Discoteca Básica Bizz #159: The Cramps - Songs the Lord Taught Us (1980)


Rockabilly, psicodelia dos grupos de garagem dos anos 1960 e microfonia, temperado pelo que a cultura pop já produziu de mais podre: este é o universo de Lux Interior e Poison Ivy, do Cramps.

Os dois se conheceram na Califórnia em 1972, adoravam rock primitivo, pessoas estranhas e alucinógenos. Casaram-se e se mudaram para Nova York, dispostos a montar uma banda. Ali conheceram Bryan Gregory, louco de pedra, fanático por misticismo e vodu - e que mal sabia tocar guitarra. Depois, recrutaram o baterista Nick Knox. Estava formada a gangue.

Os Cramps batizaram seu som de psychobilly - rockabilly psicodélico - e fizeram fama. Na Inglaterra, Stephen Morrissey (mais tarde, vocalista dos Smiths) fundou o primeiro fã-clube do grupo. Nos EUA, atraíram a atenção de Alex Chilton, líder do lendário combo pop Big Star, que produziu Songs the Lord Taught Us por um cachê de fome. Chilton exigiu que a maioria das faixas fossem gravadas ao vivo no estúdio. Lux tratou as gravações como show: se jogava no chão, destruía cadeiras e pulava sobre os amplificadores.


Songs the Lord Taught Us abre com a clássica "TV Set", com sua batida marcial de bateria e um riff maravilhosamente imundo. "Sunglasses After Dark" tem aquela microfonia linda e um solinho new wave que só os Cramps teriam a cara-de-pau de fazer. "What's Behind the Mask" tem uma letra hilariante ("Por que você não tira essa máscara? / É problema de pele / Ou um olho a mais?"). 

"Garbageman" é obra-prima. "Zombie Dance" goza da plateia modernosa de Nova York, que ficava parada vendo a banda se matar no palco. "The Mad Daddy" é uma homenagem a Pete "Mad Daddy" Myers, um DJ de Ohio que Lux idolatrava. E "Mystery Plane" resumia a filosofia da banda na frase "eu não consigo me identificar com este mundo, então nem tento."

Incluindo covers dos Sonics - grupo de garagem dos anos 1960 ("Strychnine") -, do pioneiro do rockabilly Johnny Burnette ("Tear It Up") e "Fever" (a mesma gravada por Madonna) de Little Willie John, o disco não envelhece.

Os Cramps não abraçaram o passado do rock and roll por oportunismo, eles vivem no passado. Para Lux e Ivy, o mundo acabou em 1965. Sua missão é mostrar como ele era mais divertido e irresponsável.

Texto escrito por André Barcinski e publicado na Bizz #159, de outubro de 1998

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