Castiga! - Bem-vindos ao planeta Gong


Por Marco Antonio Gonçalves
Colecionador

É chegada a hora de adentrar a nave espacial e partir rumo ao misterioso planeta Gong. Combo anárquico formado em 1968 pelo guitarrista e vocalista australiano Daevid Allen - figura vital na concepção do que ficou conhecido no rock progressivo como Canterbury Sound. Além do Gong, outras bandas fantásticas fazem parte deste cenário, como Wilde Flowers, Caravan, National Health, Camel, Hatfield and the North, Matching Mole, Egg, Khan e Soft Machine.

A mitologia Gong começa a tomar contornos em outubro de 1967, época em que Allen ainda integrava o embrionário Soft Machine e que até então havia lançado apenas um compacto. Ao retornar com o grupo britânico de uma apresentação em Saint Tropez, Allen teve negado seu visto de entrada na Inglaterra por ter trabalhado de forma ilegal no país. Forçado a permanecer na França e residindo numa casa flutuante em Paris, o músico começou a maquinar a saga do planeta Gong ao lado da jornalista, poetisa e companheira Gilli Smyth.

Em meio a um estilo de vida comunitário e de mentalidade hippie, Allen encontrou na cidade-luz o habitat natural para encaixar as peças do seu quebra-cabeça e construir um veículo capaz de difundir o seu ideal revolucionário e anárquico no formato “insanidades musicais” … Gong! 

O resto é história! Grandes álbuns, capas sensacionais, muitas formações, trocentas ramificações. Um grupo multicultural que influenciou toda uma geração de rock espacial com sua mescla de progressivo, psicodelia, jazz, dadaísmo e improvisação. Escutar seus discos me faz sentir um autêntico Zero, the Hero - um viajante terráqueo que se perde no espaço e encontra o Planeta Gong. É hora de decolar!


Neste instante, escuto o álbum "You", lançado em 1974 pela Virgin Records e marcado pela despedida (temporária, é verdade) do lunático Daevid Allen do planeta Gong - o planeta verde-transparente ignorado pelos astronautas e habitado por seres estranhos e seus instrumentos e objetos surreais. "You" é o terceiro álbum da trilogia Radio Gnome Invisible (sendo o primeiro o LP "The Flying Teapot" e o segundo o disco "Angel’s Egg"), todos focados na mitologia criada por Allen e Smyth acerca de “Radio Gnomes”, “Crystal Machines”, “Octave Doctors”, “Pothead Pixies” ou “Zero the Hero”.

Considerado por muitos como a obra-prima do Gong, "You" mantém a bizarrice literária e o humor
nonsense da trupe, mas com um desempenho maior na parte instrumental e produção mais caprichada que os outros dois discos da trilogia. Uma viagem musical onde os tripulantes são Daevid Allen (guitarra e vocal), Steve Hillage (guitarra), Tim Blake (teclados), Didier Malherbe (teclados, flauta, saxofone, vocal), Gilli Smyth (vocais), Mike Howelett (baixo), Pierre Moerlen (bateria e percussão), Mireille Bauer (percussão) e you (sim, você mesmo) como convidado espacial.

O disco abre com o mantra “Thoughts for Naught”, passa pela cômica “APH.P.’s Advice” e chega a “Magick Mother Invocation”, que serve de introdução para a entrada em outra dimensão: “Mater Builder”. Daí então, será possível acompanhar um Steve Hillage solando de forma insana a sua guitarra, Didier Malherbe mandando ver nos trabalhos de flauta e sax, Tim Blake viajando em sintetizadores e teclados ultradimensionais, Mike Howelett comandando um baixo alucinado e Pierre Moerlen arrebentando com suas peripécias na batera. Inclua aí vocais dementes por todos os lados, contrastando com a audição de pássaros imaginários que sobrevoam o experimentalismo caótico deste novo mundo.

Um passo mais e “A Sprinkling of Clouds” te joga em pleno espaço sideral. Tome cuidado e se agarre a cada instrumento que vai surgindo na música e tente voltar à Terra. Primeiro teclado, depois sintetizadores, seguidos por baixo, bateria, guitarra, sax, flauta e … surpresa: você caiu numa armadilha instrumental nervosa e inquietante. ”Perfect Mystery” é sua válvula de escape. Tempo suficiente para recarregar as baterias, respirar estrelas e partir para um novo itinerário intergalático.

“The Isle of Everywhere” traz sussuros e ecos de Gilly Smyth que nos remetem à órbita psicodélica. E dá-lhe baixão pulsante e suingado, improvisos chapantes de sax e a guitarra marcante de Steve Hillage. Para encerrar, “You Never Blow Yr Trip Forever” lhe conduz para a porta de saída deste mundo pacífico, mas ao mesmo tempo fantástico e assustador. Siga a voz débil de Allen, mergulhe profundamente na sonoridade que mistura flauta, teclados, baixo e bateria e aterrize finalmente no topo de um LSD. Calma, você já chegou em solo terrestre. Basta agora disseminar seus ensinamentos místicos e preparar o terreno para novas aventuras musicais. Boa sorte!


Quanto à discografia da banda, dá pra fazer uma coleção de respeito. Desde a estréia em 1969 com "Magick Brother, Mystick Sister" (lançado pelo selo BGY e creditado a Daevid Allen e Gilli Smyth), até o último gravado em estúdio ("I Am Your Egg", de 2003), são mais de 30 álbuns, contando os discos ao vivo. 

Em relação às constantes mudanças de formação, inevitavelmente outras agremiações foram surgindo a partir do Gong. Só para se ter uma idéia, além dos trabalhos solo de Daevid Allen e Steve Hillage, o universo Gong conta com diversas ramificações criadas por ex-integrantes e seguidores de sua mitologia: Mother Gong, Planet Gong, Pierre Moerlen’s Gong, Gongzilla, Gongmaison, New York Gong, Gong Matrices e por aí vai. Essa árvore genealógica musical ficou conhecida como a Gong Global Family.

Em 1992, Allen e Didier Malherbe reformaram o Gong e lançaram o disco "Shapeshifter", que segundo consta, é a quarta parte da série
Radio Gnome Invisible. Em 2000, uma quinta parte foi lançada: "Zero To Infinity", trazendo participações de Gilli Smyth e de Mike Howlett, baixista da formação original. Nesse retorno do Gong dá para perceber influências da música eletrônica e também da música indiana em sua estrutura sonora. Uma das mais recentes ramificações do Gong é o Acid Mothers Gong, uma união de Allen com o grupo japonês de música eletrônica e psicodélica Acid Mothers Temple.

Só para constar, em novembro de 2007 Allen realizou uma série de apresentações no Brasil com algumas das ramificações do Gong, sendo uma delas o combo Daevid Allen & Gong Global Family. A formação era composta por Daevid Allen (vocal e guitarra), Josh Pollock (guitarra, megafone e percussão), Fred Barley (bateria e percussão), Fabio Golfetti (guitarra), Gabriel Costa (baixo) e Marcelo Ringel (flauta e saxofone). Os concertos em São Paulo ocorreram no Teatro Popular do Sesi. É claro que eu estava lá, firme e forte! O ingresso custou míseros três reais (acreditem!) e posso dizer que foram os três reais mais bem investidos da minha vida. 

In memoriam ad eternum!!

Comentários

  1. Texto muito louco. O cara tomou um ácido ao escrever rs
    E três reais no show do Gong é p/ nunca mais rs

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  2. Loucura, loucura, loucura...

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  3. Texto chapinante e disco idem.

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