"Bo Diddley", "Bo Diddley is a Gunslinger", "Hey Bo Diddley", "Story of Bo Diddley", "Bo Diddley's Dog", "BoJam", "Bo Guitar", "Diddley Daddy". Não são títulos de autobiografias, mas canções de um dos papas do rock, blues e rhythm & blues. Louvado por Deus e Jesus & Mary Chain, que para ele gravaram "Bo Diddley is Jesus". Amém.
Ella McDaniel inventou um músico maior que a pretensão. Ella é ele, Bo Diddley, que aos 16 anos boxeava e ouvia dos fãs: "Go, Bo Diddley". Ele não sabia o que isso significava. Mas gostou do apelido, que virou nome e primeiro compacto, em 1955. Também o maior sucesso e faixa que abre The Chess Box, uma caixa de dois CDs com 45 canções, quatro raridades e nove faixas inéditas, junto com um livreto de 24 páginas.
Bo era personagem de si próprio. Criatura maior que o criador. Nascido em 28 de dezembro de 1928, Ella Bates tomou da tia Gussie McDaniel o sobrenome. Com ela, saiu do cafundó de McComb, Mississipi. A mãe, pobre, o deixou na mão da tia, que o levou a Chicago e ao estudo do violino clássico.
Aos doze ouviu o primeiro disco de blues, num lar envolto na religiosidade do gospel. John Lee Hooker o enfeitiçou. Um ano depois, a irmã Lucille o presenteou com o primeiro instrumento. As luvas de boxe vieram a seguir. Aos 15 anos, Ella era semiprofissional e ganhava batendo os trocados para viver. Ganhou nas batidas o apelido de toda a vida.
Da brincadeira da primeira banda, The Hipsters, ficou o estilingado nas cordas da guitarra. De sons perdidos na memória vieram os tambores da África de sua música. Da amizade de Jerome Green ressoaram as maracas de Cuba na percussão. Das canções de pergunta-e-resposta dos shouting blues que ouvia ecoaram as harmonias vocais que influenciariam o rap. Da guitarra tocada com aulas de violino estalaram os acordes que Bo não soube explicar, do mesmo jeito que não sabe por que é Bo.
Rolling Stones, Buddy Holly, Animals, Yardbirds, Shadows, Bobby Vee, Eric Clapton, Jimi Hendrix, The Doors, The Who. O "who´s who" do rock e blues bebeu das canções e se envenenou no beat da square guitar, a guitarra retangular que Bo bolou e construiu em 1958. Um instrumento engraçado como o seu criador.
The Chess Box abre com o groove inconfundível de "Bo Diddley", seu maior sucesso, que chegou ao Top #10 de rhythm & blues em 1955. Punhados de artistas dariam a alma e os bolsos pelo lado B do compacto de estreia, o escorregadio blues "I'm a Man". "Pretty Thing" deu nome a uma banda inglesa dos anos 1960. "Who Do You Love?" pergunta e tem como resposta os suspiros das muitas senhoras Diddley. "Before You Accuse Me" é outra paulada bluesy.
O primeiro CD, que compreende canções de 1955 a 1959, tem três inéditas, que são versões alternativas para jóias lascadas como "Bring it to Jerome". O segundo disco começa ainda em 1959 e chega até 1968, com o tema "Bo Diddley 69". Não, apesar dele, não é sacanagem. A canção já era influenciada pelo soul da Motown e com batidas da Stax. Duas das tantas gravadoras que vivem dos ecos de Diddley, mas que esquecem que ele está vivo.
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