Deep Purple: crítica de NOW What?! (2013)


É interessante acompanhar o que acontece com uma banda como o Deep Purple, literalmente há décadas na estrada. Formada em 1968 na cidade de Hertford, Inglaterra, o lendário grupo lançou recentemente seu décimo-nono disco de estúdio, ironicamente batizado de NOW What?!.

Como ocorre com outros ícones que teimam em não encerrar as suas atividades (como é o caso de nomes como Rolling Stones e The Who, só para ficar em dois exemplos), ao ouvir um novo álbum do Deep Purple é preciso deixar o passado de lado e concentrar-se no presente. Evidentemente não temos aqui a energia exuberante dos anos dourados, bem como a criatividade sem limites que levou a banda ao topo. Em seu lugar surge a experiência e a maturidade. A idade avançada dos músicos - Ian Gillan e Roger Glover beirando os 68 anos, Ian Paice e Don Airey do alto dos 65 e o caçula Steve Morse com 59 -, ao mesmo tempo em que naturalmente impõe algumas limitações, compensa esse aspecto com a enorme trajetória acumulada.

Produzido por Bob Ezrin, NOW What?! surpreende por trazer uma sonoridade refrescante, que cativa pela espontaneidade e pela sempre bem-vinda aura própria que o grupo construiu ao longo dos anos. Não há a sensação de estarmos ouvindo um trabalho feito apenas para cumprir tabela, muito pelo contrário: fica evidente a paixão, o envolvimento e o comprometimento com que o quinteto gravou o disco. E isso, em se tratanto de uma banda que está na ativa há 45 anos e já nos brindou com as suas obras-primas indiscutíveis, é um elogio sincero e um convite à diversão.

O Deep Purple não faz mais música para adolescentes, para jovens que estão descobrindo o rock nesse exato momento. Para eles, Machine Head (1972) e Burn (1974)  seguirão sendo as Pedras de Roseta. O Purple de 2013 faz música para, primeiramente, cinco pessoas: Ian, Roger, Paice, Don e Steve. E, por consequência, para quem acompanha o conjunto há um longo período e, assim como os próprios músicos, também amadureceu, ficou mais velho, perdeu cabelos, ganhou peso e segue apaixonado pelo rock.

Primeiro disco de inéditas em 8 anos, desde Rapture of the Deep (2005), NOW What?! é claramente superior aos últimos trabalhos, incluindo na conta também Bananas (2003) e Abandon (1998). Pode-se até afirmar, sem cometer exageros, que trata-se do melhor álbum do Deep Purple com Steve Morse desde a estreia do guitarrista na banda, em Purpendicular (1996). E o ponto-chave para essa certeza é improvável e atende pelo nome de Don Airey. Improvável porque Airey, na banda desde 2002, brilha em NOW What?! como nunca brilhou antes, imprimindo o seu toque pessoal à música do Purple, construindo essa identidade sobre o irretocável passado pintado com primazia pelo imortal Jon Lord. Airey respeita o legado de Lord, mas pela primeira vez não fica preso a ele, indo além com grande talento.

Há em NOW What?! uma sólida coleção de faixas que, entretanto, exigem que o ouvinte esteja na mesma sintonia da banda. É preciso ter claro que você não irá ouvir aqui uma nova “Smoke on the Water”, uma nova “Mistreated”, uma nova “Child in Time”. Isso já foi feito. A sonoridade que chega aos ouvidos em NOW What?! é rica e cativante, com pequenos toques e elementos de vários estilos e histórias, diversas experiências e timbres que só poderiam vir ao mundo justamente por uma banda com músicos tão rodados e calejados como os do Purple.

Gillan canta com muito bom gosto, sabendo usar a sua voz com sabedoria. Paice segue sendo um monstro na bateria. Glover mantém o groove sempre pulsando. Morse entra na jogada com riffs inspirados, enquanto Airey, como já dito, é o grande destaque, com solos que hipnotizam e intervenções sempre certeiras.

Eu não esperava, a essa altura não só da minha vida, mas sobretudo da vida dos integrantes do Purple, ouvir um disco como NOW What?!. Ponto para a banda, que mostra que, apesar da eterna reclamação dos saudosistas, ainda tem o que mostrar e está longe de se aposentar. Por mais que queira evitar o clichê, aqui ele se faz mais do que adequado: como um bom vinho, o Purple segue mantendo a sua qualidade mesmo com o passar dos anos.

Nota 7
 


Faixas:
1 A Simple Song
2 Weirdistan
3 Out of Hand
4 Hell to Pay
5 Body Line
6 Above and Beyond
7 Blood from a Stone
8 Uncommon Man
9 Après vous
10 All the Time in the World
11 Vincent Price

Por Ricardo Seelig

Comentários

  1. SEMPRE VOU COMPARAR SIM C OS CLÁSSICOS ..... e para MIM desde 75 c o COME Taste The Band q eles n fazem NADA de bom !

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  2. É realmente um bom disco... de sonoridade bem interessante...com arranjos complexos...enfim...é um disco com a cara desta formação do Purple...ainda acho o Purpendicular melhor....mas este chega bem próximo...questão de preferência mesmo...
    Pegando o gancho sobre 75...considero que após o Come Taste eles lançaram três discos que são bons como um todo: Perfect Strangers, Purpendicular e este que se encontra resenhado.... os demais vão de mediano (Abandon, Bananas, Rapture of Deep) a fraco (House of Blue Light, Slaves and MAsters, The Battle RAges on)...claro com algumas boas faixas aqui e acolá ...
    Gostei muito da resenha
    Abraços

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  3. Ótima resenha, reflete bem o objetivo do disco e o seu conteúdo, mas não acho que ele seja melhor que o Bananas, por exemplo.

    Pode ser, e de fato é, melhor que o Rapture Of The Deep, mas essa é só minha opinião...rs

    A essa altura da vida artística e pessoal, eles tem moral pra fazer qualquer tipo de álbum que quiserem...

    Ah Cadão, bem vindo da volta dos que não foram...rs

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  4. Pra mim o Purple acabou com o Come Taste The Band também, e a MK 4 foi a melhor de todas - o contrário do que muita gente pensa. Bolin se encaixou melhor na proposta Soul/Funk. Simpatizo pelo Purpendicular por ter trazido a banda de volta ao Brasil, que andava esquecida pelos jovens naqueles tempos com internet engatinhando, depois de um longo hiato. Vou ouvir esse disco, mas só depois de ouvir o Seven Deadly do UFO! Essa sim, está mandando ver a tempos! rs

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  5. Ótima resenha. Reflete com perfeição o objetivo do disco. Eu, como um apaixonado por Purple, porém, dou nota é 9.

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  6. Sinceramente eu achei esse álbum um dos melhores do Deep Purple. Ouço Deep Purple desde criança e logo na primeira faixa fiquei impressionado com a proposta do álbum. Não caíram naquele maldito erro de tentar reviver o passado. Toda banda que faz isso consegue ser desastrosa. O Deep Purple não. Esse álbum realmente é o melhor com o Steve Morse. Achei um som bem inteligente, com uma pegada de blues e jazz-fusion. Sem dúvidas está entre os melhores álbuns do ano, e das bandas clássicas, talvez o melhor. Dos trabalhos recentes de bandas clássicas, provavelmente só o Clockwork Angels do Rush se iguala a esse do Deep Purple.

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