Discoteca Básica Bizz #123: The Beach Boys - Pet Sounds (1966)


Era o começo dos anos 1960 e os Estados Unidos viviam o seu apogeu. A Califórnia era o estado mais rico da nação, um dos melhores lugares do mundo para se viver, e os Beach Boys eram os reis da surf music.

Apesar de mal saberem nadar - só o baterista Dennis Wilson era surfista -, nunca uma banda foi tão associada a um estilo musical como os Beach Boys. A despeito de nunca ter pisado numa prancha de surf, ninguém escrevia temas ensolarados sobre o mar da costa oeste, garotas e dragsters velozes melhor do que Brian Wilson. Além dele e Dennis, compunham a formação original o irmão caçula dos Wilson, Carl (guitarra), o primo Mike Love (vocais) e o amigo Al Jardine (guitarra). Vendendo milhares de cópias e combatendo a invasão britânica nas paradas americanas, eles viraram até orgulho nacional.

Mas isso durou até 1965. No ano seguinte a ingenuidade da era dourada do rock and roll havia acabado. A Guerra do Vietnã era iminente, a liberação sexual tornava-se realidade e o psicodelismo despertava. Quando Brian Wilson resolveu parar de falar do sol da Califórnia e começou a dissertar sobre angústias existenciais, os fãs e a crítica estranharam, mas a história do rock mudou para sempre. Rompendo com o rock fácil dos primórdios e fortemente influenciado pelo álbum Rubber Soul (1965), dos Beatles, o multi-instrumentista Brian criou um dos mais importantes discos de todos os tempos, Pet Sounds. O trabalho influenciou diretamente outra obra-prima: Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967).


Ambicioso e perfeccionista, o mentor dos Beach Boys queria fazer arte e não apenas pop songs, almejando produzir o melhor álbum já feito, buscando inspiração no coração, na alma e até em Deus - já que, para ele, a música era a voz divina. Mesmo com os parcos recursos da época, o resultado foi uma obra requintada e barroca, com intrincadas harmonias vocais, arranjos complexos e sutis e escalas inusitadas. As gravações do disco incluíram efeitos inventivos com vozes, sons de animais, buzinas, trens e também percussão exótica - no caso, garrafas vazias de Coca-Cola e latas de sorvete.

Além disso, Pet Sounds marcou pelo uso pioneiro do sintetizador em "I Just Wasn't Made For These Times". As transformações prosseguiam: as letras - com a colaboração do compositor Tony Asher - falavam sobre amor e esperança (em "Wouldn't It Be Nice"), misticismo ("God Only Knows", canção preferida de Paul McCartney) e a perda da inocência ("Caroline No"). Pet Sounds é um trabalho precursor e conceitual, mas acessível. Alternando dor e alegria, mescla melodias pop e emocionais com faixas orquestrais e - por que não dizer? - progressivas.

Atingido a ápice criativo, os Beach Boys ainda ameaçaram fazer mais um álbum capital - o abortado Smile, que nunca foi terminado devido a problemas pessoais de Wilson (Smile acabou sendo lançado em 2011). Daí para frente, o envolvimento com drogas ocasionou a decadência do grupo, mas a lenda dos garotos da praia já estava firmada, que o digam Ramones, Jesus and Mary Chain, Pixies, etc.

Texto escrito por Sérgio Barbo e publicado na Bizz #123, de outubro de 1995

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