Existe um tipo de alegria que só quem coleciona CDs conhece. Não é sobre ter a edição mais luxuosa, nem sobre completar uma discografia com links rápidos de loja online. É sobre garimpar. Sobre entrar em um sebo sem saber o que vai encontrar. Sobre aceitar o caos das prateleiras, o pó que se acumula sobre o plástico antigo e aquela sensação reconfortante de que qualquer coisa pode acontecer.
Garimpar é um ato de fé. Você nunca sabe se vai sair de mãos abanando ou com um tesouro que, até então, parecia existir apenas em um sonho distante. Às vezes é só mais do mesmo: edições comuns, preços altos, pilhas desorganizadas. Mas basta um único achado como um item fora de catálogo, uma prensagem nacional esquecida ou aquele item importado impossível de ser encontrado de outra forma e em outro lugar, para transformar a visita em uma pequena vitória pessoal. E é justamente essa imprevisibilidade que mantém o ritual vivo.
Os sebos são lugares onde o tempo se dobra. Ali, álbuns que marcaram gerações dividem espaço com títulos que ninguém lembra mais, e é essa convivência improvável que cria as melhores histórias. Você pode passar meses atrás de um CD, pesquisando, monitorando grupos, comparando preços e então, do nada, ele aparece diante de você por um valor quase simbólico, te esperando tranquilamente em uma prateleira empoeirada. É uma recompensa silenciosa, mas que aciona algo profundo: a sensação de que, naquele dia, o universo conspirou um pouco a seu favor.
Existe também o prazer da procura em si. A mão que desliza pelas fileiras, o olhar treinado para identificar lombadas diferentes, a adrenalina que sobe quando você puxa um disco e percebe que é algo especial. Garimpar é um exercício de ritmo: um pouco de paciência, um pouco de intuição, um pouco de sorte. É um momento em que o colecionador se desconecta de tudo e se conecta apenas com o objeto de desejo: o álbum, a música, a história que vem junto.
E talvez esse seja o maior encanto dos sebos: eles celebram o inesperado. Em um mundo em que tudo é rastreável, pesquisável e entregue de forma cada vez mais rápida, ainda existem lugares onde o acaso manda. Onde você encontra aquilo que nem sabia que estava procurando. Onde cada visita pode render uma história nova.
Colecionar CDs é sobre música, claro. Mas garimpar em sebos é sobre experiência. Sobre narrativa. Sobre memória. Sobre a sensação de descobrir algo que não está mais ao alcance de todos, mas que, por alguma razão quase mágica, estava ao alcance das suas mãos naquele exato momento.
E é por isso que, mesmo com o streaming dominando quase tudo, ainda existe algo especial em empurrar a porta de um sebo e começar a explorar. Porque, no fim das contas, colecionar também é sobre viver pequenas aventuras. E poucas são tão recompensadoras quanto encontrar uma raridade onde você menos esperava.

Comentários
Postar um comentário
Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.