Discoteca Básica Bizz #009: Frank Zappa - We're Only in It for the Money (1968)



Não é exagero considerar indispensáveis a qualquer discoteca bem informada praticamente todos os discos lançados por Frank Zappa. Mas o LP básico para se entrar em contato com o universo de Zappa talvez seja mesmo esta obra-prima de experimentalismo e humor. A começar pelo nome, Nós Só Estamos Nessa Pela Grana, que ironiza a motivação da maior parte das pessoas que já se envolveram de alguma forma com o rock and roll.

O deboche continua na capa, parodiando Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, lançado pouco antes. Conta a lenda que Paul McCartney ficou tão indignado com a brincadeira que acionou seus advogados, processou Zappa e atrasou em alguns meses o lançamento de We're Only in It for the Money

Outra extravagância zappiana foi convidar Eric Clapton, na época o "deus da guitarra", para participar do disco. Ele aceitou e, ao chegar ao estúdio ficou muito surpreso ao ser informado de que não precisaria tocar guitarra. Em vez disso, Clapton aparece simplesmente murmurando algumas frases quase inaudíveis, sepultadas na mixagem final.

Um comentário na contracapa anuncia que "toda esta monstruosidade foi concebida e executada por Frank Zappa, como resultado de algumas desagradáveis premonições sentidas entre agosto e outubro de 1967". Com as antenas ligadíssimas, Zappa sustenta, em plena explosão do movimento hippie, que toda aquela história de flor, paz e amor não passava de papo furado de uma geração anestesiada e inepta. O personagem de uma das canções, "Flower Punk", é um garoto próximo da debilidade mental, que sonha ir a São Francisco para se juntar a uma banda psicodélica. No final da faixa, um toque de sarcasmo: "Neste exato momento/  2.700 microgramas de STP (um alucinógeno) que Flower Punk tomou pouco antes de iniciar a canção / Começam a fazer efeito / Diante de seus ouvidos a cabeça dele explode / Deixando um bizarro resíduo de áudio / Espalhado sobre seu toca-discos adolescente."

Referências "eruditas" não faltam. Além de citações do compositor de vanguarda Edgard Varese, o álbum inclui também um "modo de usar", onde Zappa recomenda expressamente: "Não escute este disco sem antes ter lido A Colônia Penal, de Franz Kafka". 

O clima de contestação política, que atingiria o ponto máximo de efervescência nos meses seguintes, é refletido em "Are You Hang Up?", que descreve os Estados Unidos como um campo de concentração disfarçado, sob controle da polícia e dos nazistas eleitos para o Congresso. 


Mas tudo isso é de menor importância diante da impressionante intensidade sonora de We're Only in It for the Money, o terceiro LP dos Mothers of Invention, editado no início de 1968. O grupo era formado então por Zappa (composições, vocais, guitarra, piano e edição de fitas), mais Billy Mundi (bateria e vocais), Roy Estrada (baixo e vocais), Bunk Gardener (instrumentos de sopro), Jimmy Carl Black (bateria, trompete e vocais) e Motorhead Sherwood (sax soprano e barítono). Uma surpreendente mistura de surf music, rock dos anos 1950, jazz, rhythm and blues e música concreta, além de vinhetas malucas onde mulheres se agridem via telefone e sons de instrumentos acústicos são transformados através de engenhosos truques de estúdio, até ficarem irreconhecíveis. 

We're Only in It For the Money não foi ainda lançado oficialmente no Brasil, embora uma versão nacional pirata tenha circulado alguns anos atrás. Ela é facilmente identificável pelas fotos da capa, muito desbotadas, e pela péssima qualidade de som. Mesmo assim, se por acaso você encontrar este disco por aí, não marque bobeira.

(Texto escrito pot Roberto Navarro, Bizz #009, abril de 1986)

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