Gelo Preto em Buenos Aires


Por Maurício Rigotto
Escritor e Colecionador
Collector's Room

Conforme prometido a alguns dias, quando escrevi sobre o show do AC/DC em São Paulo, volto para compartilhar com vocês as minhas impressões sobre a passagem da banda australiana pela capital da Argentina.

Cheguei em Buenos Aires no dia 05 de dezembro, véspera do último dos três shows do grupo na cidade (02, 04 e 06/12). Durante o dia perambulei pelo centro e diversos bairros, e em todos os lugares haviam pessoas trajando camisetas do AC/DC.

No início da noite, fui até a frente do Palácio Duhau Park Hyatt Hotel, onde a banda estava hospedada, e cerca de 40 ou 50 fãs aguardavam na calçada alguma aparição dos roqueiros. Como a fachada do hotel é envidraçada, todo o saguão era visível da calçada. Após cerca de trinta minutos da minha chegada, a porta de um dos elevadores se abriu e dele saíram Phil Rudd, Cliff Williams e três membros da equipe; do outro elevador saíram Malcolm Young, Angus Young, Brian Johnson e mais alguns integrantes do staff da banda. Angus, trajando uma surrada e desbotada jaqueta jeans, dirigiu-se até a porta principal do hotel e acenou sorridente para nós. Em seguida todos desceram as escadarias rumo à garagem no subsolo. Logo saiu do estacionamento uma comitiva formada por cinco vans brancas idênticas, todas com vidros pretos que impossibilitavam-nos a identificar quem estava em qual dos veículos. Na última van, alguém com uma filmadora profissional filmava os fãs na calçada.

Na tarde do dia seguinte rumei ao estádio do River Plate, onde uma multidão impressionante aguardava a abertura dos portões para o último show do AC/DC na cidade. Pontualmente às vinte e uma horas o AC/DC subiu ao gigantesco palco e um dos maiores delírios coletivos que já vi tomou conta da plateia, que saltava e gritava enlouquecida em reverência a seus ídolos. Como o repertório foi exatamente o mesmo de São Paulo, vou me abster de citar as canções e me deter na performance, que embora contando com o mesmo profissionalismo extremado da banda, pareceu ainda mais vigorosa na Argentina. Devido à fama do país de possuir o melhor e mais fanático público de rock do mundo, Buenos Aires foi escolhida pela banda para a gravação do DVD oficial da
Black Ice Tour, além de ser a única cidade do mundo a receber três espetáculos seguidos da turnê.

Estar no meio dessa multidão foi divertido e assustador. Quando todos começam a pular não se tem a escolha de não acompanhar. Mesmo se eu não quisesse (o que não era o caso), eu era levado junto com a massa. A minha volta, além dos hermanos, havia brasileiros, chilenos, uruguaios e paraguaios. Ainda conversei com ingleses e holandeses que seguem a banda pelo mundo. Ao perguntar a um argentino o motivo de tamanha histeria, a resposta foi curta e direta: "
Temos calor humano".

Eu já havia visto os Rolling Stones no Brasil e na Argentina e conhecia o diferencial do público portenho. Agora o fanatismo argentino, único no mundo, está sendo reconhecido pelos próprios artistas, que cada vez mais escolhem o país para gravar seus vídeos oficiais de suas turnês mundiais. Madonna (
Sticky & Sweet Tour 2008); Kiss (Alive 2009); The Police (2007) e U2 (2006), além deIron Maiden e Megadeth, são alguns dos nomes que escolheram Buenos Aires para gravar os DVDs de suas turnês mundiais. Segundo Débora Filc, da Time For Fun, produtora que trouxe o AC/DC para a América do Sul, "a principal razão para que elejam a Argentina é, sem dúvida, a euforia e empolgação do público, algo que não é visto em nenhum outro lugar ao redor do mundo. As filmagens que mostram o público pulando ensandecido são um fenômeno único no planeta e elevam muito a qualidade do DVD". Maria Florência Puppo, da Sony Music, que há vários anos acompanha as estrelas internacionais pelo país, conta que já presenciou vários astros chocados e perplexos com o fanatismo argentino. Segundo Puppo, "na hora de decidir onde gravar, qualquer produtor que assistir aos DVDs de Madonna, U2 ou AC/DC em Buenos Aires seguirá o mesmo caminho".

Apesar do câmbio adverso para os cachês dolarizados das grandes bandas internacionais, 198 mil ingressos foram vendidos para as três noites (média de 66 mil pessoas por noite), gerando seis milhões de dólares de arrecadação. O show que presenciei foi o último da parte americana da turnê. O AC/DC só voltará a se apresentar no dia 28 de janeiro na Nova Zelândia, seguindo para casa, onde tocarão em Sydney e Melbourne. Quanto a mim, fico por aqui, ainda maravilhado pela oportunidade de presenciar dois super shows do AC/DC em um intervalo de nove dias.
Black Ice!

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