Black Sabbath: quanto vale o show?



A maior banda de heavy metal do planeta. Ou, se preferir, a banda que inventou o heavy metal. E que vai sair oficialmente de circulação em breve. O Black Sabbath está, desde janeiro, percorrendo os palcos do mundo com a sua turnê derradeira, que atende pelo nome de The End. Tudo bem que o baterista original, Bill Ward, não segue ao lado dos parceiros por motivos de “tretas contratuais”, mas teremos no mínimo Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler, todos integrantes originais do time, se despedindo depois de quase cinco décadas de serviços prestados ao mundo da música.

No Brasil, serão quatro shows: Porto Alegre (28/11, no estacionamento da FIERGS), Curitiba (30/11, na Pedreira Paulo Leminski), Rio de Janeiro (02/12, na Praça da Apoteose) e São Paulo (04/12, no estádio do Morumbi), tudo com a abertura dos caras do Rival Sons, ótimo quarteto de Los Angeles que faz um rock de gosto retrô com pitadas de Led Zeppelin e do próprio Sabbath.

Programa imperdível, não? Bom, parece que nem tanto... Afinal, para desovar os ingressos, a Time For Fun (que talvez você conheça apenas como T4F), que está trazendo os senhores ingleses ao Brasil, andou fazendo de tudo um pouco nas últimas semanas.

Na época do Dia dos Namorados, utilizando o código “PROMONAMORADOS”, era possível comprar dois ingressos de pista pelo preço de um para Curitiba e Rio no site da empresa. Logo depois, no começo de julho, praticamente o mesmo esquema: utilizando “PROMOFERIAS”, rolava de comprar 2 ingressos por 1 em São Paulo, para as arquibancadas superiores 1, 2, 3 por R$ 260 e para a arquibancada 2 por exatos R$ 125 — e, aqui, fica impossível não fazer, como bem destacou o jornalista José Norberto Flesch, uma comparação com os valores de shows no SESC, por exemplo: dias 15, 16 e 17 de julho, Guilherme Arantes se apresenta na unidade de Pinheiros e dois ingressos para ver o cantor saem por R$ 120. O mesmo esquema valia para Rio (arquibancada e pista, saindo dois ingressos por R$ 370) e Curitiba (no setor Pista em Pé, era possível adquirir dois tickets por módicos R$ 380).

Na área de comentários dos sites especializados, a chiadeira é geral. O arquiteto e urbanista Sandro Priebe, lá da cidade de Guaíba, no Rio Grande do Sul, comprou em abril dois ingressos premium, para ele e para a namorada, com o objetivo de ver Ozzy e sua tchurma em Curitiba. “Com a safadeza que é essa taxa de conveniência de 20% em cima do valor dos ingressos, mais a taxa de entrega, que tu paga pra imprimir teus próprios ingressos, gastei um total de R$ 1.568”, disse ele, no Whiplash. “Aí hoje eu vejo isso. Quase R$ 800 que eu poderia ter economizado!”.

No fim das contas, a discussão é justamente esta. A questão aqui não é “ah, os caras podem fazer promoção, né”. Podem, claro que podem. Decisão deles. Decisão comercial, até. Mas o quanto isso é justo com o consumidor, com a pessoa que pirou com o anúncio do show, que ficou com medo dos ingressos se esgotarem, pagou o preço cheio e agora tá vendo esta zoeira rolando aí? 



Se eles podiam colocar dois ingressos por R$ 125, por que não fizeram isso desde o começo?”, questiona o programador Beto Costa. Natural da cidade de Campinas e fã declarado do Sabbath (“em especial por causa do Iommi, que pra mim é um gênio subestimado do mundo da música”), o sujeito gastou R$ 380 por uma entrada inteira na pista, em SP, assim que as vendas abriram. Mas confessa que, se soubesse de uma promoção tipo a do Dia dos Namorados, facilmente teria esperado e comprava duas numa arquibancada para poder levar o sobrinho, de 18 anos. “Ele começou a curtir, embora diga que prefere a fase do Dio. Ia ser a chance de fazê-lo mudar de ideia”, brinca.

Beto conta ainda que se arrependeu de não ter fechado a negociação que estava fazendo com um amigo gringo para ir ao Hellfest, festival que rola a partir do próximo dia 17 na cidade francesa de Clisson. O colega inglês teve um pepino pessoal, não ia poder comparecer e estava disposto a vender seu ingresso por 200 euros, o que dá cerca de R$ 720 segundo a cotação atual. Detalhe: a entrada seria para a terça, dia 19, que é quando o Black Sabbath será justamente o headliner, data que terá ainda bandas como Gojira, Slayer, Megadeth, Amon Amarth, Blind Guardian, Ghost, Paradise Lost, Deicide, Katatonia e até os brasileiros do Ratos de Porão. “Claro que ia ter que colocar na ponta do lápis os gastos com hospedagem, com avião, tudo isso. Mas porra, valeria demais a pena por tudo. Pelo quantidade de shows, pela viagem, pela experiência, por tudo. Fiquei pensando na comodidade, vejo aqui no Brasil mesmo. Burro. Perdi a chance”, diz.

Obviamente, também existem outros fatores que precisam ser questionados. Seria a tal da crise (ah, a crise)? Ou a baixa procura seria causada justamente por uma reação do público aos altos valores dos ingressos? Ou talvez estejamos falando de mais um daqueles períodos, que têm sido bastante frequentes nos últimos anos, cujo acúmulo de bandas internacionais numa mesma época do ano acaba “canibalizando” umas às outras? Na primeira quinzena de dezembro, em SP, teremos, além do Sabbath, a lendária banda punk The Descendents (03/12, pela primeira vez no Brasil), o Simple Plan (07/12), o Sum 41 e o guitarrista Joe Satriani (estes dois últimos, com datas exatas ainda a confirmar).



Não é a primeira vez que uma situação como esta acontece, também em shows promovidos pela T4F. Em 2012, quando Lady Gaga passou pelo Brasil, chegou um momento em que era possível adquirir ingressos no esquema “compre um e leve dois”, em parceria com a loja de departamentos Riachuelo, patrocinadora/parceira do show. E além da T4F permitir que entradas fossem compradas em até 10 vezes no cartão de crédito, dava pra encontrar ofertas em sites de venda coletiva, como Peixe Urbano e Groupon, tudo pela metade do preço. A situação virou piada e gerou o Tumblr Achei Ingresso da Gaga, com montagens do tipo “Comprei uma Telesena e quando raspei ganhei um ingresso pro show da Gaga”. O saldo final, segundo matéria do UOL, foi uma turnê de três datas que teve pouco menos de metade dos ingressos vendidos: em SP, foram 50 mil pessoas para 64.995 ingressos postos à venda. Mas no RJ, deu ainda pior: de 90.330 entradas disponíveis, apenas 40 mil foram vendidas. Ou seja: 44% da lotação.

Meses depois, no mesmo ano, outra diva do pop sofreu com ingressos vendendo menos do que o esperado – e no caso foi justamente Madonna, talvez a maior das divas pop, aliás. A arquibancada para os dois shows de SP, por exemplo, chegou a cair de R$ 280 para R$ 150. Já no Rio, a pista baixou de R$ 360 para R$ 200 e a prefeitura ainda fez um sorteio para os servidores públicos, de cerca de 500 ingressos, todos com direito a acompanhante. Na época, a T4F se referiu a estes preços em comunicado oficial como sendo “cotas especiais”.

Tanto no caso de uma quanto da outra, claro, os fãs que adquiriram ingressos na primeira leva, querendo garantir logo a presença, reclamaram um bocado da diferença entre o preço que pagaram e as facilidades que rolaram depois.

Tentamos de todas as formas conversar sobre o assunto com a T4F para entender seu posicionamento a respeito, mas infelizmente não recebemos qualquer tipo de resposta. Caso haja um contato posterior, esta matéria será devidamente atualizada.


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