Na última terça-feira, o palco do Teatro Rival Petrobras recebeu os holandeses do Focus em sua única apresentação em solo carioca pela turnê de divulgação de seu novo trabalho, Focus X. Mesmo sob forte chuva e num horário que não facilitava muito a vida de quem talvez tivesse de cruzar a cidade para prestigiar seus ídolos, o que se viu foi a casa lotada a aguardar quase 40 minutos até os primeiros acordes de “Focus”, a primeira da noite.
Thijs van Leer é uma figura caricata; um Chacrinha da Renascença com um quê de vovô legal que ensina os netos a jogar futebol de botão. Seu domínio tanto do teclado quanto da flauta — adquirido ao longo de anos de estudo em conservatório de música — só não é maior que a sua capacidade de entreter o público. Comunicativo, arrisca algumas palavras em português e procura fazer uma graça ou outra durante as músicas. Sorte de quem adquiriu as mesas do lado esquerdo do palco e pode ver suas caras e bocas bem de pertinho.
Acompanhando o bom velhinho estavam o guitarrista Menno Gootjes, o baixista Bobby Jacobs e outro integrante que já pegaria ônibus de graça na cidade: Pierre van der Linden, batera que deixou sua marca em quatro álbuns da banda nos anos 1970, entre eles, a obra-prima Moving Picures. E foi justamente este o álbum que compareceu com mais músicas no repertório: “Focus II”, “Eruption” (tocada na íntegra, com impressionante fidelidade à gravação original) e, é claro, “Hocus Pocus”, com o novato Gootjes navegando pela escala de sua Les Paul seguindo o mapa desenhado por Jan Akkerman e van der Linden perdendo a noção num solo de quase 10 minutos.
Do álbum que motiva a turnê, apenas uma canção, a modernosa “All Hens on Deck”, que van Leer dedicou aos presentes. Shows de rock progressivo como este equivalem a rituais de necromancia: assim como mortos que ressurgem de seus túmulos, aquele pessoal que aparentemente havia aposentado o hábito de ver bandas ao vivo, comparece em massa. O bom dessa gente é que respondem ao menor estímulo — vide a euforia que a dedicatória que ninguém entendeu provocou.
Porém, os mesmos eufóricos são também os mais suscetíveis à dispersão. A noção de show é diferente para esta galera que não consegue esperar o intervalo entre uma música e outra para chamar o garçom ou levantar para ir ao banheiro. Agora, ninguém foi ousado o suficiente para interromper o silêncio que antecedeu a belíssima “La Cathedrale de Strasbourg”. Seguindo a ordem inversa de Hamburger Concerto, uma “Harem Scarem” repleta de improvisos individuais veio na sequência.
O intervalo entre o set normal e o bis foi ínfimo, mas já se via gente levantando para ir embora (!). A saideira veio na forma de “Focus III”, faixa homônima ao álbum que contém o hit “Sylvia”, que aliás, pegou todo mundo de surpresa ao ser executado logo no comecinho da apresentação. Em pouco mais de duas horas, o Focus transmitiu sua mensagem de nostalgia para os mais velhos quanto disse aos mais novos, em tom de ensinamento, que muito antes dos neoclássicos voarem baixo em seus instrumentos nos anos 1980, houve quem pensasse fora da caixa na década anterior e incorporasse de maneira acessível e surpreendente a música erudita ao rock.
Texto: Marcelo Vieira
Foto: Divulgação Teatro Rival Petrobras
Só uma pequena correção. Moving Waves. Moving Pictures, obviamente, é do Rush.
ResponderExcluirLegal a resenha!
Escrever uma resenha ouvindo outras coisas dá nisso! hehe
ResponderExcluirValeu o toque! ;-)