Essa edição é especial pois contamos com duas novidades. A primeira é a estreia do novo integrante de nossa equipe, Tiago Neves, que a partir de hoje passa a dividir o seu conhecimento e as suas ideias sobre música com os leitores. Seja bem-vindo, Tiago! E a segunda é a participação especial de Diogo Bizotto, editor da Consultoria do Rock e um dos maiores conhecedores da obra de Springsteen.
Coloque o álbum para rodar e boa leitura!
A notícia de que Bruce Springsteen já tinha um novo álbum pronto para ser lançado, divulgada quando a turnê promovendo Wrecking Ball (2012) mal havia terminado, foi surpreendente. Nem mesmo a confirmação de que se trataria de um disco compilando regravações, covers e músicas que não haviam sido aproveitadas anteriormente serviu para estragar a expectativa, afinal, quantos artistas - especialmente aqueles com mais de três décadas de carreira - mantêm a invejável constância de Springsteen desde que retornou com The Rising (2002), após um hiato de vários anos, lançando sete álbuns de inéditas desde então? A audição, porém, deve ser feita levando esse fato em consideração. Os mais atentos certamente notarão a falta de uma unidade temática, presente em praticamente todos os registros do músico e dissecada de todas as maneiras possíveis por críticos musicais, de forma até exagerada. Isso é normal, afinal, trata-se de um disco único em sua trajetória, cuja natureza difere do habitual desde sua concepção, como uma compilação, segundo o próprio Springsteen afirmou, de "canções que precisavam ser lançadas". O problema maior reside no fato de que essa coleção de faixas, em geral, fica devendo em relação a álbuns mais recentes. Um dos motivos pelos quais isso ocorre são alguns exageros nos arranjos, especialmente de sopros, que não funcionam tão bem em High Hopes quanto funcionaram em Wrecking Ball. Muito provavelmente por isso, uma das músicas que logo se destacaram para mim foi "Frankie Fell in Love", mais econômica e em conjunção com aquilo que Springsteen costumava apresentar no passado, quando cercava-se apenas da E Street Band. Inclusive, consigo enxergá-la bem encaixada em The River (1980). Em "American Skin (41 Shots)", porém, a canção pede esmero e refino, e a nova versão faz jus àquela que já vinha sendo executada ao vivo desde 1999. Inclusive, a presença do guitarrista Tom Morello faz especial diferença nessa faixa, além, é claro, da releitura agressiva para "The Ghost of Tom Joad", outro destaque, que inclusive já havia sido gravada pelo Rage Against the Machine, do próprio Morello. No entanto, não se engane: a presença do guitarrista, apesar de certeira em alguns momentos, em outros funciona mais como publicidade para, quem sabe, atrair uma audiência mais ampla do que uma adição musicalmente positiva. Após sucessivas audições, uma das mais fortes impressões que ficam é o desejo de que Springsteen lançasse um álbum mais "nu"; nada extremo como Nebraska (1982), mas visceral e focado essencialmente na E Street Band, como foi o fantástico The Rising, seu melhor registro em mais de 25 anos. Em que pese as críticas, trata-se de um disco de Bruce Springsteen, cuja superioridade em relação a quase tudo que se faz atualmente é praticamente inegável. High Hopes é um álbum menor em sua discografia, mas digno de nota no contexto atual. Nota 8 (por Diogo Bizotto)
Confesso, com uma certa vergonha, que até pouco tempo atrás desconhecia completamente a obra de Bruce Springsteen. Ainda que por ignorância ou desinteresse, nunca fui atrás de seus discos, por mais que tivesse várias recomendações de amigos que já o conheciam mais a fundo. Pois bem, depois de ouvir e passar batido por seu último lançamento, o bom Wrecking Ball de 2012, e assistir aos shows impecáveis que o artista realizou no Brasil em 2013, inclusive protagonizando uma das melhores apresentações de toda a história do Rock in Rio, acredito ter descoberto The Boss na hora certa. High Hopes é um disco maravilhoso, com músicas que têm o poder de tornar o seu dia melhor, se ouvidas ao sair da cama de manhã. O álbum conta com canções alegres e mantém um clima alto astral, e extremamente bem acompanhado pela já lendária E Street Band. Com a participação mais do que especial do guitarrista do Rage Against the Machine e Audioslave, Tom Morello, High Hopes nos faz viajar ao longo de suas doze músicas, com destaques para a faixa-título, a quase AOR “Harry’s Place”, “Just Like Fire Would”, “This is Yours Sword” e chegando ao ápice com a impecável auto-regravação de “The Ghost of Tom Joad” – impossível não se emocionar com essa versão já épica que remete diretamente à uma de suas maiores influências, a lenda do folk norte-americano Bob Seger - (qualquer semelhança com “Turn the Page” não será mera coincidência). High Hopes tem tudo pra se tornar um dos melhores lançamentos de 2014 (e olha que ainda estamos no final de janeiro). Ah, não poderia terminar sem dizer o quanto é bom ouvir Morello botando pra funcionar seu velho pedal Whammy novamente, ainda que mais moderado do que em suas ex-bandas, mas mesmo assim casando perfeitamente com os delicados acordes da velha Fender Telecaster de Springsteen. Nota 9 (por Tiago Seven)
Em sua autobiografia, Waging Heavy Peace, Neil Young diz que Bruce Springsteen é um cara verdadeiramente autêntico e que é fabuloso no que faz. Não sou o cara mais indicado para concordar ou discordar do velho Young, visto que meu conhecimento da obra de Springsteen se resume aos fundamentais Born to Run e The River - além dos muitos hits espalhados por praticamente quatro décadas de música rolando. Entretanto, me sinto confortável o bastante para dizer que High Hopes, seu último lançamento, soou o alarme e eu mal posso esperar para conferir a obra do “patrão” mais a fundo. Apesar de definir o trabalho como esquisito entre outros adjetivos que podem desmotivar o ouvinte mais leigo, Springsteen oferece uma seleção de canções repleta de alma e totalmente atemporais. O único problema detectado pelas minhas anteninhas de vinil é a ordem das músicas - parece que o modo aleatório determinou a sequência final. Fora isso, um convite para que bata cartão aqui você também! Nota 8 (por Marcelo Vieira)
High Hopes tinha tudo para ser apenas mais uma daquelas safadezas fonográficas bem escancaradas, já que conta só com regravações, covers e b-sides. O roteiro exato da mediocridade, não fosse um único e determinante detalhe: estamos falando de regravações, covers e b-sides oriundos da mente maligna de Bruce Springsteen. Um gênio entre nós. Na verdade, prefiro até nem enxergar The Boss como aquele cara que vence pela genialidade simples e absoluta, mas sim pelo esforço e dedicação. Essa pecha lhe cai bem melhor e, mais uma vez, se conecta diretamente com seu (nem tão) novo trabalho. Neste 18° disco de estúdio, Springsteen recria de forma bastante convincente várias velhas canções de sua própria autoria e algumas poucas de outrem. Se por um lado nem todas funcionam exatamente bem, por outro é possível afirmar que, das doze faixas, ao menos cinco são brilhantes. Basta ouvir "Just Like Fire Would", "Heaven's Wall", "The Wall" e, principalmente, "American Skin (41 Shots)" e "The Ghost of Tom Joad" - só essas duas já valeriam o play. Tudo temperado por versos doloridos, cativantes e pela incessante cruzada contra o establishment norte-americano. Ponto para esse vândalo de 63 anos. O melhor é ainda saber que, quando menos se esperar, ele estará de volta com mais um álbum de inéditas na manga. Nota 8 (por Guilherme Gonçalves)
Steven Van Zandt, guitarrista titular da E Street Band, banda que acompanha Bruce Springsteen, se afastou temporariamente do grupo para se dedicar ao personagem Frank de Lilyhammer, série produzida pela Netflix que mostra as desventuras de um ex-chefão da máfia nova-iorquina em uma pequena cidade da Noruega - uma dica: assista, vale a pena. Sendo assim, Bruce chamou Tom Morello, do Rage Against the Machine, para substituir Van Zandt nos palcos e em estúdio. A união de um dos artistas mais completos do rock norte-americano com um dos guitarristas mais singulares das últimas décadas fez surgir um disco diferenciado. High Hopes traz regravações e releituras para antigas canções de Springsteen, além de algumas faixas compostas por outros artistas. Ainda que inferior aos trabalhos que The Boss lançou desde The Rising (2002), soa superior a maioria do que se produz no rock atual. Há canções inspiradas interpretadas por uma banda azeitada, o que leva a versões desde já antológicas para canções como a faixa-título, “American Skin (41 Shots)” e, principalmente, a arrepiante “The Ghost of Tom Joad”. Bruce Springsteen vive uma fase iluminada há anos, e ouvir seus discos traz essa inspiração para o lado de cá, o lado do ouvinte. High Hopes mantém a chama ardendo e é um álbum que traduz, mais uma vez, toda a magia que a música é capaz de nos proporcionar. Nota 8 (por Ricardo Seelig)
Bruce Springsteen definiu o seu High Hopes como sendo uma espécie de anomalia em sua discografia. "Mas nem tanto", completou o músico. De fato, ele não poderia estar mais certo na definição. Uma mistura de covers e reinterpretações de canções menos conhecidas de seu catálogo, seu novo álbum de estúdio não é exatamente o que se possa chamar de coeso. As faixas podem até não conversar entre elas. Mas uma coisa é fato: a tradicional e intocada alma roqueira de Springsteen é ouvida e sentida a cada minuto do disco, surpreendentemente curto. Inspirado por Tom Morello, o guitarrista do Rage Against the Machine, ele encontrou uma espécie de alma gêmea, talvez um integrante em potencial para a sua E Street Band, um sujeito que tem a mesma pegada político-social do Poderoso Chefão. Dá para ouvir um pouco de Morello na guitarra de inspiração étnica de "Heaven's Wall", no solo cheio de pirações e barulhinhos de "The Ghost of Tom Joad" ou no gosto eletrônico da balada "Down in the Hole". Mas High Hopes é um desfile de diferentes inspirações, sejam elas o country rock salpicado no combo "Frankie Fell in Love" e "This is Your Sword", no blues rock rasgado e urbano da sensacional "Harry's Place", na melodia quase celta de "Just Like Fire Would" ou mesmo na levada etérea e, tipo assim, indie-viajante (sério!) da longa "American Skin (41 Shots)". É experimentação, sem dúvida, mas experimentação do tipo ao qual um cara como Springsteen pode se dar completamente ao luxo. E, sejamos sinceros: um disco que abre com a irresistível faixa-título, que te pega pelas canelas e te faz querer pular sem parar, entrando totalmente no clima, não tem como ser ruim. Pode ser estranho. Mas ruim, não dá mesmo. Nota 8 (por Thiago Cardim)
Todo colecionador é viciado em buscar material de seus artistas favoritos. Sejam gravações perdidas, faixas deixadas de fora, versões demo, álbuns raros ou aquele longo improviso feito em um clube minúsculo de uma cidadezinha perdida no mapa. O colecionador não se importa em passar um bom tempo (e gastar um dinheiro) para ter em mãos este material. E Bruce Springsteen, além de um incansável artista, tem completa noção da fidelidade de seu público, e como este é ávido pelas suas composições (vide o sucesso que o megalomaníaco box Tracks foi em 1998). Isso tudo explica de forma mais do que natural o lançamento de High Hopes e como uma coleção de faixas gravadas pela estrada, covers, versões retrabalhadas e sobras de estúdio conseguem formar uma seleção variadíssima, que não apenas revisita as inúmeras formas musicais com as quais o Boss e a sua E Street Band lidaram ao longo das décadas, mas com uma merecida belíssima produção e o cuidadoso tratamento apropriado de um estúdio, além de continuar a constante progressão musical a cada novo disco. Compilações deste tipo, no caso de alguns artistas, podem ser apenas para fins lucrativos, muitas vezes sem acrescentar nada ao consumidor da música. Mas não de High Hopes. Não de Bruce Springsteen. 40 anos depois e a sua música, o sentimento que ela traz, continua dando
esperança a cada dia. Nota 8 (por Rodrigo Carvalho)
Nosso veredito é 8,1
Por Collectors Room
O único problema detectado pelas minhas anteninhas de vinil é a ordem das músicas - parece que o modo aleatório determinou a sequência final.
ResponderExcluirseu novo álbum de estúdio não é exatamente o que se possa chamar de coeso. As faixas podem até não conversar entre elas.
Trata-se justamente da unidade temática que citei em meu comentário; para ser mais exato, a falta dela. Afinal, por mais que Springsteen sempre tenha uma atenção especial na hora de montar seus track lists, fica mais difícil buscar coesão ao juntar um catadão de covers e músicas compostas em períodos diferentes de sua trajetória. Diria até que a crítica ficou mal acostumada em função da construção de personagens apresentada por Springsteen a cada disco (entre eles o próprio personagem Springsteen) e possivelmente teve que se esforçar mais para analisar "High Hopes" com alguma profundidade. Não é como no caso de "Magic" e "Working on a Dream", quando houve uma polarização excessiva nas críticas, como se os álbuns fossem, respectivamente, o "era Bush" e o "era Obama", análise que até faz algum sentido mas soa bastante limitada.
Pois é. Mas mesmo sem essa coesão, o disco consegue ser cativante e muito bom. Moral da história: o Springsteen desarrumado é melhor que a maioria do rock arrumadinho de hoje em dia.
ResponderExcluirOuvi apenas a faixa "Down in the Hole" e achei bem esquisitinha pros padrões springsteenianos [que não conheço profundamente], daí nem baixei o disco. Mas, por esses comentários, vou terminar baixando, sim.
ResponderExcluirRicardo...
ResponderExcluirPensei exatamente isso quando estava lendo os comentários. Um Bruce mais ou menos é melhor que muita gente no 100%...
Gostei da capa.
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