A origem do space-rock


Por Ronaldo Rodrigues
Colecionador

A taxonomia musical é largamente aplicada e exagerada, mas muitas vezes fica difícil fugir dela quando há a necessidade de descrever com uma maior precisão o som de uma banda ou de um conjunto de bandas. No caso, o próprio termo "rock progressivo" esbarra em divergências e muitos músicos, do que os próprios ouvintes consideram como tal, negam o termo.

Confusão maior ainda se instala quando alguém surge com um termo para designar uma parte desse grande universo sonoro. Porém, convenhamos - é realmente um pouco complicado tentarmos achar uma associação clara entre o som de Yes, Can, Soft Machine, Gentle Giant, Focus, Guru Guru ou Renaissance, para exemplificar, todos dentro de um conceito geral de rock progressivo. Daí pipocam mil maneiras de se colocar cada um num compartimento separado, tentando achar semelhanças e divergências entre os trabalhos. Na verdade, tudo fazia parte de uma época muito eclética, de diversificação e experimentação dentro do rock, ou da música jovem (como preferirem).

Partindo desse pressuposto, um destes termos que surgiu como sub-gênero dessa coisa maior denominada rock progressivo foi o termo space-rock (cunhado já no fim dos anos 60). Com a chegada do homem à lua e toda a corrida espacial entre EUA e URSS que a precedeu, a ficção a respeito do tema cresceu muito, em seriados, filmes e desenhos animados. Até mesmo o design dos carros e eletrodomésticos nos anos 50 e 60 foi influenciado por isso. E claro que no rock isso não seria diferente. Em 1966 os Byrds já abordavam esse tipo de coisa em músicas, ainda que bem singelas, como "Hey Mr Spaceman" e "Fifth Dimension".

Com o advento da cultura psicodélica e todo seu aparato de adictos para a "expansão da mente", atingiu-se um novo patamar de possibilidades dentro do rock, e esses terrenos passaram a ser mais explorados. Trabalhos celébres dos Beatles e Beach Boys começaram a inovar no sentido de acrescentar ruídos do cotidiano em músicas, e também ruídos provenientes de novos equipamentos que estavam sendo construídos na época - os sintetizadores. Isso tudo foi combustível para que um sem número de grupos também usasse e abusasse deste tipo de recurso, muitas vezes se valendo deles de forma muito inventiva. Somaram-se também as novas tecnologias de efeitos sonoros que se popularizavam na época - reverb, delay, wah-wah, flanger, etc.


Em 1967 a estreia do Pink Floyd foi um marco nesse sentido, usando os efeitos sonoros dos pedais de guitarra e dos teclados para a criação de climas que remetiam à viagens espaciais e coisas relacionadas. Jimi Hendrix também foi um precursor nesse sentido, mas a maneira como ele experimentava os diversos recursos que tinha em mãos levava seu som para uma direção um pouco diferente da que o Pink Floyd conseguia. Pode se dizer que essa tendência do space-rock começou por ali, não como uma nova forma musical, mas sim como um novo aparato sonoro para a construção de intenções e climas diferenciados na música.

Nos anos 70 essa tendência também culminou em uma outra linha - a música eletrônica, feita quase que exclusivamente com sintetizadores e baterias eletrônicas, precursionada por gente como Tangerine Dream, Kraftwerk, Cluster e outros grupos alemães, principalmente. Em geral, existem poucos grupos que mergulharam tão fundo nessa tendência a ponto de serem até considerados como bandas de space-rock, mas podemos citar sem muita chance de exagero o próprio Pink Floyd na fase pré-Dark Side of the Moon, o Hawkwind e o Gong, como exemplos mais famosos.


Uma gama muito grande de bandas passearam pelo space-rock. Tanto as mais pesadas, como o UFO, Captain Beyond, Cargo, Road e Steamhammer, quanto as mais progressivas / experimentais, como o Soft Machine, Nucleus, Agitation Free, Embryo, Nektar, Khan e Steve Hillage (carreira solo), entre outros. Aqui no Brasil dos anos 70, as bandas que flertaram um pouco com essa seara foram O Terço e o Som Nosso de Cada Dia (na fase em que se transformou em um quarteto).

Como características principais, o space-rock traz diversos efeitos sonoros, letras remetendo a ficção científica (a despeito da maioria dos exemplos ser de música instrumental), timbres inovadores de sintetizadores, uso extensivo de pedais que modificam o som dos instrumentos acústicos e batidas e estruturas repetitivas e/ou hipnóticas. Enfim, tudo uma grande viagem sideral!


O programa Estação Rádio Espacial, veiculado pela Solid Rock Radio toda quarta-feira a partir das 21 horas, traz na próxima edição, dia 30 de setembro, um mini-especial de space-rock, tocando alguns exemplos dessa tendência dentro do rock progressivo. Estação Rádio Espacial é um programa dedicado ao rock progressivo e hard rock dos anos 70, a linguagem art-rock, tocando raridades, lado B e som underground (além de alguns clássicos também). Reprise do programa, toda quinta, 19 hs.

Apresentação e produção musical: Ronaldo Rodrigues.

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