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Christ Illusion (2006): o retorno brutal de Dave Lombardo ao Slayer


Lançado em 8 agosto de 2006, Christ Illusion marcou um momento histórico: após 16 anos, Dave Lombardo voltou a empunhar as baquetas em um álbum do Slayer. O baterista havia saído em 1992, após o Seasons in the Abyss (1990), e, desde então, Paul Bostaph assumiu a bateria com competência e técnica impecável, gravando álbuns como Divine Intervention (1994), Diabolus in Musica (1998) e God Hates Us All (2001). Mas havia algo na sonoridade da banda que, por mais afiada e pesada que fosse, parecia diferente — e Christ Illusion deixou claro o que era: o pulso inconfundível de Lombardo.

Paul Bostaph é um baterista técnico, preciso como um metrônomo e com um ataque seco, quase cirúrgico. Seus grooves e viradas são pensados para maximizar a velocidade e a clareza — basta ouvir “Disciple” ou “Killing Fields” para sentir sua abordagem metódica. Já Dave Lombardo é pura intensidade orgânica. Seu toque é mais solto, visceral, quase jazzístico em algumas passagens, com um swing natural mesmo em alta velocidade. Ele não apenas acompanha as guitarras: ele empurra a música para frente, criando tensão e liberação de forma instintiva. O Slayer com Bostaph soa mais técnico, e com Lombardo, soa mais perigoso. Em Christ Illusion, essa diferença é gritante. A bateria não é apenas um elemento rítmico, mas um narrador paralelo da violência sonora. Lombardo varia acentos, joga com as viradas e cria microclimas dentro das músicas, algo que poucos bateristas de thrash conseguem fazer sem perder o peso.

O início dos anos 2000 foi turbulento para o Slayer. A cena do metal passava por mudanças, o nu metal dominava as paradas e até bandas veteranas experimentavam sonoridades mais modernas. God Hates Us All já havia mostrado um Slayer agressivo e renovado, mas com Lombardo de volta, a expectativa era de um retorno às raízes, e foi exatamente isso que aconteceu. Produzido por Josh Abraham e Rick Rubin, Christ Illusion combinou o peso moderno com a ferocidade crua da fase clássica, criando um disco que soava atual, mas que também poderia estar lado a lado com os trabalhos da década de 1980.


Logo na abertura com “Flesh Storm”, Lombardo mostra que voltou para deixar sua marca: a música é uma rajada de thrash cortante, com mudanças de dinâmica que só funcionam porque ele sabe exatamente onde acelerar e onde segurar. “Catalyst” e “Consfearacy” são tiros diretos, pura fúria acelerada. Mas talvez o maior momento esteja em “Jihad”, uma das faixas mais controversas da carreira do Slayer, narrando os ataques de 11 de setembro sob a ótica de um extremista. A tensão da música é construída também pelo trabalho de bateria, alternando agressão e suspense. Outro ponto alto é “Eyes of the Insane”, vencedora do Grammy de Melhor Performance de Metal em 2007. Aqui, Lombardo conduz a faixa com um groove lento e sufocante, que amplia o peso da letra e das guitarras de Kerry King e Jeff Hanneman.

Christ Illusion provou que a química entre Lombardo, King, Hanneman e Tom Araya era única. A banda repetiria a formação no disco seguinte, World Painted Blood (2009), e Lombardo sairia definitivamente em 2013, mesmo ano do falecimento de Jeff Hanneman, encerrando de vez uma das formações mais influências da história do metal. Apesar de algumas críticas à produção, o disco permanece como um dos trabalhos mais relevantes da fase final da banda e um lembrete do quanto a identidade do Slayer estava ligada ao estilo explosivo de seu baterista original.

Se Paul Bostaph foi o arquiteto disciplinado que manteve o Slayer afiado durante os anos 1990, Dave Lombardo sempre será o coração selvagem que deu vida a cada batida. E Christ Illusion é a prova viva — e brutal — disso.

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