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Restless and Wild (1982): a obra-prima do Accept que moldou o metal germânico

Em 1982 o Accept já tinha três discos no currículo – Accept (1979), I’m a Rebel (1980) e Breaker (1981) -, mas ainda não havia encontrado a fórmula que o levaria a ser uma das bandas mais importantes da história do heavy metal. Restless and Wild , lançado em outubro daquele ano, é o ponto de virada. Aqui o grupo alemão finalmente cristalizou sua identidade: riffs afiados, vocais rasgados de Udo Dirkschneider e uma sonoridade agressiva que apontava para o futuro. O contexto da época ajuda a entender o impacto. O heavy metal britânico vivia a era de ouro da NWOBHM, com Iron Maiden, Judas Priest e Saxon puxando a cena. A Alemanha tinha uma cena incipiente, ainda tentando se firmar com nomes como Scorpions e Grave Digger. O Accept chegou para preencher essa lacuna, entregando um som que misturava o peso inglês com uma urgência quase punk. A abertura com “Fast as a Shark” é considerada por muitos o primeiro registro do speed metal – aquele ataque inicial, após a introdução com um vinil to...
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Thorgal: o clássico que definiu o quadrinho europeu finalmente chega em edição definitiva no Brasil (2025, Pipoca & Nanquim)

Jean Van Hamme e Grzegorz Rosiński são dois nomes que mudaram para sempre o quadrinho europeu. E Thorgal é a prova mais concreta disso. Nascida no final dos anos 1970 nas páginas da revista Tintin , a série sempre chamou atenção por sua mistura única: vikings, mitologia nórdica, fantasia épica e uma boa dose de ficção científica. Um caldeirão ousado que poderia soar estranho no papel, mas que, nas mãos da dupla belga-polonesa virou um clássico incontornável do quadrinho franco-belga. A Pipoca & Nanquim acaba de lançar o primeiro volume da série clássica , reunindo os oito primeiros álbuns: A Feiticeira Traída , A Ilha dos Mares Gelados , Os Três Anciões do Reino de Aran , A Galé Negra , Além das Sombras , A Queda de Brek Zarith , O Filho das Estrelas e Alinoë, publicados originalmente entre 1977 e 1984.  É uma edição de 420 páginas em formato 20,5 x 27,2 cm, capa dura, papel couché colorido e recheado de extras que contextualizam a obra e sua importância. E o que temos aq...

Entre o apocalipse e a filosofia: Finita entrega sua obra mais ousada em Children of the Abyss (2025)

A Finita chega ao segundo álbum dez anos após a estreia, Voices From Sanatorium (2015), com a convicção de quem sabe o que quer. Children of the Abyss é o trabalho mais ambicioso da banda gaúcha até aqui, e coloca de vez seu nome entre os projetos mais interessantes do metal brasileiro contemporâneo. Vale mencionar que, neste intervalo de uma década, a banda soltou também os EPs Lie (2018) e Above Chaos (2022), além do ao vivo Live at Metal Sul Festival (2020). Com quinze anos de estrada, a Finita vem de Santa Maria e construiu sua identidade explorando o lado mais sombrio do metal, mas sem se limitar a um único rótulo. Em Children of the Abyss , essa característica se amplia: o disco é um mergulho conceitual que mistura filosofia, religião e literatura em uma narrativa sobre escuridão, apocalipse e o distanciamento dos deuses. O resultado é um álbum que não se contenta em ser apenas música pesada — é uma obra pensada para funcionar como uma experiência completa. A sonoridade ...

No Prayer for the Dying (1990): a ruptura que dividiu os fãs e marcou o fim da fase clássica do Iron Maiden

Quando No Prayer for the Dying chegou às lojas em 1990, o Iron Maiden já havia consolidado seu status de lenda do heavy metal, com clássicos como The Number of the Beast (1982), Powerslave (1984) e Seventh Son of a Seventh Son (1988). No entanto, este álbum marcou um ponto de inflexão na carreira da banda: era hora de simplificar. Depois das elaboradas produções e do metal gradativamente mais progressivo dos anos 1980, Bruce Dickinson e companhia decidiram voltar a um som mais cru, direto e enérgico. O contexto da época não era simples. O heavy metal tradicional começava a sentir a pressão do hard rock mais comercial e do emergente grunge. No Prayer for the Dying surge como uma tentativa de reafirmar a identidade da banda, resgatando riffs mais secos, solos contidos e estruturas mais concisas, em contraste com os épicos trabalhos anteriores. Um dos fatores que mais influenciou a sonoridade do disco foi a saída de Adrian Smith, guitarrista que ajudou a definir a era mais clássica...

Helloween e o nascimento do power metal: a fúria de Walls of Jericho (1985)

No cenário do metal europeu dos anos 1980, a Alemanha começava a ganhar destaque com bandas que iriam definir o power metal como conhecemos hoje. Nesse contexto, o Helloween surgiu como uma força inovadora, e Walls of Jericho (1985), seu álbum de estreia, é um marco que captura a energia bruta e a ousadia da banda em seus primeiros passos. O disco é fortemente influenciado pelo heavy metal britânico — Iron Maiden e Judas Priest são referências claras —, mas o Helloween acrescenta uma velocidade e agressividade que se aproximam do thrash emergente, criando uma fusão única. A técnica de Kai Hansen e Michael Weikath nas guitarras, combinada com a precisão da dupla Markus Grosskopf e Ingo Schwichtenberg  no baixo e na bateria, estabelece um som ao mesmo tempo melódico e caótico, prenunciando o que seria o power metal alemão clássico. Entre os destaques do álbum, “Ride the Sky” acelera com riffs cortantes e vocais que mesclam potência e raiva controlada. “Walls of Jericho”, a faixa-...

Voivod em Killing Technology (1987): quando o thrash metal encontrou o futuro

A cena thrash metal de meados dos anos 1980 estava em plena ebulição. Enquanto Metallica, Slayer, Megadeth e Anthrax consolidavam a fama do estilo nos Estados Unidos, e nomes como Kreator, Destruction e Sodom faziam o mesmo na Alemanha, um quarteto canadense surgia com uma abordagem bem distinta: o Voivod. Vindo de Jonquière, no Quebec, a banda já havia mostrado personalidade nos dois primeiros discos, War and Pain (1984) e Rrröööaaarrr (1986), mas foi em Killing Technology que alcançou um novo patamar criativo. Lançado em 1987, o terceiro álbum do Voivod marca uma virada na sonoridade do grupo. Se antes predominava um thrash sujo e barulhento, aqui aparecem arranjos mais complexos, dissonâncias e uma atmosfera futurista que logo se tornaria a marca registrada da banda. O som ganhou contornos progressivos e experimentais, revelando a influência de nomes como Pink Floyd, King Crimson e Rush, filtrados pelo peso do Motörhead e pela urgência do punk. O resultado é um disco que soa ...

Entre balas perdidas e guitarras cortantes: Vida Amarga (2024), o álbum de estreia do Trágico

O punk brasileiro sempre teve como uma de suas marcas mais fortes a visceralidade. Da fúria do Cólera e Ratos de Porão nos anos 1980 até os muitos coletivos que resistem hoje em selos independentes, a regra é simples: atitude em primeiro lugar. O Trágico, banda formada em São Paulo em 2023 e que conta com Fernando (vocal), Fejones (guitarra), Amanda (baixo) e Déda (bateria), chega com o mesmo espírito combativo e entrega em seu primeiro registro, Vida Amarga (2024), uma declaração de princípios que não faz concessões. Gravado e masterizado em junho de 2024 por Fábio Godoy no 147 Studio Bar e lançado em novembro via Bandcamp e também em CD independente com tiragem limitadíssima de apenas 150 unidades, Vida Amarga é direto como um soco no estômago. São faixas rápidas, ruidosas, com vocais que beiram o grito e guitarras que se apoiam em riffs cortantes. O hardcore punk do grupo é bruto, cru e absolutamente fiel às origens do estilo. Não há polimento: o que se ouve é exatamente a inten...

Opeth e a magia de Sorceress (2016): a virada psicodélica do prog metal

O Opeth chegou ao álbum Sorceress (2016) em um momento de virada consolidada. Depois de quase duas décadas se firmando como uma das maiores bandas do metal progressivo moderno, os suecos liderados por Mikael Åkerfeldt haviam deixado para trás os vocais guturais e o death metal sombrio que marcaram discos como Blackwater Park (2001) e Ghost Reveries (2005). A mudança veio em Heritage (2011), aprofundou-se em Pale Communion (2014) e ganhou contornos mais ousados e psicodélicos aqui. O disco mostra uma banda apaixonada pelos anos 1970, mergulhando sem medo em influências de King Crimson, Camel, Jethro Tull, Gentle Giant e até mesmo Led Zeppelin. O peso ainda aparece, mas em outro formato: riffs setentistas, graves encorpados e uma produção quente, analógica, que privilegia texturas. Mikael sempre deixou claro que cresceu ouvindo muito mais rock progressivo e folk do que metal extremo, e Sorceress é a expressão mais livre dessa herança. Após a introdução “Persephone”, a faixa-tít...

The Black Keys florescem após a tempestade em No Rain No Flowers (2025)

O The Black Keys sempre foi um caso curioso no rock contemporâneo. A dupla formada por Dan Auerbach e Patrick Carney surgiu no início dos anos 2000 mergulhando fundo no blues cru, garageiro e sem firulas, conquistando espaço pela energia direta e pelo senso de autenticidade. Com o tempo, a sonoridade foi se abrindo: chegaram os arranjos mais ricos de Brothers (2010), a explosão comercial de El Camino (2011) e experimentações que flertaram com o pop e a psicodelia em Turn Blue (2014). O caminho da banda, desde então, oscilou entre revisitar suas raízes e tentar algo novo, quase sempre com resultados interessantes. No Rain No Flowers , lançado em 2025, dá sequência a esse movimento de olhar para frente sem esquecer de onde vieram. O título já sugere uma reflexão: sem a dor e a luta, não há beleza. E é exatamente essa dualidade que permeia o álbum. Depois de um 2024 conturbado — cancelamento de turnê nos EUA, problemas de gestão e o desempenho abaixo do esperado de Ohio Players (202...

Iron Maiden e a ousadia futurista de Somewhere in Time (1986)

O Iron Maiden chegou à metade da década de 1980 em um ponto decisivo. Após o sucesso estrondoso de The Number of the Beast (1982), Piece of Mind (1983) e Powerslave (1984), além da gigantesca World Slavery Tour eternizada no ao vivo Live After Death (1985), a banda estava no auge comercial e criativo. Mas também esgotada. Bruce Dickinson, por exemplo, queria levar o grupo para caminhos mais acústicos e intimistas, mas Steve Harris tinha outra visão: era hora de expandir o som, sem perder a grandiosidade conquistada. O resultado dessa tensão foi Somewhere in Time ( 1986). O disco marcou a estreia dos sintetizadores de guitarra no som do Iron Maiden. Não se tratava de teclados convencionais, mas de efeitos aplicados às guitarras de Adrian Smith e Dave Murray, criando uma ambientação futurista que se encaixava com perfeição no conceito visual de ficção científica e distopia. A capa de Derek Riggs é até hoje uma das mais detalhadas e icônicas do metal, com dezenas de referências esc...