Discoteca Básica Bizz #093: Rod Stewart - Every Picture Tells a Story (1971)


Poucos cantores de rock fizeram jus ao adjetivo visceral tanto quanto Rod Stewart. Mais que Robert Plant, Paul Rodgers ou Mick Jagger, ele soube absorver a urgência e o feeling de mestres negros americanos - como Sam Cooke - em um estilo pessoal, forjando uma voz fuliginosa e imediatamente reconhecível.

Hoje, quem o vê colecionando Lamborghinis talvez não suspeite de suas origens. Nascido em uma típica família working class londrina, mas orgulhosa da ascendência escocesa, ele se virou como pode na adolescência: foi jornaleiro, coveiro, ergueu cercas e até jogou futebol. Mas sua paixão era mesmo a música. Foi por causa dela que Rod passou dois anos vagando pela Europa, ocasião em que aprendeu a tocar banjo e a cantar.

De volta à Inglaterra em meados dos anos 1960, com a ascensão da cena do rhythm and blues integrou bandas como Jimmy Dowell and The Five Dimension, The Hoochie Coochie Men, Steampacket, Shotgun Express e, finalmente, o Jeff Beck Group. Com o guitarrista, ele encarou pela primeira vez as grandes plateias, embate do qual saiu vitorioso para liderar o Faces. 

A partir daí, o cantor desenvolveria uma espécie de esquizoidia musical ao se ver contratado ao mesmo tempo por dois selos distintos: Mercury (como solista) e Warner (junto ao Faces). Enquanto seu grupo foi se tornando uma versão glitterizada dos Stones, Rod seguiu por uma via diferente: seus discos contrabalançavam material próprio com canções alheias - na maioria, itens obscuros, que ganhavam vida nova em vigorosas reinterpretações. A fórmula gerou ao menos três discos magistrais: An Old Raincoat Won't Ever Let You Down (1969), Gasoline Alley (1970) e o que é o objeto desta Discoteca Básica.


Como os anteriores, Every Picture Tells a Story foi pródigo em variedade de estilos. Lá se encadeavam soul da Motown - "(I Know) I'm Losing You" -, uma gema bruta da fase folk de Bob Dylan ("Tomorrow is a Long Time"), um instrumental de tessitura medieval ("Henry"), originais mesclando trechos acústicos ao hard rock (a faixa-título e "Maggie May"), um leve aceno ao blues ("That's All Right") e até o hino inglês ("Amazing Grace"). Por mais díspares que parecessem, as músicas se nivelavam com o tratamento imposto por Rod. Nem pequenos deslizes na produção foram capazes de embaçar sua entrega e sinceridade.

Ainda assim, há quem diga que a superioridade da gravação sobre as demais feitas por ele deveu-se à sua perfeita interação com os instrumentistas convidados: Danny Thompson (ex- Pentagle) arrasava no baixo de pau, e as guitarras de Martin Quittenton tinham um ótimo posicionamento. Sem esquecermos de Ron Wood, de Mick Waller (cuja técnica desconcertante na bateria teria levado o crítico Greil Marcus a recomendá-lo para um prêmio Nobel em Física!) e do mandolinista Ray Jackson. É, enfim, uma banda impecável, capaz de pressionar Rod a dar o melhor de si. Algo que, infelizmente, os anos de indolência no jet set internacional puseram a perder.

Texto escrito por Arthur G. Couto Duarte e publicado na Bizz #093, de abril de 1993

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