Eyehategod: crítica de Eyehategod (2014)



Considerados um dos nomes fundadores do sludge (título que eles mesmos renegam), o Eyehategod não apenas detém o título de ter um dos melhores nomes de banda da história, como se consolidou ao lado do Down, Crowbar, Exhorder e Goatwhore como representante do Louisiana Sound – a inclusão de blues e southern rock em meio às influências de doom metal e hardcore na década de noventa.

Com uma trajetória cheia de lacunas por contas de problemas com a justiça e inúmeros projetos paralelos, Mike Williams, Jimmy Bower e Brian Patton permanecem há quase três décadas como o centro criativo do grupo (ao lado do baterista Joe LaCaze, falecido no ano passado), construindo uma identidade sonora extremamente influente e cultuada em seus quatro primeiros trabalhos, tendo o último Confederacy of Ruined Lives sido lançado apenas em 2000.


14 anos depois, porém, o deus odioso retorna de suas úmidas catacumbas com um novo álbum. Batizado em turvas águas apenas com o seu próprio nome, foi lançado em maio pela Housecore Records, gravadora de Phil Anselmo (que também atua como um dos produtores do disco).

As bandeiras se levantam, as ruas são travadas e a revolta se inicia com o início de “Agitation! Propaganda!”, muito mais próxima do hardcore de tendências punk do que o esperado. O ritmo começa a ser estraçalhado apenas em seus momentos finais, carregando para a densidade arrastadíssima de “Trying To Crack the Hard Dollar” e seu groove de violência constante, e assim como “Parish Motel Sickness”, são calcadas em riffs largados que só poderiam brotar de alguém nascido e criado em New Orleans.


Mais próxima do que poderíamos chamar de hard rock, “Quitter’s Offensive” boia vagarosamente no lodo que se forma quando doom e blues se encontram, a mesma imundice na qual os destroços de hardcore e Black Sabbath de “Nobody Told Me” se mostram mergulhados quase que totalmente. Por falar em blues, “Worthless Rescue” traz imediatamente à mente a imagem de empoeirados bares ao lado de encruzilhadas em alguma decadente pequena cidade no sul dos Estados Unidos, enquanto “Framed to the Wall” resgata mais uma vez a aceleração descontrolada da faixa de abertura e se mostra uma martelada extremamente bem encaixada.


A lentidão é retomada na claustrofobia quase palpável do ditatorial tempo de “Robitussin and Rejection”, uma velocidade que deixa a sensação de estar paralisado e sendo sugado pelo pântano, até o afogamento ao longo dos mais de sete minutos de “Flags and Cities Bound”, aonde a veia mais experimental e drone do Eyehategod entra lentamente em seu organismo e entope as vias aéreas (seria um resquício do Corrections House?).


Em “Medicine Noose”, porém, o caos se manifesta em outra de suas variadas formas, como o desespero de uma velha corda sendo apertada em seu pescoço enquanto a voz se esvai, impossibilitando qualquer pedido de ajuda. Os sentidos se apagam com o encerramento de “The Age of Bootcamp”, uma massa quase disforme de groove e sludge regurgitada por alguma besta fossilizada da Louisiana.


E exatamente como uma entidade adormecida durante incontáveis eras (er... ok, 14 anos) que se ergue das profundezas dos mais poluídos e fétidos lamaçais de New Orleans, o Eyehategod apresenta uma fúria intocada. Agressividade e vontade que se mantém intactas desde o início de suas atividades, mostrando que mesmo o tempo e seus inúmeros problemas não foram suficientes para corroer as engrenagens responsáveis pelo turbilhão de riffs e melodias densas e massacrantes.


As linhas instrumentais de Bower e Patton permanecem no meio termo entre o hardcore e o sludge assombrado pelo blues sulista e pelo doom sabbathico sobre o brutal trabalho final de LaCaze, da mesma forma que Williams continua cuspindo, praguejando e esgoelando as misantrópicas letras. Alie tudo isso a uma produção empoeirada, distorcida e lamacenta nos níveis corretos, equilibrados e suficientemente ruidosos para incomodar os ouvidos mais frágeis e deixar um rastro de sujeira por onde passa.


Tenha certeza de ter uma esponja de aço em mãos. Você precisará para se limpar depois de se encontrar com Eyehategod.


Nota 9


Faixas:
1. Agitation! Propaganda!
2. Trying to Crack the hard Dollar
3. Parish Motel Sickness
4. Quitter’s Offensive
5. Nobody Told Me
6. Worthless Rescue
7. Framed to the Wall
8. Robitussin and Rejection
9. Flags and Cities Bound
10. Medicine Noose
11. The Age of Bootcamp


Por Rodrigo Carvalho

Comentários

  1. Ótima review! Esse álbum realmente ficou fenomenal, na minha opinião, já se tornou um clássico obrigatório para quem curti o estilo do "I HATE GOD".

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  2. Não gosto tanto do EYEHATEGOD como de outras bandas de Sludge, mas esse álbum me pegou de surpresa e é bom demais!Ótima indicação!!

    Aproveitando espaço, comentem sobre o novo do Fu Manchu (Gigantoid), tão bom quanto!!!!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Esse hiato de 14 anos sem lançar disco novo fez bem pra eles. Álbum sensacional, o melhor que ouvi desse ano.

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