O mercado fonográfico mudou — e mudou muito. Se nos anos 1990 e 2000 o CD reinava absoluto, hoje ele é uma mídia de nicho, sustentada quase exclusivamente por colecionadores. Com o streaming dominando a forma como a maior parte da população ouve música, o consumo físico tornou-se residual. No Brasil, plataformas como Spotify, Deezer, YouTube Music e Apple Music concentram mais de 90% do acesso musical diário, o que mudou drasticamente as bases econômicas da indústria.
Nesse novo cenário, os CDs de rock e metal — gêneros tradicionalmente ligados ao colecionismo — sobreviveram com ajuda de um público fiel, mas pequeno. O termo "público de nicho" talvez nem seja mais suficiente: trata-se de um público ainda mais restrito que continua comprando, apoiando gravadoras (sejam independentes ou grandes selos) e buscando a experiência tátil e ritualística do disco físico.
Esse encolhimento do mercado impacta diretamente as tiragens dos lançamentos. Atualmente, a média de prensagem de um CD nacional de rock ou metal gira entre 500 e 1.000 cópias por título. Considerando que o Brasil tem aproximadamente 203 milhões de habitantes (dados de 2025), isso representa apenas entre 0,00049% e 0,00098% da população comprando uma cópia física de um CD. Ou seja, estamos falando de uma fração minúscula — quase simbólica — da sociedade brasileira.
E quando se produz tão pouco, o custo unitário sobe. Produzir um CD envolve gráfica, prensagem, encarte, direitos autorais, tributos, embalagem, logística, marketplaces — e tudo isso sem a escala que barateava a produção no passado. As gravadoras não operam com grandes margens, e muitas vezes mal conseguem cobrir os custos de produção. A alternativa seria parar de lançar CDs — e muitos selos já fizeram isso.
Além do fator industrial, há a economia do país. A inflação, o enfraquecimento do real frente ao dólar, o aumento do custo de vida e a diminuição do poder de compra afetam diretamente o preço final dos produtos não essenciais, como os CDs. A combinação de custos crescentes e público limitado leva inevitavelmente ao aumento de preços — algo que muitos consumidores sentem, mas poucos compreendem em profundidade.
E aqui está o ponto central: colecionar é um hábito de luxo. Ter uma estante cheia de CDs, LPs ou edições especiais demanda investimento. Assim como relógios, miniaturas ou livros raros, discos físicos hoje ocupam um espaço entre a paixão e o privilégio. É um hobby que envolve tempo, dinheiro e escolhas. E, como qualquer produto de luxo, não será acessível a todos — nem precisa ser.
Quem ainda consome mídia física faz parte de uma minoria apaixonada, mas muitas vezes economicamente limitada. O colecionismo, nesse contexto, deve ser encarado com responsabilidade e consciência: apoiar selos e artistas que ainda se arriscam no físico é um ato de preservação da memória musical, mas que exige entendimento da realidade atual e respeito pela lógica do mercado.
É importante dizer: reconhecer que os preços dos CDs estão altos é legítimo. Reclamar também é um direito do consumidor. A frustração existe, é compreensível e precisa ser ouvida. Mas, como mostrado ao longo desta análise, os valores praticados hoje são fruto de um contexto complexo: tiragens mínimas, público restrito, alta nos custos de produção e um país com desafios econômicos graves.
A pergunta que fica, então, é: existe uma saída? Parar de colecionar? Talvez para alguns, sim. Mas para quem ama a mídia física e deseja continuar consumindo CDs, a alternativa é o entendimento — e, dentro do possível, o apoio consciente. O mesmo já aconteceu com os discos de vinil, que passaram por um caminho muito parecido: viraram nicho, sumiram, depois retornaram como item de luxo. Hoje, os LPs custam até três ou quatro vezes mais que um CD e, mesmo assim, consolidaram uma base fiel de consumidores. É possível que o CD esteja seguindo esse mesmo trajeto. Os valores subiram, e podem subir ainda mais. Mas o disco físico, seja em vinil ou em CD, continuará existindo enquanto houver quem compre — e entenda que colecionismo é escolha, e escolha com custo.
No fim das contas, essa é a realidade. E por mais que ela possa não agradar, é nela que vivemos. O amor pela música segue, mas a forma de demonstrá-lo mudou. E talvez colecionar, hoje, seja menos sobre quantidade e mais sobre consciência, curadoria e compromisso com a cultura que escolhemos valorizar.
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