Streaming: um desserviço à música ou a culpa é dos ouvintes?



A ascensão dos serviços de streaming que temos atualmente está tornando cada vez mais fácil o acesso às nossas músicas favoritas. Tanto no Brasil quanto no mundo, é cada vez maior o número de pessoas que adentram ao mundo tecnológico do streaming. Serviços como Spotify, Deezer, Apple Music, Tidal até mesmo o YouTube oferecem esta comodidade, e apenas o Spotify já alcançou o número total de 217 milhões de usuários ao redor do mundo, sendo mais de 100 milhões o número de assinantes. A Apple Music, por sua vez, leva vantagem nos Estados Unidos. Não oferendo o serviço gratuito, a vertente musical da Apple domina o mercado norte-americano com uma margem de 2 milhões a mais de usuários em relação ao Spotify.

Certo, mas qual a relevância disso? Bom, o fato complicador é que numa pesquisa realizada pela Deezer (que possui cerca de 53 milhões de usuários) no Reino Unido e publicada pela Music Week, o número de pessoas ouvindo álbuns completos continua em queda. Atualmente, cerca de 49% dos usuários não ouvem um disco na íntegra, comparando com cinco anos atrás.

A Deezer entrevistou cerca de 2.000 adultos no Reino Unido e constatou que 42% das pessoas estão colocando as músicas para tocar em ordem aleatória ou reproduzindo faixas individuais. Com ouvintes menores de 25 anos este número aumenta para 55%. A Deezer apontou ainda que 15% destes jovens nunca ouviram um álbum completo na vida, mas, ainda assim, um quarto deles acredita que apenas ser fã é o suficiente, querendo ouvir mais produções daquele determinado artista no futuro.

No mais, a pesquisa ainda mostra que o tempo de reprodução de um álbum no Reino Unido é de 17 minutos por dia na média, contrariando a média mundial de 26 minutos. Um adendo a isto é que a média de tempo por faixa individual também tem diminuído. Os artistas tendem a produzir faixas com tempo de duração menores afim de atingirem “maior consumo dos fãs”. Curiosamente, a pesquisa mostra que após assistir a apresentação ao vivo de um artista, a procura pelo álbum completo aumenta para 74%. Já antes de um show, a busca pelo disco é de 32%.


Esta ascensão do streaming em contrapartida ao disco físico levou a indústria a unir forças para criar o National Album Day (Dia Nacional do Álbum), que terá sua edição 2019 marcada para 12 de outubro, cujo tema será Don’t Skip (Não Pule). A ideia é fazer com que os usuários dos serviços de streaming compartilhem seus álbuns favoritos com a hashtag #DontSkip e a tag @AlbumDayUK.

De fato, o desinteresse dos ouvintes pela obra completa do artista ou banda é algo preocupante. Um disco é a obra máxima do artista, é o ápice do seu trabalho. Ouvir as músicas em ordem aleatória ou pular certas faixas é como observar um quadro pela metade - ou um quadro de Picasso, talvez. Se fosse possível, você não fotografaria a Mona Lisa apenas do pescoço para baixo, você a contemplaria como um todo. Ouvir um álbum na íntegra é observar a expressão dos seus artistas favoritos expondo a arte guardada no seu íntimo, é admirar as nuances que tornam aquele disco único na vida do artista e, talvez, na sua. Mais do que isso, é perceber ou se lembrar porque aquele artista é digno da sua admiração.

Que a ideia criada no Reino Unido se expanda pelo mundo. E que nós, brasileiros (por sinal o país que mais ouve Iron Maiden no mundo, segundo dados do YouTube), possamos ser parte desta valorização da arte que tanto nos envolve.

Uma vez li que a verdadeira intimidade significa aproximar-se de algo apesar das suas falhas. A música, como obra, não tem falhas, então por que nos afastamos dela?

Por Tarsis B. Zilli

Comentários

  1. Eu particularmente, curto albuns de cabo a rabo e achei legal a iniciativa, porém a forma como você traz a notícia me desagradou bastante.

    Desserviço ou culpa dos ouvintes? Nem um, nem outro. Não vejo nada de errado na forma como as pessoas consomem música hoje em dia. Coletâneas sempre existiram.

    O texto dá a entender que "bons ouvintes" ou os "verdadeiros amantes da música" são aqueles que ouvem todo o disco.

    Não existe maneira correta de se consumir arte. A experiência é individual. A Mona Lisa não é um disco completo, ela é uma faixa. O disco inteiro seria toda a produção do Da Vinci naquele ano e não é assim que você aprecia toda a beleza da Monsa Lisa.

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