Kiss (Arena Anhembi, São Paulo, 17/11/2012)

Em sua quinta tour pelo país, é curioso lembrar como o Kiss era uma atração realmente transgressora há 20 anos, quando da sua primeira visita ao Brasil, em 1983. Naquela época, o Kiss era um grupo considerado "perigoso" e ser fã da banda era um verdadeiro ato de rebeldia. Hoje, um show do Kids in Service of Satan (nome idiota atribuído à banda pelos evangélicos sem noção dos anos 1980) representa apenas mais um programa para toda a família, absolutamente inofensivo, mas nem por isso menos encantador.

A diversão começa antes mesmo do primeiro acorde, já nos arredores do Anhembi. São centenas (talvez milhares) de pessoas de todas as idades circulando com a maquiagem do seu integrante favorito, esperando ansiosamente pela abertura dos portões.

Antes da atração principal, o Viper encara os 25 mil membros do Kiss Army com a naturalidade de quem tem mais de 25 anos de estrada. Com um set curto e direto, composto por suas músicas mais conhecidas, a banda agradou um público que, em sua grande maioria, não estava ali para assisti-los. O grande destaque vai para a performance vocal de Andre Matos, em grande forma e em ótima noite. Simpático, contou com o carinho dos paulistanos e mostrou que ainda é o melhor frontman brasileiro do estilo. Vale mencionar também o batera Guilherme Martin: sua pegada mezzo punk mezzo hardcore empresta ao Viper um groove totalmente diferente das bandas de metal melódico, em geral com bateristas que são técnicos demais ou simplesmente muito quadrados. Pra completar, Pit Passarel não teve tempo suficiente para encher a cara (como aconteceu em quase todas as datas da To Live Again Tour), tocando direitinho as músicas que compôs. O final com "We Will Rock You" do Queen foi esperto, fazendo o Anhembi cantar junto, coisa que acabou não acontecendo nem mesmo com "Living for the Night". De qualquer forma, para uma banda que ficou tanto tempo inativa, o show foi um sucesso. Ponto para o Viper.

Meia-hora depois, saem dos auto-falantes as palavras que todos queriam ouvir: "You wanted the best, you got the best. The hottest band in the world: Kiss!".

Da famosa introdução até Paul Stanley destruir sua guitarra no final, um show do Kiss é marcado por uma sequência de momentos icônicos da história do rock. Resultado de aproximadamente 40 anos de carreira, o espetáculo é cuidadosamente ensaiado e coreografado. Está tudo lá: Gene cuspindo fogo e sangue, Paul voando por cima do público para cantar "Love Gun", Tommy Thayer soltando foguetes da guitarra que um dia foi de Ace Frehley, a bateria de Eric Singer levitando como a de Peter Criss e, claro, Gene Simmons mostrando a língua que é, junto com o logotipo dos Rolling Stones, a mais famosa do planeta.

Apesar da grande ênfase visual, com direito à produção completa e idêntica ao show da tour americana, o que garante mesmo o sucesso do Kiss é a força das composições. O começo é arrasador, com "Detroit Rock City", "Shout It Out Loud" e "Calling Dr. Love". As músicas de Monster, apesar de excelentes, dão uma esfriadinha no show. Infelizmente, não é todo mundo que acompanha os trabalhos mais recentes, mesmo de suas bandas favoritas. Sem trocadilho, o clima volta a esquentar com "Hotter Than Hell" e "I Love It Loud", esta última, talvez, o maior hit da banda no Brasil. Em "Outta This World" é a vez de Tommy comandar a festa, cantando bem demais e, na boa, não deixando ninguém ficar com saudade do Spaceman original.

Em um show qualquer os solos seriam a hora certa de ir ao bar para pegar mais uma gelada, mas neste caso ninguém abriu mão de ver o duelo entre Tommy e o fantástico batera Eric Singer, que usou até uma bazuca de festim para "detonar" o guitarrista. A partir de "God of Thunder" até "Rock and Roll All Nite", foram mais oito clássicos, culminando no apoteótico final repleto de explosões e fogos de artifício.

É claro que nem tudo foi perfeito. Pra começar, há tempos que a voz de Paul Stanley já não é mais a mesma e, nesta tour sul-americana em particular, estava ainda pior. Nada comprometedor, já que Paul compensa com muito carisma e entrega. Outro ponto baixo é o tempo que a banda aplica a determinadas músicas, tocando muito, mas muito devagar. Canções como "God of Thunder" e "Hotter Than Hell", só pra citar os exemplos mais evidentes, soam como se estivessem com o freio de mão puxado. Perto da pegada do show do Monsters of Rock de 1994, o resultado é bem inferior. Sei que os chefões Paul e Gene estão ficando velhinhos, mas com um batera como Eric Singer na retaguarda chega a ser um desperdício.

De qualquer forma, são detalhes pequenos comparados à alegria que um show do Kiss proporciona. Alegria que vi estampada na cara de vários amigos e, principalmente, no rosto de um garotinho de no máximo 8 anos que estava ao meu lado, no colo do seu pai. Por tudo isso o Kiss continua a ser uma das melhores portas de entrada do rock, levando muita gente a começar belas jornadas pelo mundo da música.

(por Fabian Oliveira)

Comentários

  1. Estive lá presenciando o espetáculo!! Ótima resenha, parabéns!!!

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  2. belo texto..comecei a ouvir rock com o kiss quando achei um disco deles (Unmasked)perdido nas coisas do pai de um amigo meu,não cheguei a ouvir o disco,mas a imagem "explosiva" que o kiss passava me fez ter vontade de escutar e saber mais sobre aqueles caras mascarados...uhaeuheauh o Kiss foi literalmente a minha porta de entrada pro mundo do Rock n' roll junto com Guns e Led zeppelin..

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  3. Ótima Matéria, estava lá e conferi esse espetáculo que só o KISS pode nos dar. Só falta corrigir essa parte " a bateria de Eric Carr levitando como a de Peter Criss " Nesse ano completam-se 21 anos da morte de Eric Carr, o baterista atual é Eric Singer.

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  4. Bela resenha, quem esteve lá pode verificar o quanto o KISS é forte no palco.

    Ficam apenas duas ressalvas:

    1- O Pit tava bem fora de si no show, visivelmente embriagado, imagino o que ele deve ter andado aprontando em outros shows por aí. Mas o show do Viper foi mto bom mesmo. E os destaques realmente foram o André e o batera.

    2- A voz do Paul tava muito boa! O show de 2009 foi péssimo nesse quesito, a voz dele estava péssima, mas dessa vez eu vi muitas pessoas comentando bem da performance dele.


    Novamente, grande resenha!

    Abraço!!!

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  5. Legal essa resenha do show, e estou lendo justamente no dia em que minha esposa antecipou meu presente de Natal e me deu o CD "Monster" edição em 3D, fechou meu ano com ouro!

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