Em 1986, o Queen era uma banda consagrada, mas que vivia momentos contraditórios. Após o sucesso arrebatador do Live Aid (1985), onde roubaram a cena com uma performance histórica, o grupo se viu revigorado. A crítica, que por vezes os via como exagerados e excessivos, passou a enxergá-los com mais respeito.
A banda vinha de álbuns mais experimentais e irregulares (Hot Space, de 1982, e The Works, de 1984), tentando se equilibrar entre a grandiosidade do rock de estádio e a busca por sons mais modernos. Além disso, Freddie Mercury já havia iniciado sua carreira solo com Mr. Bad Guy (1985), e havia boatos sobre a possível separação do grupo.
É nesse contexto que nasce A Kind of Magic, muito influenciado pelo filme Highlander: O Guerreiro Imortal, de Russell Mulcahy. O álbum não é oficialmente uma trilha sonora, mas boa parte das faixas foi composta para o longa. O disco combina canções feitas para funcionar como uma trilha épica com baladas, momentos pop e experimentações eletrônicas.
"One Vision" é uma explosão de energia para abrir o álbum. Com guitarras poderosas de Brian May e vocais marcantes de Mercury, foi inspirada no discurso de Martin Luther King e exalta união e liberdade. O clipe, com cenas de estúdio, mostra a química da banda naquele momento. "A Kind of Magic", a faixa-título, é um dos maiores hits da banda nos anos 1980. Com uma pegada pop irresistível, foi escrita por Roger Taylor e lapidada por Freddie Mercury. Já "Friends Will Be Friends" é uma balada com cara de hino de estádio, feita para os fãs cantarem juntos. É sentimental sem ser piegas, e mostra o lado mais afetivo do Queen.
Um dos pontos altos do disco, "Who Wants to Live Forever" foi escrita por Brian May e é melancólica e grandiosa, com orquestrações de Michael Kamen. Serve como pano de fundo emocional para cenas cruciais de Highlander e, com o tempo, se tornou uma espécie de epitáfio precoce para Mercury, que viria a falecer cinco anos depois, vítima da AIDS. A faixa mais pesada do álbum, "Gimme the Prize (Kurgan's Theme)" é quase heavy metal, com riffs agressivos e trechos de diálogos do filme. Uma das músicas mais subestimadas do Queen nos anos 1980. Encerrando o álbum, "Princes of the Universe" é puro Queen: teatral, pesada e cinematográfica. É o tema principal de Highlander e destaca Freddie Mercury no auge de sua persona dramática.
A Kind of Magic foi um sucesso comercial, especialmente no Reino Unido, onde ficou entre os álbuns mais vendidos de 1986. Ele serviu como base para a última grande turnê do Queen com Freddie Mercury, a Magic Tour, que culminou no lendário show no estádio de Wembley e gerou os excelentes álbuns ao vivo Live Magic, lançado em dezembro de 1986, e Live at Wembley ’86, que chegou às lojas em maio de 1992.
Para muitos fãs, este é o último álbum do Queen com a energia de uma banda ainda ativa ao vivo, antes do impacto da doença de Freddie mudar a dinâmica do grupo. Embora não tenha sido unanimidade entre os críticos na época, hoje é reconhecido como um trabalho importante na discografia da banda. Em termos de som, o álbum capta bem o espírito da segunda metade dos anos 1980: sintetizadores, batidas eletrônicas, misturas de gêneros e uma forte ligação com o cinema. Ele mostra uma banda madura, ainda explorando novos caminhos, mesmo sob pressão e desafios pessoais.
A Kind of Magic não é o álbum mais aclamado do Queen, mas é um dos mais representativos do seu momento histórico. Ele celebra a diversidade sonora da banda, o poder de Freddie Mercury como intérprete, e antecipa a carga emocional que marcaria os últimos anos do grupo.
Com ele, o Queen mostrou que ainda era capaz de criar hinos e emocionar multidões — com um pouco de rock, pop, drama e, claro, magia.
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