Discoteca Básica Bizz #204: Rainbow - Rising (1976)



Demorou um bocado. Ritchie Blackmore foi lançar um álbum que era um retrato fiel de sua personalidade somente em julho de 1976. No começo do Deep Purple, as aspirações pesadas de Blackmore batiam de frente com as pomposidades eruditas de Jon Lord. As faíscas aumentaram ainda mais na época de David Coverdale e Glenn Hughes, em que as guitarras medievais do guitarrista duelavam com o soul e o funk da dupla de crooners do Purple.

Insatisfeito, em 1975 Blackmore formou o Rainbow, grupo seminal do heavy metal inglês. Depois de uma não tão explosiva estreia vinílica (Ritchie Blackmore's Rainbow, lançada naquele mesmo ano), o dono da bola dispensou o time inteiro (com exceção do vocalista), recrutou novos aliados e sabiamente calibrou seus talentos individuais, engendrando sua obra definitiva, Rising. O suntuoso fruto musical de Blackmore trazia seis fortes composições que serviriam como marco zero do famigerado "rock de penhasco".

Na linha de frente do Rainbow estava Ronnie James Dio, um épico vocalista de primeira estirpe, dono de uma voz poderosa e única, perfeita para as maquiavélicas intenções de Blackmore. Ambos tinham se conhecido em tours pela América, quando a banda de Dio (Elf) abria alguns shows do Deep Purple. Por detrás dessa dupla, uma locomotiva sonora se fazia presente: o baterista Cozy Powell, herdeiro legítimo do Bonham way of play, exímio instrumentista e força propulsora, ao lado do baixista Jimmy Bain, daquela que era "A" formação do Rainbow.


O LP original trazia uma proposital divisão entre canções curtas e longas. As mais diretas ficam no lado A: "Starstruck" falava sobre uma entidade (ou seria uma groupie?) chamada Muriel, que perseguia Blackmore onde quer que ele fosse. "Do You Close Your Eyes" pode ser encarada como o primeiro passo rumo ao som mais comercial que o grupo adotaria no início dos anos 1980. "Tarot Woman" mistura misticismo e virtuosismo, e "Run with the Wolf" é mais um empolgante balanço do que qualquer outra coisa.

Já o lado B ficou reservado para dois longos e progressivos temas: "Stargazer", um dos hinos definitivos do heavy metal, um testamento do som pesado forjado pela introdução de pura violência rítmica de Cozy Powell, e "A Light in the Black", que ocasionava longos solos do Moog (Tony Carey) e da Stratocaster de Blackmore, lembrando os bons tempos do Deep Purple.

Com uma equipe entrosada, o Rainbow partiu para as arenas mais concorridas do planeta e registrou o lendário álbum ao vivo On Stage (1977). A boa fase parecia seduzir até mesmo o mal humorado protagonista: num show no Japão, Blackmore decidiu tirar um sarro de Carey. Durante um longo e monótono solo de teclado, Blackmore subiu ao palco com uma cadeira de praia, sentou-se no meio do tablado e calmamente degustou o caderno de esportes de seu jornal preferido.

Depois de mais um disco em grande estilo (Long Live Rock 'n' Roll, de 1978), o manda-chuva dispensou Dio e partiu para um som mais comercial, contando com os vocais de Graham Bonnet (em Down to Earth, de 1979) e depois do odiado Joe Lynn Turner.

O Rainbow escreveu sua biografia em qualquer lugar, menos nas enciclopédias roqueiras. Tanto para os que idolatraram o Iron Maiden nos anos 1980 como para os que hoje engordam o coro do metal melódico, Blackmore não passa de um sujeito que cunhou um riff manjado ("Smoke on the Water"). Contudo, para quem viveu o som pesado da década de 1970, fica claro que Rising foi o ápice da carreira do enfezado guitarrista e de todo um estilo.

Texto escrito por Bento Araújo e publicado na Bizz #204, de agosto de 2006


Comentários

  1. Ótima resenha, com exceção do último parágrafo - Rainbow e Ritchie Blackmore sempre foram muito bem lembrados e considerados pelo pessoal do "rock do penhasco" (seja lá o que isso signifique).

    ResponderExcluir
  2. bom, gosto muito do Bento Araujo mas ele já fez resenhas melhores. Sou amante da boa musica há, pelo menos, 35 anos (tenho 45) e nunca tinha ouvido falar no termo "rock do penhasco". Concordo com a observação do anonimo acima e também penso que o Joe Lynn Turner não é ou foi odiado pelos fãs da banda, apenas bem menos querido do que Dio mas que cantou em grandes canções como I Surrender, Tearin' out my heart, entre outras. De resto apenas a confirmação de um grande disco.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.