A América de Trump não tem lugar para o heavy metal


Uma das respostas mais comuns após a eleição de Donald Trump como novo presidente dos Estados Unidos foi: “Bem, pelo menos haverá muito heavy metal e punk”. A ideia geral é que Trump é um símbolo de ganância, de normalidade forçada, e que irá inspirar raiva e dissidência política na comunidade do metal de maneira semelhante ao que aconteceu na época em que Ronald Reagan estava no poder. E, como resultado disso, centenas de jovens ultrajados pegarão suas guitarras e escreverão seus próprios hinos de rebelião.

Não acreditei totalmente nesse ponto de vista quando o escutei pela primeira vez, como não acredito que existem muito méritos em viver quatro anos em nosso país sendo dirigido por pessoas que vêem a liberdade de um indivíduo em se casar com quem ele quiser ser menos importante do que o direito de cada cidadão possuir um rifle. Mais ainda: nunca vi a raiva política presente em algumas bandas de metal como algo para curtir ou celebrar, mas sim apenas como a expressão de babacas mimados e sem imaginação que querem que merdas aconteçam para que eles tenham inspiração para escrever suas músicas. Mas isso mudou quando Trump foi ao Twitter demonstrar a sua birra com o elenco do musical Hamilton, que expressou educadamente a sua inquietação sobre o futuro vice-presidente Mike Pence. Nessa hora eu percebi que tudo era uma grande mentira.

A verdade é que a América de Donald Trump, o país que ele nos vende, não tem lugar para o heavy metal. É uma nação que, acima de tudo, valoriza a propriedade, as aparências, o decoro e o status quo - todas as coisas contra os quais o metal sempre posicionou contra. Esse cara, na real, odeia todos nós.

Um dos tópicos preferidos abordados pelo novo presidente em seus discursos é o retorno “aos bons e velhos tempos” - uma época que nós sabemos que nunca existiu, de fato. E, vamos ser honestos, ele não está falando sobre os anos 1970 ou 1980. Ele está se referindo sobre a década de 1950, um dos momentos mais sombrios da história norte-americana. “Os bons e velhos tempos” fazem alusão direta à uma época em que todos estampavam um sorriso falso no rosto e ninguém tocava em temas como se sentir sozinho, rejeitado ou morto por dentro. Essas emoções, que são muito naturais, foram encobertas e trancadas no armário, porque expressá-las sugeria que você era o tipo de cabeça de ovo que nos levaria a perder a guerra contra a União Soviética e sua turma.

E, claro, era pior para as mulheres, as minorias étnicas e os homossexuais - muito, muito pior mesmo -, mas mesmo os homens brancos dito “corretos" foram vítimas nos tais bons tempos. Confessar ao seu vizinho que às vezes você sente vontade de chorar ou apenas dar um chute na bunda do cachorro? Prepare-se para um monte de olhos vingativos te julgando no supermercado! Os bons e velhos tempos resistiram às mudanças comportamentais naturais da humanidade, e se transformaram na dinastia de hipocrisia que veio depois da pior guerra da história. Tudo o que importava era ser rico o suficiente para se cercar de um casulo de privacidade, dentro do qual você poderia se comportar como uma pessoa de verdade, que segue o seu coração.

Isso não tem nada a ver com o metal. O metal é solitário, ameaçador, sacana e, sobretudo, honesto. Heavy metal é sobre ser tão autêntico e humano possível quanto a sua raiva e infelicidade possibilitem. Onde o punk diz “Foda-se!”, o metal fala “Foda-se, somos o oposto do que você está fazendo, levado ao extremo mais distante”. É sobre a besta que ronda a humanidade, e esse demônio não é ter vergonha de seus fetiches estranhos, de achar Satanás mais interessante que Jesus ou fumar ervas daninhas todas as horas do dia. É sobre a compreensão do quanto fodido, louco e estranho você pode ser, e que, apesar disso, você não está machucando ninguém. Que você só quer ficar sozinho aterrorizando os demônios de sua mente com solos de guitarra que convocam nuvens de morcegos sombrios.

Você poderia argumentar que, em alguns aspectos, Trump é a própria besta. A coisa horrível que está fora da zona de conforto de várias nações e que quer ser como Satanás e Darth Vader, o que soa bastante metal em sua superfície. Mas a questão aqui é o contexto. Trump gabava-se de agarrar mulheres contra a sua vontade, porque ele era o famoso o bastante para poder fazer isso. E, quando vieram as lógicas reações negativas a esse comportamento, expressou um burro pedido de desculpas público sobre o assunto - aliás, nunca tinha visto alguém tão irritado em dizer que estava arrependido. Mentir para si mesmo e para o público é a postura menos metal que existe.

O pior de tudo, o que a resposta ao elenco de Hamilton nos ensinou, é que o contigente de Trump vê com bons olhos seu ataque maldoso, e se ampara na honestidade brutal dele para justificar o fato de Trump sempre ser um alvo. Alguns fãs de metal podem aprovar algumas atitudes de Donald Trump, mas seu mundo limpo e brilhante é baseado em aparência, onde você é bom apenas na quantia que o seu bolso é capaz de comprar. E, uma vez que você decidir confrontar ou discordar de qualquer opinião de Trump, ele irá considerá-lo automaticamente seu inimigo. Usar uma cruz invertida ou uma camiseta com um logotipo ilegível será considerado um ato pouco americano, e o metal acabará se transformando no fato novo contra o qual essa turma que quer fazer a América grande novamente lutará. É o que pessoal dos bons e velhos tempos pensa.

Naturalmente, a América de Trump está bem servida de astros do rock, caras como Meat Loaf e Gene Simmons, que vão vender a ideia de um período interessante e atraente como recompensa por levar uma boa vida cotidiana - um modo de pensar parecido com o de qualquer religião, diga-se de passagem. Para Trump, esses caras são a prova de que mesmo os rebeldes sabem que uma hora precisam entrar na linha, e que a busca pelo estereotipado sonho americano - uma casa grande, vários carros, um bom chuveiro - é a única razão pela qual se deve lutar. Mas todos sabemos que isso não é metal. Metal é estar com o volume no máximo mesmo quando não há ninguém por perto para ouvi-lo. É sobre lançar o seu melhor disco em anos, mesmo depois de todas as gravadoras fecharam as portas pra você.

É importante frisar que esse editorial não é um endosso a Hillary Clinton. Ela é um monte de coisas, e o metal não é uma delas. A questão com a América de Clinton é que ela veria a inconveniente honestidade do heavy metal como ofensiva e - mergulhada em uma psicologia tendenciosa -, ao analisar ideias e imagens como Baphomet mordendo a garganta de um padre e cercado por dançarinos nus, afirmaria que você está promovendo de maneira ativa e consciente pensamentos ofensivos que perturbam os outros. Não seriam os bons e velhos tempos, mas sim um mundo novo onde o metal continuaria sendo uma afronta, porque o metal sempre será uma ofensa a qualquer sociedade que se julga preciosa e equilibrada.

A diferença, no entanto, é que, enquanto a América de Hillary Clinton pode, de maneira presunçosa e a plenos pulmões, fazer cara torta para o metal, sua resposta provavelmente não iria além disso. A equipe de Donald Trump, entretanto, quer agir. Eles falam sobre forçar as pessoas a protegerem sua religião com o apoio do governo, construir um muro e revogar leis que protegem os indivíduos de perseguição e violência. Estão se esforçando pra fazer merda. Tudo isso pode ser apenas um monte de conversas para ganhar a eleição, mas mesmo assim não deixa de ser um inferno de uma mensagem maldosa, e sua ironia parece ter se perdido na maioria de seus simpatizantes.

Muitos de nossos leitores parecem zangados por termos falado tanto desta eleição, mas aqueles que não conhecem sua própria história estão condenados a se darem mal justamente por isso mais tarde - e este é um momento histórico para os metalheads. O metal sempre esteve distante do que é convencional, obediente e facilmente engolido, e essas são três virtudes sagradas da América de Donald Trump. Não se deixe enganar pensando que esta será uma nova era incrível para o metal, estimulada por alguém que todos estão loucos para odiar. No momento em que esse sujeito se sentir ameaçado por pessoas como a gente, ele encontrará uma maneira de nos prejudicar.

Editorial publicado pelo Metal Sucks, um dos maiores sites especializados em heavy metal dos Estados Unidos

Tradução de Ricardo Seelig

Comentários

  1. Relacionar política com heavy metal foi demais, mais um que acredita que Trump é o anti-Cristo. Texto com informações totalmente equivocadas e desconexas. Espero que escreva coisa mais relevante que isso.

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