito esse muito caro a nós né. Lamentável.

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    3. De fato...os digipacks...principalmente das "majors" desmancham rs rs rs

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  5. Foi decretado (sei lá com quais intenções...) que a mídia física deve ser praticamente extinta no nosso país. Colecionadores de DVDs e Blurays de filmes tem reclamado da mesma coisa. Esse é um erro enorme para quem tem fome de cultura, pois apesar do streaming ser muito legal, há um pequeno efeito colateral: a cópia não é sua e você fica restrito ao que as empresas disponibilizam e pelo tempo que for interessante SÓ para elas.

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  6. Eu gostaria de entender essa conta, como um cd de U$12,00 pode chegar a R$180,00 no Brasil?Deve se levar em consideração que U$12,00 é o preço de venda ao consumidor, já com a margem de lucro da gravadora e do revendedor. Dona Universal tá estranha essa conta!

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  7. Realmente, sem noção o que eles fazem. Sem a mínima consideração. Mesmo com o dólar do jeito que está, não justifica este preço surreal. E só um adendo... o Whoosh! está sendo vendido a R$55,00. Pelo menos em todas as lojas que vi até agora. E foi exatamente o quanto paguei em loja física.

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  8. Embora curta muito a banda, não encaro o valor, acredito que essa imposição de valor aumente ainda mais downloads gratuitos e assim, com essa prática abusiva de valores, cada vez mais às vendas da mídia oficial diminuam.
    Fiquei até desanimado, estava inclusive interessado, mas vou aguardar até encontrar um valor justo a ser pago.

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