Castiga!: o santo groove de Little Beaver


Por Marco Antonio Gonçalves
Colecionador
Sinister Salad Musikal

Cantor, compositor e guitarrista americano de r&b, soul e funk, Little Beaver nasceu Willie Hale em Forrest City, Arkansas, no dia 15 de agosto de 1945. Ainda criança, por conta de seus dentes grandes e ressaídos, ganhou de um saxofonista local o apelido de “pequeno castor” – alcunha incorporada anos depois ao seu nome artístico. Ainda na infância, se interessou por blues e guitarra, escutando as composições de Blind Roosevelt, Bobby “Blue” Bland e B.B. King.

No início dos anos sessenta mudou-se para a Flórida e lá desenvolveu suas aptidões no canto e na guitarra. Em 1969, já como músico profissional, foi contratado para atuar nos estúdios da TK Records em Miami. A gravadora (extinta em 1981) reunia vários selos e era capitaneada pelo executivo Henry Stone. Figura tarimbada da cena local, Stone foi o responsável por difundir o Miami Sound e o Souther Soul, além de ter gravado alguns dos primeiros trabalhos de Ray Charles e colaborado com James Brown durante muitos anos.

Descolado, Beaver fazia parte de uma equipe de músicos que contava também com Harry Casey, futuro vocalista e líder da KC and The Sunshine Band. Nesse período participou de diversas sessões em estúdio, gravando ao lado de nomes como Latimore, Betty Wright, Timmy Thomas, George e Gwen McCrae, entre outros. Entre 1972 e 1976, já com um estilo musical definido e com o aval de Henry Stone, gravou quatro discos pela companhia através do selo Cat.


Neste instante, estou escutando os seus dois primeiros álbuns como artista solo, os Lps Joey (1972) e Black Rhapsody (1974). Dois registros muito bons que mostram uma mistura altamente suingante de r&b, soul e funk. O play de 1972 é a sua estreia individual, trazendo o soul na medida black, como mostram as faixas “That’s How It Is” (com direito a arranjo de cordas para embalar a alma) e“Katie Pearl”, contendo mais de onze minutos de puro feeling.

Outros temas são mais voltados ao blues (“Give a Helping Hand”, “I’m Losin the Feelin” e “What the Blues Is”), indicando que B.B. King é seguramente uma de suas influências. O lamento da guitarra de Little Beaver pode ser notado na ótima versão de “Two Steps From the Blues”, que já conhecia por intermédio de Bobby “Blue” Bland. “Joey”, faixa que leva o nome do disco, é a minha predileta, tendo alcançado na época a 48ª posição nas paradas de r&b americanas. Também, pudera: o grude sonoro é substancialmente pegajoso!

Produzido por Steve Alaimo, o disco é uma pérola obscura da indústria fonográfica e item imprescindível para os amantes da música negra americana. No geral um belo trabalho, trazendo composições inspiradíssimas, aliadas a frases de guitarra impecáveis e ótimo trabalho vocal de Beaver.


Já o álbum Black Rhapsody de 1974 é totalmente instrumental e apresenta uma pegada mais funky que o registro anterior, com levadas invariavelmente grooveadas e cheias de suingue. Há composições próprias matadoras como “Blues For Mama” (aqui ele incorpora B.B. King sem dó nem piedade), “Hit Me with Funky Music” (com a guitarrinha estilosa despejando efeitos wah wah) e “A Tribute to Wes” (uma homenagem ao guitarrista de jazz Wes Montgomery, outra forte influência).

Rola ainda uma releitura maneiríssima de “Summertime” de Heywood & Gershwin, num instrumental fascinante que já valeria o disco. O lado B do vinil é ocupado por três clássicos da black music (“Just My Imagination”, “Never Can Say Goodbye” e “Let’s Stay Together”) em versões personalíssimas, tocadas com alma e devoção pelo músico americano. Produzido por Richard Finch, é um álbum propício para os apreciadores da música instrumental com sotaque groove. Rare groove!!


Os outros dois registros de Little Beaver pelo selo Cat são Party Down (cuja faixa título é seu maior hit) e When Was the Last Time, lançados em 1974 e 1976, respectivamente. Ambos esbanjam qualidade nos quesitos feeling e técnica e são tão bons quanto os dois primeiros. Quando conseguir as cópias em vinil – em meio às comemorações pelo feito – prestarei uma homenagem postando suas respectivas resenhas. Afinal, não é sempre que se acha essas belezinhas dando sopa por aí.

Pesquisando, fiquei sabendo da existência de outro disco de Beaver intitulado Love & Affection – From the House of Correction, lançado em 1997 pelo selo Essential. Nunca escutei esse play, mas se achá-lo em algum sebo compro no escuro sem pestanejar.

Recentemente, Beaver foi recrutado por Betty Wright para participar das gravações dos álbuns The Soul Sessions (2003) e Mind, Body & Soul (2004) da cantora inglesa de soul e r&b Joss Stone. É o “pequeno castor” em plena atividade.

Buenas, a dica “black bolha” da semana está dada. De uma coisa estou certo: estas bolachinhas da marca Little Beaver vão ficar na estante junto aos discos de Grant Green, Melvin Sparks, Milton Wright, Dennis Coffey, Shuggie Otis e outras maravilhas do gênero.

Salve o santo groove!!!

Comentários

  1. Marco... sua falta é muito sentida na comunidade do Poeira Zine! Nunca manifestaste opiniões de caráter duvidoso. Aparece lá, rapaz!

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