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Mudanças de voz, mudanças de rumo: o Angra em Secret Garden (2014)


Secret Garden
(2014) ocupa um lugar peculiar na discografia do Angra. Lançado no fim de 2014 no Japão e no início de 2015 no restante do mundo, o álbum representa, ao mesmo tempo, um encerramento e um recomeço. É o último registro de estúdio com Kiko Loureiro antes de sua saída para o Megadeth, e o primeiro com Fabio Lione nos vocais e Bruno Valverde na bateria. Esse caráter de transição ajuda a explicar tanto os acertos quanto as irregularidades do disco.

Produzido por Jens Bogren, com pré-produção de Roy Z, Secret Garden aposta em um som moderno, limpo e poderoso, alinhado ao que havia de mais sofisticado no metal melódico da época. As guitarras de Kiko Loureiro e Rafael Bittencourt seguem técnicas e cheias de detalhes, com solos precisos e riffs que equilibram peso e melodia. A cozinha formada por Felipe Andreoli e Bruno Valverde garante solidez, ainda que o álbum não busque, em momento algum, a agressividade extrema.

A estreia de Fabio Lione é um dos pontos mais debatidos. Seu timbre, mais encorpado e dramático, afasta o Angra do registro mais agudo associado à era Andre Matos, aproximando a banda de uma abordagem mais épica e emocional. Em faixas como “Newborn Me” e “Black Hearted Soul”, essa mudança funciona bem, trazendo energia e impacto logo de início. Já em momentos mais introspectivos, Lione mostra controle e sensibilidade, ainda que algumas passagens soem mais contidas do que o esperado por parte dos fãs antigos.


O álbum alterna canções diretas e acessíveis com composições mais longas e progressivas. “Upper Levels” é o melhor exemplo da segunda vertente, explorando mudanças de andamento e arranjos mais elaborados. A faixa-título, Simone Simons (Epica) na voz, é um dos pontos altos do disco, apostando em clima atmosférico e melancólico, enquanto “Crushing Room”, com Doro Pesch, traz um contraste mais pesado e tradicional.

Por outro lado, essa alternância também é a principal fragilidade do álbum. A segunda metade desacelera consideravelmente, com baladas e mid-tempos que, embora bem executados, quebram o ritmo e dão ao disco uma sensação de irregularidade. Canções como “Perfect Symmetry” e “Silent Call” encerram o trabalho de forma emotiva, mas reforçam a impressão de um álbum mais reflexivo do que explosivo.

Secret Garden busca consolidar uma nova fase. É um disco tecnicamente irrepreensível, bem produzido e musicalmente rico, que divide opiniões justamente por não apostar apenas na potência. Para alguns falta a grandiosidade imediata dos clássicos, enquanto para outros sobra maturidade  e refinamento. Seja como for, trata-se de um capítulo importante da história do Angra: um jardim de transição, onde passado e futuro coexistem em equilíbrio instável, mas fascinante.

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