Lançado no apagar das luzes de 2000, Renegades costuma ser lembrado como “o álbum de covers do Rage Against the Machine”. E embora essa definição seja tecnicamente correta, ela está longe de dar conta do que o disco realmente entrega. Em vez de prestar homenagens obedientes a seus ídolos, o quarteto usa cada faixa como veículo para reafirmar sua própria identidade pesada, politizada e impossível de confundir com outra banda.
O repertório é uma viagem guiada pelas raízes do Rage, atravessando hip-hop, punk, rock clássico e proto-punk. Mas o que impressiona é como tudo soa coeso. Em “Microphone Fiend”, do Eric B. & Rakim, Tom Morello transforma o riff original em um muro de guitarras vibrante, enquanto a cozinha de Tim Commerford e Brad Wilk entrega um groove que parece saído de um porão abafado em Los Angeles. Já em “Renegades of Funk”, clássico de Afrika Bambaataa, o grupo simplesmente domina a música: é RATM até o último segundo, urgente e incendiário.
As escolhas inesperadas funcionam especialmente bem. A releitura de “The Ghost of Tom Joad”, de Bruce Springsteen, dá ao folk politizado de The Boss uma nova camada de tensão urbana. E “Kick Out the Jams”, do MC5, recebe uma atualização musculosa que preserva o espírito revolucionário da original. Até “Maggie’s Farm”, de Bob Dylan, ganha uma dose extra de raiva que, no fim das contas, se encaixa perfeitamente no DNA do Rage Against the Machine.
Mas Renegades também revela outra coisa: poucos grupos têm a capacidade de absorver influências tão diversas e devolvê-las com tanta personalidade. As faixas não soam como covers, mas como se tivessem sido escritas pelo próprio RATM. Mesmo quando a banda não reinventa completamente a estrutura ela encontra um novo eixo emocional, seja pela voz de Zack de la Rocha, ainda no auge da intensidade, ou pelo magnetismo inventivo de Morello.
Por isso, apesar de muitas vezes tratado como obra menor, Renegades merece ser revisitado com atenção. É um documento revelador, um mapa das obsessões que moldaram o Rage Against the Machine e, ao mesmo tempo, uma mostra de como transformar reverência em reinvenção. Um disco que talvez não tenha sido planejado para ser um ponto final, mas que encerra a primeira fase da banda com força e identidade de sobra.
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