Livro: O Cara da Plebe, de Philippe Seabra (2024, Belas Letras)


O Cara da Plebe
, livro escrito por Philippe Seabra, é um relato apaixonado sobre música, política e resistência, contado sob a perspectiva de alguém que viveu intensamente os altos e baixos do rock nacional. Seabra, vocalista e guitarrista da Plebe Rude, revisita sua trajetória com sinceridade e detalha os desafios enfrentados em uma época em que o rock brasileiro era mais do que um gênero musical – era um grito de revolta e contestação.

Uma das maiores riquezas do livro é sua capacidade de transportar o leitor para o efervescente cenário musical de Brasília, cidade que, apesar de planejada para ser um centro político e administrativo, acabou se tornando um dos principais berços do rock brasileiro nos anos 1980. Seabra narra como a cidade, aparentemente fria e burocrática, tornou-se o ponto de encontro de jovens inconformados que encontraram na música uma forma de expressão e resistência.

A Plebe Rude surgiu em meio a esse cenário, ao lado de bandas como Legião Urbana e Capital Inicial, que também bebiam da energia contestadora daquele período. O livro explica como esse movimento nasceu em meio à ditadura militar e se consolidou durante a redemocratização do Brasil, influenciado tanto pelo punk rock das bandas ingleses e americanas quanto pelas particularidades da realidade brasileira. Seabra reflete sobre como essa música de protesto dialogava diretamente com uma juventude insatisfeita e ávida por mudanças.

A forma como Philippe Seabra constrói sua narrativa é um dos pontos fortes do livro. Seu estilo é direto e envolvente, sem floreios desnecessários, transmitindo a mesma energia crua e visceral das músicas da Plebe Rude. O tom da escrita é, em muitos momentos, reflexivo, mas também possui um ritmo ágil que prende o leitor. A linguagem acessível e franca torna o livro interessante não apenas para fãs da banda, mas para qualquer pessoa interessada em histórias de resistência cultural. Seabra evita a armadilha do egocentrismo comum em algumas autobiografias e, em vez disso, oferece uma visão equilibrada sobre sua própria trajetória, reconhecendo erros e acertos sem cair em exageros ou autoindulgência.


Seabra não poupa detalhes sobre as dificuldades enfrentadas por uma banda de rock no Brasil. O livro expõe os desafios do mercado fonográfico, os conflitos internos na banda e as pressões externas que muitas vezes minavam o potencial do grupo. Ele relembra episódios de censura, boicotes e dificuldades financeiras, demonstrando como o sucesso no mundo da música está longe de ser um caminho linear e glamouroso. O autor também reflete sobre a transição da indústria musical ao longo dos anos, desde a era do vinil e das grandes gravadoras até a chegada da internet e do streaming, mostrando como essas mudanças afetaram a Plebe Rude e sua forma de fazer música.

Ao longo da narrativa, Philippe Seabra destaca a importância da Plebe Rude como uma banda que nunca se curvou às exigências comerciais e sempre manteve sua essência crítica. Canções como “Até Quando Esperar” e “Proteção” são analisadas dentro de seu contexto, mostrando como a banda conseguiu traduzir o sentimento de indignação de toda uma geração.

A autobiografia não é apenas um relato pessoal, mas também um documento histórico sobre o rock brasileiro e sua relação com os momentos políticos e sociais do país. Além de entreter, o livro faz o leitor refletir sobre como a música tem o poder de influenciar e dar voz a causas importantes.

Com 640 páginas e disponível em edições de capa dura e brochura, O Cara da Plebe é uma leitura excelente para quem quer entender melhor a cena do rock brasileiro e sua evolução ao longo das décadas. Indo além de um relato sobre os bastidores da Plebe Rude, é uma reflexão sobre resistência, autenticidade e o impacto da música na sociedade. Philippe Seabra oferece ao leitor uma visão honesta e envolvente de sua trajetória, deixando claro que, apesar dos desafios, sua paixão pela música e pela arte de contestar nunca se apagou.


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