Discoteca Básica Bizz #011: Led Zeppelin - Physical Graffiti (1975)


Uma escolha que pode contrariar muita gente entre as viúvas do Led que ainda hoje habitam o planeta. Afinal, não existe nenhuma razão para se excluir de qualquer discoteca básica os quatro primeiros LPs do grupo. Desde sua estréia em vinil, com Led Zeppelin (1968), o quarteto já traz todos os extremos para que aponta a gula estilística do maestro Jimmy Page - do rockabilly ao folk de raízes celtas, passando por blues épicos como tratores encharcados de combustíveis ilícitos. Sem contar, claro, com a cristalização do gênero que seria batizado como heavy metal (pelo que, talvez, a história nunca os perdoe).

Seja como for, Physical Grafitti foi o único disco que eu me arrependi de ter jogado fora quando - há uns cinco, seis anos - tive um acesso de limpeza provocado pela audição ininterrupta de Talking Heads e Joy Division e pelos ideais do levante de 1977. É verdade - nesta fatídica data, eu doei a coleção completa do Led, e só não tinha nenhum pirata por falta de grana. Eles viraram, de fato, os Judas favoritos dos punks - do sexismo arrogante de Robert Plant e do virtuosismo de Page ao sucesso medido em pilhas de platina, representavam tudo o que havia de errado com o rock na primeira metade da década de 1970.

Noutra data fatídica, porém, eu simplesmente tive de entrar na primeira lojinha de discos para comprar um Physical Grafitti novo em folha, antes que a saudade matasse.

Está lá, levadas às últimas consequências, a potência monolítica, porém filigranada, que sempre foi o segredo e o veneno da banda. Junto com o momento máximo do produtor Jimmy Page - e é aí que a porca chamada história torce o rabo.

Contemporâneo e amigo de Beck e Clapton uns cinco anos antes de entrar para os Yardbirds, Jimmy - por motivos de saúde - não foi pulando para dentro da primeira banda de blues psicodélico que passou pela porta de sua casa. Ao contrário, fez carreira como músico de estúdio até aperfeiçoar-se como arranjador e produtor de grupos como os Stones, os Kinks e o Who. Sem nenhum crédito por isso, é bem provável que tenha sido o legítimo criador do rhythm and blues mod(erninho) que a velha Inglaterra espalhou para o mundo no começo dos anos 1960. O que já bastaria para colocá-lo pau a pau com Hendrix entre os guitarristas de sua geração.

Quando entrou para o Led Zeppelin, portanto, Jimmy não só tocava como um demônio - fosse com a palheta, com os dedos ou com seu arco de violino -, como conhecia estúdios e eletrônica musical de A a Z. Foi o homem, enfim, que introduziu no rock o teremim - um instrumento eletrônico da década de 1930, deixado às traças com a invenção do sintetizador.


Sobrepondo guitarras e guitarras com timbres tratados diferentemente, criou um turbilhão wagneriano que atinge o gozo final nos três tours-de-force monumentais de Physical Grafitti. "Kashmir" e "In the Light" atacam escalas orientais com performances demolidoras dos exagerados Plant e Bonham, contrabalançadas pela finesse climática de John Paul Jones no baixo e - principalmente nessas duas faixas - nos teclados. 

A terceira, "In My Time of Dying", era um belo spiritual recuperado por Bob Dylan. Era, porque a bordo do "zepelim de chumbo" se transforma numa exaltação simultaneamente heróica e debochada, com o histriônico Plant implorando aos berros pela presença de Jesus e do arcanjo Gabriel. Paroxismo é isso aí, principalmente para uma garganta acostumada a simular orgasmos múltiplos.

Junto a rocks concisos e musculosos como "Custard Pie" e "Trampled Underfoot", não precisava mais. Aí o grupo resolveu acoplar sobras dos LPs anteriores - algumas, meras jams -, transformando Physical Grafitti num álbum duplo que não tem (surpresa!) sequer um sulco supérfluo.

(Texto escrito por José Augusto Lemos, Bizz#011, junho de 1986) 

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