Quando o Sepultura lançou Morbid Visions em 1986, o Brasil era outro. O país saía lentamente da ditadura militar, o metal extremo ainda engatinhava por aqui e as gravações independentes eram feitas com recursos precários e muita vontade. Em meio a esse cenário, quatro garotos de Belo Horizonte – Max e Igor Cavalera, Jairo Guedz e Paulo Xisto – deram origem a um dos discos mais crus, violentos e influentes da história do metal brasileiro.
Gravado em apenas dois dias em Belo Horizonte, Morbid Visions é o retrato de uma banda que ainda estava aprendendo a tocar, mas já transbordava atitude. O som é caótico, a produção é amadora e o inglês é quase ininteligível – mas nada disso importa. A energia que sai das faixas é tão intensa e autêntica que o álbum se tornou um marco. O Sepultura ainda não era o gigante que conquistaria o mundo, mas aqui já estava plantada a semente da revolução.
As influências são claras: Venom, Hellhammer, Celtic Frost e Possessed. A iconografia satânica e o som primitivo aproximam o álbum da primeira leva do black metal, embora a brutalidade já apontasse para o death metal que surgiria logo depois. A faixa-título abre o disco com fúria adolescente, seguida por “Mayhem”, “Troops of Doom” e “War”, canções que resumem bem a mistura de ignorância sonora e urgência criativa que definia o underground brasileiro da época. “Troops of Doom”, em especial, sobreviveu ao tempo – regravada diversas vezes, tornou-se um hino e um elo entre o passado e o futuro do Sepultura.
O impacto de Morbid Visions foi imenso dentro do metal nacional. Lançado pela Cogumelo Records, o álbum ajudou a consolidar a cena de Belo Horizonte e abriu caminho para outras bandas como Sarcófago, Mutilator e Holocausto. Fora do Brasil, o disco ganhou status cult e é frequentemente citado como uma das obras fundadoras do death e black metal.
Com o tempo, o próprio Sepultura deixaria para trás o satanismo caricato e o som primitivo, evoluindo rapidamente em Schizophrenia (1987) e alcançando reconhecimento mundial com Beneath the Remains (1989). Mas Morbid Visions permanece como um registro histórico – um documento cru, sujo e indispensável de uma juventude em ebulição, que transformou a precariedade em força e a fúria em arte.
Um álbum que não apenas inaugurou a trajetória do Sepultura, mas também colocou o Brasil no mapa do metal extremo.
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