Veredito Collectors Room: Behemoth - The Satanist (2014)


Após cinco anos de silêncio, período em que o vocalista, guitarrista, principal compositor e líder da banda, Nergal, foi diagnosticado com leucemia e passou por um transplante de medula, o Behemoth retornou nesse início de 2014 com The Satanist, seu décimo disco e sucessor de Evangelion (2009). 

Quatro estrelas no About.com Heavy Metal e All Music, quatro estrelas e meia no Loudwire e Metal Sucks, nota máxima na Kerrang e no The Guardian, The Satanist foi, na percepção de nossa equipe, o principal lançamento deste mês de fevereiro de 2014. Por este motivo, o analisamos de forma coletiva, com o objetivo de entregar aos leitores diferentes visões sobre o novo trabalho de Nergal e companhia. Como convidado especial, temos a participação de André Neil, vocalista e guitarrista das bandas Gulag e Laconist.


Adam Darski é um sobrevivente. Não apenas por ter se tornado uma das mais emblemáticas figuras da música extrema, mas mais importante, por desde 1991 desafiar certos dogmas e conceitos a frente do Behemoth, com importante papel no estabelecimento do heavy metal carregado de mensagens em um dos países mais devotos do mundo. Até então com nove discos lançados, em meio às polêmicas envolvendo intrigas religiosas e atitudes mal vistas, os poloneses saíram do típico black metal cru e gélido para desenvolver um horrendo híbrido com o death metal de proporções cataclísmicas calcado em conceitos ocultos, atingindo o ápice da brutalidade descontrolada e épica em seus álbuns recentes, quando a tríade abissal Inferno, Orion e Nergal já estava completamente formada. Porém, os tempos negros vividos pela banda nos últimos quatro anos, após o diagnóstico de leucemia de Nergal, a sua luta contra a doença e a recuperação do grupo, deixaram cicatrizes para sempre, de formas praticamente indescritíveis ou inimagináveis para nós que não vivemos a realidade a fundo. The Satanist, com seu título simples (ao mesmo tempo profundo e metafórico) é o décimo trabalho, o resultado destas marcas, e não é preciso muito para provar como o Behemoth mudou para sempre. Muito mais natural, livre, honesto a sua própria forma, as nove faixas sangram como nove diferentes organismos vivos dentro de um só, com dinamismo e atmosferas que pareciam faltar na agressão desenfreada de antes. Estes aspectos são muito bem abordados em “Ora Pro Nobis Lucifer”, “Blow Your Trumpets Gabriel”, “O Father O Satan O Sun!” e a faixa título, que figuram facilmente entre o melhor já produzido em sua discografia. Segundo a banda, o conceito de The Satanist trata de contestação, de liberdade, de estar em equilíbrio com as suas dualidades. E se o grupo como um todo esteve às portas da morte ele não voltou apenas mais forte do que nunca, como parece ter tomado a doença como parte de si para se fortalecer, personificando o conceito do álbum e valorizando ainda mais a sua existência, com um propósito maior. Vida longa a Nergal. Vida longa ao Behemoth. Nota 9 (por Rodrigo Carvalho)

Há mais de 20 anos na estrada, o Behemoth já transitou entre o black metal nu e cru, o death metal intrincado e o sincretismo entre essas duas coisas. Particularmente, creio que foi justamente quando apostou nessa mescla que a banda conseguiu obter os melhores resultados. Ou seja, quando brindou a humanidade com uma trinca de respeito: Satanica (1999), Thelema.6 (2000) e Zos Kia Cultus (2002). Nesse ponto, o recém-lançado The Satanist (2014) acerta ao retomar esse híbrido. Não se ater ao black metal desenfreado dos primórdios da banda, tampouco focar apenas em malabarismos de um death metal virtuoso e ineficaz que contaminou seus últimos trabalhos. Evangelion (2009) já havia sido um avançou nesse aspecto, completado agora com o novo disco. Há três ou quatro faixas brilhantes, nas quais Nergal e companhia realmente acertam em cheio: "Ora Pro Nobis Lucifer", "The Satanist", "Ben Sahar" e "Messe Noire". "Blow Your Trumpets Gabriel" e "O Father O Satan O Sun" são bastante boas, enquanto que "In The Absence Ov Light" é apenas ok. "Furor Divinus" e "Amen" passam despercidas. No entanto, há também em The Satanist elementos que irritam um pouco. Nergal está cantando como nunca, mas, em muitos momentos, há excesso de sobreposição de vozes e efeitos exagerados. Essa mistura torna o som confuso, com várias coisas acontecendo ao mesmo tempo. A maior prejudicada é a guitarra, que se vê ofuscada diversas vezes. Os riffs perdem muito em contundência e acabam, de certa forma, abafados. Em suma, trata-se de um álbum bom, com alguns momentos geniais, mas também com oscilações. Luta para beliscar uma vaga no top 3 da discografia dos poloneses, mas não chega nem perto de um Zos Kia Cultus. Nota 8 (por Guilherme Gonçalves)

Dado o histórico recente do Behemoth, certamente houve gente apostando em um retorno com material abaixo da média estabelecida pelo grupo em mais de vinte anos de carreira. Mas The Satanist está aí para provar que em se tratando de Nergal, podemos sim botar a mão no fogo. Ouvidos acostumados com os últimos trabalhos perceberão que aqui o Behemoth optou por uma abordagem back to basics que remete aos velhos tempos — grande sacada, pois a aura resultante deste olhar para trás é aterrorizante de tão macabra. Nesta exumação em forma de disco, destaque para a faixa-título — um testemunho pra lá de honesto de uma banda que ri da cara da morte — e para o caráter de profecia e aclamação de "O Father O Satan O Sun!". A largada para os 10 mais de 2014 foi oficialmente dada. E a lista de compras para o próximo mês também. Nota 9 (por Marcelo Vieira)

Já não bastava o excelentíssimo Adam Michał Darski, mais comumente conhecido como Nergal, ter vencido um câncer, ele reacendeu a velha chama do Behemoth. Muito se disse sobre o direcionamento desse álbum, principalmente na pisada dos freios de Inferno. Eu mesmo, como um fervoroso fã das épocas de Satanica em diante, nunca fui muito chegado na fase mais black metal do grupo. Começando pela capa espetacular, já senti que esse seria o trabalho mais ritualístico deles desde os idos da já distante década de 1990. Assim começou a audição, ainda com o vídeo espetacular de "Blow Your Trumpets Gabriel" em mente. Essa obra é a epigênese do ódio de Nergal para com o cristianismo em geral, principalmente uma crítica ferrenha à doutrina de seu país natal, religiosamente descerebrado. Faixa por faixa, esse disco cresce a cada audição e reafirma a Polônia como um dos maiores berços do metal extremo dos últimos vinte anos. Nota 10 (por André Neil)

É certo que eu não sou a pessoa mais indicada para uma análise mais profunda de The Satanist, lançamento mais recente da banda polonesa Behemoth. Do black metal conheço pouco sobre o estilo, acompanhando com interesse maior pouquíssimas bandas, como o Mayhem, um de seus maiores expoentes. Mas, meu amigo, que pedrada é essa lançada por Nergal e companhia? Parece que o cara buscou forças das profundezas do inferno – aliás, título mais apropriado impossível – após seus graves problemas de saúde que culminaram em um sério transplante de medula. Pois bem, o cara se recuperou e ao longo das nove músicas que compõem os quase 45 minutos desse disco, é perceptível a crueza e a ausência das fanfarronices orquestrais da escola Dimmu Borgir do black metal sinfônico. É uma porrada atrás da outra, soando como se a banda tivesse algo a provar após seu período de inatividade. Timbres de guitarra na cara, os já tradicionais blast beats, uma produção absurdamente cristalina – quem disse que black metal é sinônimo de produção tosca e instrumentos mal tocados? – e Nergal cantando como se fosse uma criança (possuída pelo capiroto, claro). Entre os destaques, vale destacar “Furor Divinus”, a hipnótica “Amem” , “The Satanist”, a faixa título - que começa cadenciada pra cair num verdadeiro pandemônio sonoro - e “In the Absence Ov Light”. A banda conseguiu com esse lançamento despertar meu interesse em pesquisar mais a fundo sobre sua discografia, mas como dizem por aí, a primeira impressão é a que fica. E que impressão! Nota 8 (por Tiago Neves)

Embora eu não seja exatamente o maior especialista do mundo em black metal, é simplesmente inegável, logo à primeira audição de The Satanist, que estamos diante de um disco diferenciado - anos-luz à frente de grande parte da produção recente do gênero que tive a oportunidade de ouvir. Nergal, codinome artístico do polonês Adam Darski, travou uma terrível batalha contra a leucemia nos últimos anos - mas recusou-se a aceitar a pena e a condescendência alheias. Muito mais do que acomodar-se no papel de coitadinho, ele se colocou no papel de vitorioso - e provou isso neste novo disco do Behemoth. Buscou forças no fogo do inferno e entregou uma bolacha profana e pesada, como todo bom disco black metal deve ser. Mas The Satanist é bem mais do que isso. É também intenso, profundo e de um bom gosto incrível. Produção limpa e cristalina que, ao invés de tirar a força do disco, só lhe dá mais méritos e deixa tudo ainda mais poderoso e sinistro. The Satanist é, de fato, uma obra de arte. Quando a primeira faixa, "Blow Your Trumpets Gabriel", começa a rolar, já é possível sentir um arrepio, como se as trevas começassem a surgir ao seu redor, prestes a tomar conta do seu corpo. Mas é nas duas canções finais, "In the Absence ov Light" e "O Father O Satan O Sun!", que o bicho pega MESMO. Enquanto na primeira temos um trecho falado de "The Marriage", obra do escritor e dramaturgo Witold Marian Gombrowicz (e que consegue, em sua sutileza, ser tão forte quanto os vocais urrados de Nergal), na segunda temos a mais sublime tradução de um épico, grandioso, crescente e envolvente - sem a necessidade das orquestrações clássicas megalomaníacas de qualquer expoente mais recente do black metal. O Behemoth é, na Bíblia, o nome de uma criatura monstruosa e gigantesca, descrita no Livro de Jó. Da mesma forma, o Behemoth, a banda, é também um gigante - que se levantou e mostrou quem é que manda. Que os outros aprendam a lidar com isso. Nota 9 (por Thiago Cardim)

Com pouco mais de 44 minutos, The Satanist é um trabalho relativamente curto. Suas nove músicas formam um tracklist eficiente, com elementos que vão do death ao black sem maiores cerimônias. Com criatividade e inspiração, o Behemoth brinda os ouvintes com pequenas obras-primas como “Blow Your Trumpets Gabriel”, a sensacional “Messe Noire” (com um solo de guitarra arrebatador), “Ora Pro Nobis Lucifer”, “In the Abscence ov Light” e a exemplar faixa-título. Para quem, em pleno 2014, ainda olha para os estilos mais extremos do metal e acredita cegamente que eles não passam de uma massa sonora mal tocada e mal produzida, trata-se de um disco para esfregar na cara e mostrar como a agressividade, a fúria e o peso podem gerar álbuns complexos e excelentes como os vindos de qualquer outro gênero da música. The Satanist é um dos melhores discos do Behemoth. Ao despir-se dos exageros da sua fase black metal Cirque du Soleil os poloneses deram ao mundo um álbum de cair o queixo, com uma sonoridade intensa, sombria e apaixonante. Vale muito! Nota 9,5 (por Ricardo Seelig)

Veredicto: 8,9

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Equipe Collectors Room

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