Review: Baco Exu do Blues - Bluesman (2018)


Já há alguns anos, duas coisas estão bem claras na música brasileira. Enquanto o rock BR se afastou de questões sociais, se distanciou das ruas e se transformou, de modo geral, em um gênero que deixou a atitude, as letras críticas e o discurso contestador para trás, todas esses ingredientes foram com mala e cuia para o rap. Desde o surgimento dos Racionais MC’s lá nos anos 1990, gradativamente tivemos cada vez menos Cazuzas e Renatos Russos e ganhamos a presença cada vez mais forte de Manos Browns. E isso diz muito sobre o país em que vivemos.

Assim como Criolo, Emicida e Rincon Sapiência lançaram discos incríveis nos últimos anos, cada um à sua maneira unindo a poesia com inspiração nos fatos do cotidiano e uma amálgama musical particular, Baco Exu do Blues dá sequência ao baile. Natural da Bahia, terra fértil em referências musicais, Baco lançou dia 23 de novembro o seu segundo álbum, Bluesman - o primeiro, Esú, saiu no ano passado.

Em pouco mais de 30 minutos, temos nove faixas que estão entre os momentos mais criativos e trazem algumas das letras mais bacanas que a música brasileira ouviu nos últimos anos. Baco bebe na música do mundo, iniciando o álbum com um sample da clássica “Mannish Boy”, de Muddy Waters, e um discurso claríssimo na excelente música que dá nome ao disco: "Eu sou o primeiro ritmo a formar pretos ricos / O primeiro ritmo que tornou pretos livres / Anel no dedo em cada um dos cinco / Vento na minha cara eu me sinto vivo / A partir de agora considero tudo blues / O samba é blues, o rock é blues, o jazz é blues / O funk é blues, o soul é blues / Eu sou Exu do Blues / Tudo que quando era preto era do demônio / E depois virou branco e foi aceito eu vou chamar de blues / É isso, entenda / Jesus é blues / Falei mermo”.

Musicalmente, o disco bebe predominantemente no rap com toques de rhythm & blues, mas insere ingredientes de rock, funk, soul, jazz e o que mais der na telha, resultando em uma salada sonora que casa perfeitamente com as letras. Seu universo vai muito além das fronteiras, como deixa claro em “Me Desculpa Jay Z”, “Kanye West da Bahia” e “BB King”. Baco usa a tradição e a história do blues como fio condutor e pano de fundo para contar a sua própria história, tudo isso através de um hip hop inteligente e que não se furta de dizer o que precisa ser dito.

Bluesman nasce com cara de clássico. Em um tempo onde tudo, eu sei, é apontado como clássico. Porém, a qualidade do trabalho de Baco Exu do Blues tem tudo para tornar esse seu segundo álbum perene e eterno. Como o blues. Como a música. Como a música negra.

Afinal, como ele próprio canta: "Jerusalém que se foda, eu tô à procura de Wakanda”.

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