A megalomania do Guns N’ Roses em Use Your Illusion (1991): quando a banda quis ser maior que o próprio rock
Poucas bandas viveram um auge tão grandioso — e ao mesmo tempo tão autodestrutivo — quanto o Guns N’ Roses no início dos anos 1990. Após a explosão de Appetite for Destruction (1987), que se tornou um dos discos de estreia mais vendidos da história, o grupo se viu diante do desafio de superar ou ao menos sustentar o impacto daquele hard rock cru, sujo e irresistível. A resposta veio em setembro de 1991, quando Axl Rose, Slash, Duff McKagan, Izzy Stradlin e Matt Sorum lançaram não apenas um novo álbum, mas dois ao mesmo tempo: Use Your Illusion I e Use Your Illusion II.
O projeto era, ao mesmo tempo, ambicioso e megalomaníaco. Em vez de repetir a fórmula de Appetite, o Guns expandiu suas fronteiras musicais, abraçando arranjos grandiosos, letras mais densas e uma diversidade de estilos que passavam pelo hard rock clássico, pelo blues, pelo punk, pelo country, pelo folk e até pela música erudita. O resultado foi uma obra que refletia a personalidade de Axl Rose: genial, intensa e, muitas vezes, excessiva.
A influência dos anos 1970 está em cada detalhe. Há ecos de Elton John no piano dramático de Axl, de Queen nas camadas vocais e arranjos expansivos, de Aerosmith no groove sujo e de Rolling Stones no balanço mais despojado. Também se percebem pitadas de Led Zeppelin e até de música clássica, especialmente em faixas como “November Rain”, com sua orquestração cinematográfica. O Guns buscava não apenas ser a maior banda do mundo — queria soar como uma banda maior que o próprio rock.
Entre os destaques, Use Your Illusion I traz a energia visceral de “Right Next Door to Hell”, o peso grooveado de “Back Off Bitch”, a pegada blueseira de “Bad Obsession” e, claro, as épicas “Don’t Cry” e “November Rain” — talvez o momento mais icônico da discografia da banda. Já Use Your Illusion II é mais sombrio e político, com letras carregadas de crítica social. “Civil War” abre o álbum com força e relevância, enquanto “14 Years” traz Izzy Stradlin dividindo os vocais com Axl em um clima de Stones decadentes. “You Could Be Mine” ficou eternizada na trilha de Exterminador do Futuro 2, unindo o poder do cinema e da música de forma explosiva. A versão para “Knockin’ on Heaven’s Door”, de Bob Dylan, se tornou definitiva para uma geração, e “Estranged” mostrou a veia progressiva e emocional do Guns em mais uma balada grandiosa.
Os dois volumes de Use Your Illusion venderam milhões, dominaram as paradas e confirmaram o Guns N’ Roses como a maior banda de rock do planeta no início da década de 1990. Ao mesmo tempo, os excessos e o gigantismo do projeto prenunciavam a implosão que viria em seguida. O afastamento de Izzy, a crescente instabilidade de Axl e a dificuldade de manter uma formação coesa fizeram com que, poucos anos depois, o Guns deixasse de ser uma banda para virar praticamente um projeto solo de seu vocalista.
Ainda assim, Use Your Illusion I & II representam o último grande momento do hard rock antes da ascensão do grunge e da mudança de rumos na música pesada. São discos que capturam uma época em que o rock ainda podia ser exagerado, teatral e gigantesco sem pedir desculpas por isso.
O Guns N’ Roses talvez nunca tenha sido tão criativo e ousado quanto nesse projeto. Exagerados? Sem dúvida. Mas também inesquecíveis.
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