The Strokes: crítica de Comedown Machine (2013)

Há um ranço generalizado em relação ao Strokes. Não sei de onde vem isso. Talvez do hype exagerado causado por Is This It (2001), um bom disco alçado ao status de clássico de uma geração e um dos muitos “salvadores” de um rock que nunca precisou ser salvo. Pode ser. Ou essa má vontade pode ter nascido da postura assumidamente blasé dos caras, seguros de si e pouco se lixando para o que pensam, escrevem ou falam sobre eles. Não sei.

O que sei é que todo esse antagonismo da crítica em relação à banda prejudica profundamente e compromete a avaliação de qualquer disco lançado pelo grupo. Principalmente aqui no Brasil, mas também em grandes veículos mundo afora, não há isenção ao analisar a música do Strokes, como se tudo o que a banda representa fosse mais importante e devesse ser derrubado sem dó, não importando se o que o grupo produziu é bom ou ruim.

Comedown Machine, quinto disco do quinteto, chega às lojas na próxima terça-feira, dia 26 de março. Ele é o sucessor de Angles (2011), trabalho que dividiu opiniões. O álbum marca também o fim do contrato da banda com a RCA, cuja logo ocupa grande destaque na bonita capa.

O que temos em Comedown Machine é um aprofundamento na sonoridade oitentista já prenunciada em Angles. O synth-pop e o new romantic daquela década dão o tom em diversas faixas, mostrando influências de nomes como New Order, OMD, Go West e Echo and The Bunnymen. Essa nova característica, no entanto, convive lado a lado com composições onde a banda soa de maneira muito similar ao início de sua carreira, com as guitarras sendo os personagens principais. O tracklist evidencia essa dicotomia, alternando esses dois caminhos. A grosso modo, as faixas ímpares mostram o Strokes atual e apontam para o futuro, enquanto as pares olham para o passado tentando retomar a vivacidade de uma época que já passou.

O resultado dessa luta por uma nova identidade musical faz de Comedown Machine um dos trabalhos mais completos da carreira do Strokes. Surpreendentemente maduro, o disco mostra a banda acertando na maioria das suas experimentações. A abertura com “Tap Out” chega a lembrar, em um nível quase subconsciente, Michael Jackson. O primeiro single, a grudenta “One Way Trigger”, rebaixada a um pseudo tecnobrega e alvo de comparações com a horrenda Gaby Amarantos por parte da apressada crítica brasileira, mostra na verdade uma enorme influência dos noruegueses do A-ha. “Welcome to Japan” revela que os músicos são fãs do David Bowie do início da década de 1980, de álbuns como Let’s Dance (1983). A contemplativa “80’s Comedown Machine” é uma das mais belas canções já gravadas pelo grupo, com uma melancolia e um saudosismo que deixam claros, para quem ainda tinha dúvidas, a adoração de Julian Casablancas e companhia pela década mencionada em seu título.

Do outro lado da moeda, músicas como “All the Line”, “50/50” e “Partners in Crime” colocam os guitarristas Nick Valensi e Albert Hammond Jr. no topo da cadeia alimentar do universo particular do Strokes, trocando acordes em agressões mútuas. É a banda mostrando que continua sabendo fazer o tipo de som que a consagrou.

O pop de “Happy Ending” talvez seja o momento onde esses dois lados, a princípio antagônicos, se encontram com mais harmonia. Com uma batida oitentista, a faixa traz guitarras que emulam o trabalho que deveria ser feito por sintetizadores (se eles tivessem um tecladista), porém soando como guitarras. Uma grande faixa, que chegou para fazer parte de qualquer retrospectiva futura sobre a banda.

“Call It Fate, Call It Karma” encerra o disco como uma espécie de bossa nova lounge relaxante, e que deve colocar mais um ponto de interrogação na cabeça de quem deseja uma banda dando voltas eternas ao redor do próprio rabo.

Comedown Machine é um dos álbuns mais consistentes da carreira do Strokes. Muito superior a Angles, mostra o grupo mergulhando fundo na década de 1980 e encontrando uma nova sonoridade que parece ser definitiva. Sereno e agradável, revela uma banda segura de si e sem medo de experimentar, qualidades sempre elogiáveis em qualquer atividade artística.

Depois de momentos de incerteza, parece que o Strokes entrou nos trilhos novamente. Resta saber se os fãs vão embarcar juntos.

Nota 8

 

Faixas:
1 Tap Out
2 All the Time
3 One Way Trigger
4 Welcome to Japan
5 80’s Comedown Machine
6 50/50
7 Slow Animals
8 Partners in Crime
9 Chances
10 Happy Ending
11 Call It Fate, Call It Karma

Por Ricardo Seelig

Comentários

  1. Parabéns pela crítica Ricardo. Concordo com tudo que você falou a respeito da postura de alguns críticos com relação aos trabalhos da banda. Não achei o Angles um grande disco, mas não era nem de longe tão horrivel como a crítica de um modo geral nos fazia pensar, pois tinha algumas músicas muito boas. Já escutei o novo 2x e me parece uma continuação aprimorada do anterior. Mas óbvio que já tem muita crítica exagerada por aí, como essa aqui, por exemplo: http://www.botequimdeideias.com.br/flogase/resenha-the-strokes-comedown-machine/

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  2. Essa parte da comparação com a Gaby é "obra" do Regis Tadeu.. Bom ver resenhas completamente diferentes. Nota-se como a música e a arte em geral pode despertar variados sentimentos e reforça uma pouco a minha "pseudo-tese" de que grande parte da crítica leva mais em conta quem faz do que o que é feito. Não o caso dessa resenha é bom salientar, muito mais equilibrada e consistente.

    Em tempo, não suporto Strokes e não curtir o álbum, mas é inegável que a resenha foge desse estigma em relação a banda o que é muito bom para ser ter uma dimensão mais equilibrada desse produto. ^^

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  3. Quando ouvi o disco e gostei, achei que estava louco após ler as resenhas e críticas negativas generalizadas. Só não gostaram do disco, as pessoas que esperavam algo espetacular. Strokes sempre foi uma banda boa, acima da média, mas nada além disso e não tem problema algum em ser assim. Eles sempre se envolveram em louvores e críticas desproporcionadas, pelo som comum/bom que fazem.

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  4. Caralho, nunca tinha visto uma resenha tão ruim quanto essa que o Virgilio postou, o cara ali já até escreveu que a banda tá acabando, que lixo

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  5. Estou a ouvir o álbum enquanto leio a crítica.
    Não concordo nem discordo do conteúdo, é uma opinião.
    Pessoalmente gosto mais do som dos The Strokes dos primeiros álbuns, mais intenso e cru. Também mais direto e sem rodeios, o que em minha opinião não combina bem com o abuso nos sintetizadores que marcam os últimos trabalhos. Quem conhece o álbum do Julian "Phrazes For The Young", verifica que as influências dele marcam claramente o destino da banda..seja ele qual for.
    Por outro lado também compreendo que não seria fácil fazer mais trabalhos com o mesmo registo dos primeiros e que os músicos sintam constante necessidade de recriar conceitos e inovar, sendo que tal facto é quase sempre uma influência determinante no que diz respeito à sobrevivência/extinção das bandas.
    Estaremos cá para ver o futuro..ou não, dos The Strokes.
    Cumprimentos a partir de Lisboa.

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  6. Parabéns cara! Uma vez na vida vejo uma critica que preste, sem deixar se influenciar por besteiras extra/banda e avaliando puramente a música. Fodam-se aqueles que acham o Strokes a salvação do rock, e que tudo que eles fazem diferente de Is This It é lixo e "perda de identidade. Just feel the music, dudes.

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