Discoteca Básica Bizz #089: Gene Vincent - Gene Vincent and The Blue Caps (1957)


Os fãs de rock and roll de todas as idades costumam se referir a Gene Vincent com hiperbólica admiração. Gene é apaixonante e sua identificação com o rock é tão forte que parece que se o rock não existisse ele o teria inventado. Isso não impediu que sua carreira fosse traumática, trágica e errática, nem que virasse um farrapo, morrendo aos 36 anos de idade em 1971, alcoólatra, desesperado e quase esquecido.

Sua boa fase foi entre 1956 e 1960, quando lançou nesse curto período dezesseis singles e seis LPs de pura dinamite, todos pelo selo Capitol. Seu melhor álbum - onde Gene atingiu seu pico - foi o segundo, chamado simplesmente Gene Vincent and The Blue Caps, editado no primeiro semestre de 1957. Na época, o rock and roll começava a ser assimilado pelas grandes companhias de discos, instigadas pelo enorme sucesso de Elvis na RCA, mas ainda não sabiam lidar com o produto. Ken Nelson, produtor de Vincent e grande profissional, acreditava poder dirigi-lo como a um Sinatra ou a um Nat King Cole. Mas no segundo álbum, Gene e os Blue Caps pareciam desgarrados do controle do produtor e cometeram um disco com fogo e energia bruta.


Gene, com sua gangue, gravou o álbum inteiro ao vivo - direto e sem playbacks - num estúdio em Nashville, no espaço de três dias, em outubro de 1956. Foi a última sessão com os Blue Caps originais: Cliff Gallup, Willie Williams (guitarras), Dick Harrell (bateria) e Jack Neal (baixo). Os técnicos de som enlouqueceram com as dificuldades para gravar aquela música selvagem ao vivo. Foi o primeiro álbum de rock tocado inteiramente com instrumentos eletrificados no formato baixo, guitarra-base, guitarra-solo, mais a bateria convencional tocada aos berros por Dick Harrell. E nenhum sax, piano ou coro de vozes para atrapalhar. Aparentemente, a banda teve liberdade também na escolha do repertório, fugindo da síndrome "two hits, ten fillers" (dois sucessos e outras dez faixas para encher linguiça) que assolou o mercado de LPs até meados dos anos 1960.

As canções "lentas" como "Unchained Melody", "Blues Stay Way From Me" e "I Sure Miss You" estavam perfeitamente adequadas à voz calorosa de Vincent, que também era um excelente cantor de baladas. As outras faixas, rocks como "Red Blue Jeans and a Pony Tail", "Cat Man", "You Better Believe" e "Pink Thunderbird”, tem na maioria a autoria de Gene ou dos Blue Caps. 

Mais um ano e os pesadelos começariam a assombrar a vida de Vincent. A mídia, voltada para os anseios da classe média próspera, achou que não existia lugar para um rocker lascivo, classe operária, com uma perna aleijada e cabelos ensebados. Gene ficaria sozinho com seu orgulho e arrogância, brigando contra o sistema. E perdeu.

Texto escrito por René Ferri e publicado na Bizz #089, de dezembro de 1992

Comentários